quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Alta Fidelidade



Eu acho que sou melómano. O dicionário remete para “melomaníaco”, o que assim a cru parece bem mais assustador. A definição esclarece: “aquele que tem paixão pela música”. Ah, claro está! Confirmo e confesso: “sou um melómano empedernido!”.

Nunca fui ao Conservatório. Não sei distinguir se uma pauta está de patas para o ar ou se está correcta. Confundo a clave de sol com o símbolo do Ltda. (&). Não sei um único acorde. Mas o meu pai foi baterista dos “Cometas Negros” e acho que a música foi herdada por via genética, ou pelo menos a paixão por ela, ao ponto de não podermos viver um sem o outro.

Já houve alturas na minha vida (muitas) em que a música foi a única coisa que me restou.

Parece cliché mas no meu caso é mesmo verdade: eu não consigo viver e ser feliz sem a música. E acho que isso nota-se. Não há dia que eu não vasculhe à procura do novo grande som, nos jornais que compro, no cabo, na rádio, na net. Tento todos os dias ouvir discos novos e envolvo-me com aquilo de tal maneira que faz parte de mim.

A minha vida tem uma banda sonora. A espinha dorsal tem o “Wickie” na infância. Os Beatles mais tarde, cujas cassetes consumia freneticamente no banco de trás do Renault 5 branco. Os Xutos no Ciclo. Os Smiths e os Janes’ Addiction no Liceu. Os Blur e os Oasis na faculdade. Os Verve quando comecei a trabalhar e me casei. Os Strokes quando trabalhei em Nisa. O Jeff Buckley quando trabalhei em Marvão. Os Radiohead, os Artics e os Arcade Fire nos tempos mais próximos.

A música bateu-me como uma enorme bigorna quando numa tarde no Liceu, levei para casa debaixo do braço, o “Tender Pray” do Nick Cave e o “London Calling” dos Clash.

Não há vez que ouça o “Viva Hate” do Morrisey, que não me lembre da minha viagem de finalistas do 9º ano.

O meu primeiro disco vinil para a minha primeira verdadeira aparelhagem, comprada com as poupanças da mesada foi o “Peepshow” da Siouxie & The Banshees.

Não há vez que ouça os Cure, ou os Bauhaus, ou os Talking Heads que não me lembre do meu primo Quim Carita e das longas tardes e noites que passamos hipnotizados, a ouvir as músicas da nossa vida. Não há vez que ouça os Doors que não me lembre do Zé Pop. Não há vez que ouça os Nirvana, que não me lembre das matinées da Cave.

A música é a minha bússola. A companheira que nunca me falta e que nunca me falha.

Quantas vezes fui roubar, à palavras e à melodias de outros, os ensinamentos necessários para seguir em frente. A música pode ser um estado de alma. A música pode ser uma filosofia de vida.

Há dias, quando fazia a corridinha matinal, ouvia no ipod o projecto Bright Eyes e dizia o gajo: “Então eu vou encarar os meus medos / ou vou agachar-me como um cão / Vou pontapear e gritar ou vou ajoelhar-me e suplicar / Ou vou lutar contra tudo para esconder que desisti”. Pode parecer estranho, mas neste preciso momento, o Conor Oberst parece que está a falar para mim. Há que dar a volta!

Voltando à música, a perfeita ainda está para vir, como a onda que o Patrick Swayze procurava no genial filme “Point Break”, “Ruptura Explosiva” no nosso portuga.

Eu sei que esta conversa toda da música não diz nada a muita gente que faz o favor de visitar este meu estaminé e acha que esta história são tretas. A este ponto, as minhas queridas tias, que chateiam meia-Beirã para que lhe arranjem as folhas com os textos que aqui publico, devem de estar a comentar uma com a outra: “temos que lhe dizer que o desta semana foi muito intelectual. Não percebemos nada!”. Eh, eh, descansem meninas, esta converseta é mais para a rapaziada nova que por aqui anda.

Para eles e como o blogue é meu e parece-me que é o único sítio do mundo onde eu digo o que me dá na gana sem ter de passar cartão ou pedir opinião a ninguém, vou-lhes fazer uma sugestões.

O grande Nuno Markl, cujo blogue visito diariamente, tem-me ensinado muita coisa, aberto muitas portas e revelado grandes bandas. Foi através dele que conheci a música da Regina Spektor e só isso já chegava para tudo ter valido a pena. Seguindo as suas pisadas, deixo aqui 3 pistas, 3 novas bandas, 3 grandes canções, 3 vídeos que são, para mim la créme de la créme do que tenho “ouvisto”, como dizem algumas velhinhas destas bandas (é uma mistura de ouvir e ver). Boa!

Sendo assim, deixem-me lá brincar e armar-me um bocadinho em Marcelo Rebelo de Sousa da música, vestindo por breves minutos, a pele de uma das minhas profissões de sonho – crítico musical! Pagos para fazerem o que eu faço nos tempos livres. C*****s!

1. Hard Fi – Suburban Knights
5 estrelas! Grande, grande, mas enooorme música, direitinha para a história. São os Clash escarradinhos! A mesma pose, a mesma atitude brigona, a mesma subversão a respirar por todos os poros, as guitarras aos pulinhos e em bicos dos pés, a declaração de guerra definitiva ao mundo inteiro. Nem vou ouvir o resto do disco para não me desiludir. Estes cavaleiros suburbanos, estes jovens belicistas, estes gritos de revolta são a razão porque o Rock jamais morrerá! Aposto que o Joe Strummer, esteja lá onde ele estiver (também foste novo demais!) possa ouvir isto. O seu legado jamais morrerá!



2. The Enemy – Away from here
Por falar em Sósias, o campeão este é a carinha do Paul Weller dos Jam, para aí com 20 anitos. Eu não sei o que dão a estes miúdos em Inglaterra para conseguirem fazer letras e melodias desta qualidade quando ainda nem barba têm na cara. No entanto, se o Rimbaud produziu a sua melhor poesia com 15 anos, acho que estamos falados. A mesma revolta, a mesma crítica à sociedade e aos valores de plástico, a mesma ânsia de viver. E eu tenho pena de não ter 15 anos também, senão mesmo agora ia ali acordar o meu vizinho Mário para fazermos uma banda de garagem. Tínhamos um problema: como lhe falta um dedo, só pode ir à bateria. Nas teclas, desafinava de certeza. Ele não se importa. É amigo!



3. Jack Peñate - Torn On The Platform
Este não engana ninguém: é mesmo fã do Jeff Buckley, com aqueles trejeitos na voz… As guitarras são maravilhosas, a lembrar o Johnny Marr e os Housemartins, a swinging London dos anos 80 e princípios dos 90. Muito bom e o vídeo, é uma delícia! Até a minha filha adora.



Meus amigos, é tudo por hoje nesta lição da Telescola sobre a música pop, retomaremos a emissão dentro de momentos.

Se tiverem mais um pedacinho livre, dêem uma espreitadinha a estes outros vídeos, bem mais antigos, mas todos eles com temas que fazem parte da Banda Sonora da minha vida, a editar brevemente pela Vidisco!

Vão em paz, e que o SOM vos acompanhe!


É só clicar,

Fastball – The Way

Jimmy Eat World – The Middle

Lit – Miserable (hum, a Pamela! Grrrrau!)

Weezer – Buddy Holly

Gnarls Barkley – Crazy (sim, esta todos conhecem, mas não é por isso que deixa de ser uma dádiva dos céus! E o vídeo, Meu Deus, o Vídeo!)

Nota do Bloguista de Serviço: o “Vendo o mundo de binóculos do alto de Marvão” gostaria de agradecer a gentileza do site You Tube pela disponibilização de imagens à revelia. E pensar eu que perdi anos da minha vida feito estúpido à espera do Top + ou lá como é que se chamava aquela cena, para ver quem estava em 1º lugar, na ânsia de ver algo novo e descobria que era o Stevie Wonder, pela milionésima semana, com o inenarrável “I just call”. Pois eu, só telefonei para dizer que a Internet é a maior invenção do homem, porque é a soma de todos os outros progressos e já não digo mais nada hoje. Boa noite. Bons sonhos e até amanhã.

domingo, 26 de agosto de 2007

Um domingo qualquer


Se tivesse um diário, escrevia lá para a posteridade e para nunca mais me esquecer que o mês de Agosto é horrível. Podemos falar neste Agosto, em particular, mas eu lembro-me bem do outro e do outro e do outro e é sempre assim. Os que não acreditam em bruxas, nem em videntes, nem em búzios, nem em canículas, nem em canículares, têm de se render à evidência: o mês de Agosto é outra coisa qualquer mas não é Verão porque o tempo é miserável. Dormi de janela aberta e acordei gelado, a meio da noite, com uma trovoada que mais parecia anunciar o fim dos tempos. Levei o que restava do descanso a sonhar que os sete cavaleiros do apocalipse me entravam montados nas suas bestas pela casa adentro para me dizer que por edital do criador, o mundo acabava nesse momento.

Acordei obviamente mal-humorado, apesar de ter descoberto que afinal tudo continuava dentro da normalidade, ou então a minha rua depois do mundo acabar era muito parecida a quando este ainda existia.

De manhã, na televisão assisto a uma prova de marcha olímpica e dei por mim a perguntar-me se este seria o desporto favorito dos gays. Se os participantes seriam todos gays. Se o homem que elevou a modalidade a olímpica seria também ele gay.

A verdade é que tudo aquilo é muito estranho. Um atleta da marcha olímpica não está parado mas também não chega a correr. Aliás, é penalizado por isso. Não é carne nem é peixe. Anda ali feita lombriga a espernear pelo calçadão fora.

Eu sei que temos a nossa Susaninha Feitor que é grande artista da modalidade mas também ela pode dar para o outro lado. Tenta correr rapariga!

Não sei. O que eu sei é que tudo aquilo… e peço desculpa… me parece mesmo muito estranho.

Só sei que se eu fosse atleta da marcha olímpica e perguntassem à minha filha na escola qual era a profissão do pai, compreendia se ela mentisse e respondesse: “cobrador da Carris”.

El calor del amor en un bar



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Há dias, num almoço de família num restaurante da nossa praça, olho em redor e constato que muito provavelmente devemos ser os únicos portugueses à mesa. Os espanhóis como sempre, enfeitiçados pela qualidade da nossa cozinha e sobretudo pela força do seu euro que vale bem mais que o nosso, comiam demais, bebiam demais e sobretudo, falavam alto demais. A Portagem é um enclave espanhol em solo luso. Dizia-me o meu querido amigo João José que “os gajos estão com uma força de alta escala”. Na sua imensa sabedoria de anos ganha trabalhando na actividade turística, sendo um dos grandes “embaixadores” locais nas terras vizinhas, afiançava-me que “o turista espanhol investe com prazer”. Para eles, o dinheiro mais bem aplicado é o que é traduzido em bens que lhes entram pela goela abaixo.

O portuguezinho, apertadito, leva vida de sacrifício para pagar a vivenda e o carro que se quer actualizado. Os gajos, os espanhóis, querem é boa comida e boa bebida e mucha marcha que a vida são 2 dias e o que se goza é o que se leva. A la madre que parío las casas e las viaturas! Buen bacalao, buen viño e a gozar!

São capazes de estar certos.

Quando vim para as finanças para Marvão, herdei o serviço do Imposto Sucessório, posteriormente transformado em Imposto de Selo e que era um tema particularmente difícil para quem vive desde sempre nesta comunidade e quem conhece praticamente toda a gente. Traduzido, sempre que alguém falecia, era eu quem atendia os herdeiros e os ajudava na condução de todo o processo de tributação dos bens transmitidos. Particularmente difícil quando os que partiam nos eram chegados e éramos confrontados com a emoção dos familiares no decorrer do processo.

Aconteceu algumas vezes ficar a pensar sozinho que há coisas que não valem mesmo a pena. Às vezes quando os “velhotes” partiam, luzia no olhar dos filhos chegados de todas as partes para o funeral e para tratar da papelada, a ganância de ficar com o melhor quinhão. Pressentia-se o conflito e tantas vezes, o fraco elo de familiaridade que restava partia-se então para sempre.

Nisso os espanhóis estão certos. Para a frente é que é o caminho e quem fica atrás que feche a porta. Sólo se vive una vez!

Voltando ao programa familiar, para desmoer o repasto, nada melhor que um passeio por Valência que celebra agora as suas festas populares. Num café de esquina, tomando una copa de média tarde, olho embasbacado e sorridente o ar febril que se vive na sala. Os clientes são maioritariamente trintões e quarentões acompanhados das suas respectivas. São mais de vinte. Estão obviamente e etílicamente bem dispostos, bem “do meio para a frente”, como eu costumo dizer. Aqui, também nos ganham aos pontos. Bastava o som que debitava das colunas e um cd manhoso de um flamenco qualquer e parecia, ou pelo menos para eles era, a melhor festa do mundo. Tinham na cara um ar de felicidade e companheirismo que fazia daquele local algo mesmo muito especial. Os homens abraçavam-se e cantavam. Elas, de pé, batendo palmas e os pés, desafiavam os machos num baile de antologia. Um mais afoito, mais tareco, furava por entre a multidão, com passes de maestria bem regada. Era um consolo, um prazer tão bom poder assitir a tudo aquilo sem ter de pagar.

E imaginava o cenário em Portugal, na minha Santo António das Areias, em alturas do São Marcos, e vejo como somos tão diferentes. Para já, por aqui, as mulheres e os homens não vão juntos aos bares. Quando muito vão beber café, mas para os copos não. A aficcion etílica nesta zona é reservada aos homens. Contam-se pelos dedos as mulheres que vão ao café dar dois dedos de conversa e beber umas imperiais ou umas cubatas. Longe disso. Só por aí já é impossível recriar o cenário que vi em Espanha. E depois, por aqui, está todo o mundo muito mais preocupado em reparar nos outros do que em divertir-se. Aquela malta estava toda na mesma onda e tanto se lhes dava como se lhes deu que estivesse alguém estranho a ver. Eram livres, estavam à vontade e desfrutaram do momento. E de certeza que não foi por isso que são menos homens ou mulheres, menos respeitados nos seus empregos e nas suas vidas.

O nosso mal é que nos preocupamos demais com a fachada e com aquilo que os outros pensam e vivemos tantas vezes no jogo da aparência, do “diz que disse” e não nos esforçamos para sermos felizes.

Alguma vez seria possível, numa tenda qualquer do São Marcos, ver os casais da minha terra assim, a comer e a beber e a brincar juntos?

Está bem abelha!

Também aqui voto neles.

Nos casamentos por cá, é frequente, depois do almoço tardio, os homens encaminharem-se para o bar para mais um digestivo. As mulheres, na retaguarda, põe a conversa em dia e depois criticam “as tristes figuras” dos que se adiantam no programa.

No único casamento a que fui onde havia espanhóis e portugueses, da minha querida amiga Ana Rita, em Elvas, ainda os maridos não tinham acabado a sobremesa, enquanto guardavam os filhos e já elas dançavam junto ao organista, de cubata na mão.

Será que as mulheres espanholas são menos sérias?

Isso eu não sei, o que eu sei é que mais uma vez, tive o pensamento recorrente de que se o nosso Afonso Henriques tivesse tido mais calma com a mãe, a conversa hoje podia ser outra…

A nossa cientista


Já tinha lido sobre ela há algum tempo atrás. Agora voltei a reencontrá-la num jornal da nossa praça. A Isabel é do meu tempo do Liceu. Estudámos juntos em Portalegre. Não na mesma turma, mas na mesma escola, só que ela era de ciências e eu, de letras. De qualquer das formas, conhecemo-nos, tínhamos amigos comuns e recordo-me que se ria muito das coisas que eu dizia. Recordo-me que fechava os olhos quando se ria e eu tenho uma teoria que as pessoas que fecham os olhos quando se riem são honestas porque mostram tudo o que têm, desfrutam do acto de rir como se o quisessem só para elas. Tinha um sorriso bonito e estava sempre bem disposta. Não éramos assim amigos íntimos, mas recordo-me de falarmos e convivermos. Era do meu tempo pois.

Depois, como a muitos outros, perdi-lhe o rasto. Nunca mais a vi, mas li algures que estava a fazer uma carreira brilhante que agora confirmei. Realmente, um artigo na revista Science, não é para qualquer um e para mais, parece que as suas pesquisas têm sido muito profícuas e importantes para a humanidade.

O seu sucesso enche-me de orgulho por ela. Por ser portuguesa, por ser alentejana, por ser do meu distrito, por ter sido minha contemporânea. Fico feliz pelo seu percurso e desejo que vá o mais longe que puder.

Se eu fosse o Correia da Luz, já tinha dado o seu nome a uma rua, ou a um jardim, que é mais apropriado.

A Isabel é grande. E vai um gajo às vezes pensar que vale alguma coisa…

Boa sorte!

Mundo cão


A Leonor sempre foi uma criança atenta e curiosa. Sempre gostou de saber o que se passava à sua volta. Sempre fez perguntas. Mas agora, à medida que se aproxima a entrada para a escola, o frenesim e as perguntas têm aumentado. Há dias, quando regressávamos a casa de carro, perguntou-me porque é que a lua às vezes era preta e crescia. Tentei dar o meu melhor e fizemos uma viagenzita pelo sistema solar, que agora tem menos um planeta que no meu tempo e não mais alguns como seria de esperar. No verso da folha, fez um desenho da lua com um extraterrestre e um foguetão à mistura. Bem composto.

Reparei também que presta cada vez mais atenção aos noticiários. Num jantar recente, pedi-lhe que me deixasse dar uma vista de olhos às notícias, no intervalo dos desenhos animados, para saber o que se passava no mundo.

Nos 3 ou 4 minutos seguintes, as notícias foram sobre um puto que morreu em Inglaterra enquanto jogava à bola na rua, vítima de um disparo de uma arma de fogo accionada por um adolescente; sobre uma família dos Estados Unidos que quase perdeu os 3 filhos no Iraque e sobre uma mãe francesa que matou os filhos e os guardava numa arca frigorífica na cave, para que o namorado não descobrisse.

Olhei para ela, ao meu lado e dei graças a Deus por estar distraída, a brincar com o comer.

Apressei-me a mudar para a 2: e para a “Ilha das Cores”. Pelo menos assim, o jantar assenta melhor.

Realmente, o mundo que vai herdar, não é grande coisa…

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Às minhas Rainhas!


Quem me conhece melhor já me ouviu dizer muita, muita vez que é na infância que reside a última e única centelha de divindade que há em nós. As crianças vivem ainda meio imbuídas pela magia do limbo que antecede a própria vida e do qual jamais nos recordaremos quando somos crescidos.

Apesar de tudo, de tudo, foi na infância que eu fui mais perdidamente feliz.

Tão livre, tão solto e tão sem-fim que por mim nunca de lá teria saído. Cabelos pelos ombros, calças sujas e rasgadas de tanta brincadeira, sem relógio, sem regras e sem ordem para chegar, ostentando no rosto cheio de pó, as pinturas da última batalha com os peles-vermelhas da rua ao lado.

È por isso que o Peter Pan é o meu verdadeiro herói… porque foi o único que teve coragem para dizer que não, para bater o pé aos crescidos e defender a sua idílica condição. Refugiado no seu exílio da Terra-do-Nunca, servirá para sempre de símbolo e sentinela aos muitos milhões que se recusam a deixar de sonhar por esse mundo fora.

Não há nada mais cruel que se possa dizer a uma criança que “faz isto ou aquilo se queres ser grande!”. Como se os “grandes” fossem uma “grande” coisa que valesse a pena imitar!

Houve um dia em que a Wendy chorou, na janela da sua casa, à luz da lua e dos seus cabelos brancos, porque já crescida, não conseguia recuperar da memória as histórias de encantar que viveu em aventuras sem fim com os meninos-perdidos.

A luta para não crescer, para manter viva essa luzinha que vem dos nossos primeiros tempos, é diária.

Só há um sítio no mundo dos crescidos, onde estes quase por instinto, renunciam à sua condição e aceitam regressar a onde nunca sairiam pela sua única e exclusiva vontade e esse sítio é a praia.

Na praia, o doutor e o trolha, o brilhante cirurgião e o escriturário de terceira, o pintor da construção civil e o diplomata, encontram-se ao mesmo nível. Os elementos identificativos do padrão social ficam lá fora e de calçonitos, fica tudo muito mais parecido. É certo que uns lêem o “Expresso” e outros o “Correio da Manhã”, uns fumam “Marlboro” ou “Camel” e outros “SG Ventil” ou “SG Filtro”, uns bebem sucos naturais e outros médias geladas, uns discutem os negócios e outros a novela da noite, mas há um momento, nesse enorme parque infantil, em que se cruzam e metem as mãos na areia. E aí são todos iguais

Desde que tenham filhos pequenos e queiram entrar na dança, o dia e o baile são por conta deles!

E é tão bom reparar na carinha de felicidade quando se recriam nesse jogos sem fim…

Seja a fazer uma piscina natural ou um castelo na areia; a jogar ao enterra (em que ganha quem fizer o buraco mais fundo!) ou à carica em pistas de Fórmula 1 inventadas no momento; a construir uma sereia em que os cabelos são algas e o soutiã feito de conchas; a brincar com um papagaio de papel ou a fintar as ondas à beira-mar; integrados em mil pesquisas científicas por espécies imaginárias nas rochas ou em missões de salvamento de estrelas do mar… há muito por onde escolher!

Neste ano, com duas princesas na minha expedição, brincámos que nos fartámos, embora houvesse sempre muito, tanto mais para fazer. Dialogando sempre num espanholês característico, indecifrável para os ouvidos mais incautos (Eh amigue! Que eztás a fazero?), trocámos experiências e diversões e nem eu próprio acreditei que conseguiria andar mais de 5 metros com as duas montadas nas costas, arrastando-me de quatro patas, zurrando e escoiceando, servindo de cavalo do Bastinhas com fôlego suficiente para continuara a respirar. Foi de rir até cair para o lado.

Nas toiradas improvisadas, era touro furibundo, ao ponto de numa só assentada, derrubar todo o grupo de forcadas dos Outeiros. Está bem, eram só duas, mas mesmo assim, a pega foi rija. Ainda tenho os calções entalados…

Para a história, fica a criação pelas duas cientistas do verdadeiro “Homem-Lama”, completamente coberto pelas areias do mar profundo, espectáculo de raridade onde nem a boca se conseguia discernir!

Para a história, ficaram as memoráveis actuações de equilibrismo das fabulosas irmãs Russas “Mariova e Leonorova”, capazes de encantar as assistências do areal inteiro com a destreza dos seus mortais encarpados, duplos e triplos voos para o abismo!

Para a história, fica a mutação do “Homem-Croquete e Sus Muchachas”, que só não resultou em pleno porque faltou o palito no tal sítio… ( e ainda bem que não havia ali nenhum à mão! Senão tinha sido mais que certo”).

Para a posteridade e memória futura, fica uma semana do tamanho de um Verão sem fim porque nunca ali regressarão com a ternura dos 5 e dos 4 anos e foi tudo tão bem passado entre nós 3 que eu digo, “bem hajam”, por me terem feito tão feliz...

Tão igual a vocês...

Rentrée!

O Engenheiro também desenhava bem...

Ah, meus amigos, de volta ao prazer da vossa companhia...

Lamento a saída tão repentina, mas este vosso escriba não quis fugir à regra geral e também foi a banhos.

Eu sei que podia ter deixado na porta um papel dizendo “Fechado para balanço”, ou “Encerrado para descanso do pessoal”, mas assim foi mais divertido, sempre a malta ficou a pensar que eu podia regressar a qualquer instante. Eh, eh! Brincadeirinha!

E na verdade podia, mas para ser sincero, não me apeteceu.

Os lânguidos dias de Verão, mesmo sendo um Verão da loja dos trezentos, convidam ao lazer e ao repouso, à meditação e ao relax e nada, nada de teclas e monitores. Tirei vacances de todo esse andamento e pareceu-me tão pequenino, tão poucochinho, o tempo…

Analisando os vossos comentários, destaco o subversivo J. Buga que apesar de ter contraído paixão tardia pela era cibernética, está cada vez mais pirata informático, dinamitando todo o santo blog onde mete a unha. Diz ele que vem em “contramão”! À luz daquilo que sei hoje, não tenho a mais menor dúvida que foi ele que esteve na base da troca do Engenheiro do Penta pelo Camachito.

A malta influente é mesmo assim… manda duas ou três bocas num blog de 5ª linha e mexe os cordelinhos de tudo o que é cena conspirativa nacional. Em grande!

Eu imagino um lacaio qualquer a entrar no gabinete do nosso “Orelhas”, segredando-lhe nas respectivas: “shô presedente, o Buga diz que o Santinho está a mais” e lá vai a cabeça do sisudo a rolar pela escadaria abaixo, para se aninhar aos pés da nossa águia predilecta. Muito bom!

Mas eu tenho pena do engenheiro. A sério. O homem andava cheio de tiques, todo nervoso, sempre mal disposto, com ar de quem acorda com azia, a vociferar pelo tapete fora. A verdade é que eu nunca gramei o tipo. Sim, eu sei que agora é fácil dizê-lo, mas quem me ouviu atrás sabe que eu sempre o disse.

Agora também sei que ele tinha alguma razão. Pintarem-lhe o Simãozinho e o Mane Fernandes de uma assentada e antes de começar o campeonato… dói um pouquinho. Sim, não se podem fazer omoletes sem ovos mas há muitos anos que eu não me deixava dormir a ver o Benfica jogar na televisão, como no último sábado, ao ponto de acordar com o barulho que fazia a ressonar.

Mas nós vamos dar a volta, meus amigos, não tenham ilusões. Nós, benfiquistas, gostamos mesmo é de sofrer. Isto é para malta rija, pá! Começar a pré-época preparando a equipa que há-de ser a principal na prova rainha? Nada disso, isso é para franganitos! Nós gostamos é de trocar as voltas todas a todos, mudar de mister a seguir à 1ª Jornada e antes da eliminatória decisiva para a Champions. Isto é que é ser benfiquista! Jogar sempre no limite!

Para quem não saiba, nós estivemos mesmo para encavar o Leixões e eu sei que a táctica era essa: nunca marcar antes dos derradeiros minutos, que é para a malta estar toda em suspense. Depois do golinho, aborreceram-se e disseram: “ouçam lá, vamos mas é deixar os gajos empatar porque isto de começar o campeonato a ganhar não lembra nem ao menino (Jorge) Jesus!”. Ganda rapaziada! Bem hajam!

E o mais lindo foi ver o Nuno Gomes a dizer na flash interview que precisa é de descanso e tranquilidade. DESCANSO E TRANQUILIDADE? Uma prostiputa daquelas que não tem jogado a ponta de uma beata a pedir tranquilidade! Descarada! Sempre esperei que entrasse o marrafinhas do Paulo Bento por ali a dentro a reclamar a patente da expressão. Segundo sei, tem o exclusivo para esta temporada.

Vem o Camacho. Que todos os santinhos menos o Fernando o protejam, que bem merece.

Eu, já acendi duas velinhas ao lado da fotografia que guardei da última vez que cá esteve.

A ganar! Óstia!

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

A educação... física

(não! não sou eu. É da net.)

Eu sei que tenho excesso de peso. Sou forte. Sou pró cheínho. Tenho uns quilotes a mais. Prontos, sou gordo. Acho que sou. Uso sempre de XL para cima. Em tudo! Da meia à cueca, da camisa interior ao casaco, sempre XL. Às vezes XXL. Mas isto é uma cena que já vem de trás. Quando tinha os meus 6 anos, quando era lobito da alcateia cinzenta do Agrupamento 659 dos Escuteiros da Beirã, já usava boina do tamanho da dos chefes. Sempre fui um coche cabeçudo também.

Acho que herdei esta cena. É uma coisa que acontece e da qual não tenho culpa, penso eu de que. É uma contingência genética. Pelo menos tento-me convencer muitas vezes que assim é, para me perdoar a mim mesmo.

Mas sei que não é por isso.

Mando-me para os noventa e muitos, a espreitar os três dígitos e não devia passar dos 80 que é o número de centímetros que levo a mais que o metro. Tenho 18 quilos a mais, na proporção de mais nove em cada perna, mais nove a carregar todos os dias em cada pata. È desgastante.

Quando fui à Medicina do Trabalho, em Fevereiro, estava mesmo à espera que o gajo da bata branca me estragasse o Carnaval. Mas para minha surpresa, agradabilíssima surpresa… não estragou nada! Eu à espera que ele inventasse um colesterol, uns diabetes, uma tensão e… nada! Mas falou-me no peso. No peso a mais.

Comecei a praticar desporto há mais de 10 anos como forma de aliviar a pressão e de adoptar um estilo de vida mais saudável. Comecei pelo mais óbvio e pelo mais barato, calçando uns ténis e correndo. Depois foi a natação que nunca mais abandonei, o BTT e por aí fora mas acho que o meu organismo já está imune ao desporto. Por mais que faça, o gajo parece que se alimenta do próprio suor. Não emagrece, mesmo.

Optei assim recentemente por uma redução calórica na alimentação. Eu, Meu Deus, que gostava tanto de repetir (quase sempre!), vi-me reduzido a umas proporções miseráveis que colocam em risco a minha sobrevivência. Comer pouco, cada vez menos, muitas saladas, menos fritos, uma afronta!

Depois de alguns meses de privação… os resultados não são animadores. Tá tudo mais ao menos na mesma. Porque também, convenhamos, às vezes pareço aquela fabulosa personagem do Herman, quando o herman era Herman, do gajo que estava a fazer greve de fome e só parava ao meio-dia e às 8 horas para comer uma sandes.

Há coisas que é muito difícil evitar, mesmo muito, sobretudo no Verão e sim, estou a falar na proporção vital diária de maltes líquidos. Imprescindível!

Tudo isto para dizer que não sou metrosexual ou lá o que é isso! Eu não sou o David Beckham. Não passo horas ao espelho. Não acho que seja vaidoso mas que raio! Toda a gente se preocupa com a sua aparência, presumo eu, e toda a gente tenta ser ou parecer o mais bonita possível. Parece-me elementar.

E é por isso que eu agora como pouco e corro com grande prazer, sobretudo desde que se inventou o mp3. Uma corridinha ao fim da tarde, a ouvir um disquinho recém-sacado, é delícia suprema. Segue-se banhinho, janta ligeira e maratona de sofá nas modalidades filmes, escritas ou jornais, é serão de privilégio!

E escrevo sobretudo para deixar claro como é injusto quando se riem e gozam comigo quando corro. Não tem piada nenhuma.

Eu sei que sou torpe, eu vejo a sombra, mas mesmo assim, não mete graça! E estou aqui para me defender.

A começar pela tirada básica, “ah, ah, ah, olhem para ele, como corre tão devagar…”.

Ah, ah, ah… o Tanas! Para já, para já, o que eu faço não é correr. Correr é o que fazem os cavalos e os galgos nas pistas. Eu faço jogging, que é o que fazem os americanos nos filmes e nas séries porque o jogging é muito mais complexo. Um gajo para fazer jogging tem de saber dosear a velocidade, pisar o chão com estilo e graciosidade e quando atinge os níveis máximos, tem de colocar os pés ao ritmo da música que ouve no Walkman ou no leitor digital. A diferença que existe entre o jogging e a corrida é a mesma que existe entre o Yoga e a espargata. Eu faço jogging e ando-me a evitar de meter uma fita na cabeça como fazia o Bjön Borg para que todos percebam que o jogging é uma arte. Da próxima vez não riam, contemplem. O jogging é estilo e é para ser feito devagar.

Outra investida bem popular é: “só corres a descer! Queria-te ver era a subir!”.

Eu jamais respondo! Nunca respondo porque me falta o ar e não sou capaz mas mesmo que tivesse ar, acho que não respondia. Como é óbvio para quem não chumbou a Física no oitavo ano e conhece as leis da gravidade e a história do tal Newton que levou com uma maçã na peruca, a força da gravidade puxa-nos para o centro da terra, como se fosse um íman. É por isso que é mais fácil levantar um cinzeiro que uma arca congeladora cheia de gelados passados da validade. Sendo assim e transpondo as realidades para o assunto aqui à baila, toda a gente prefere correr a descer ou no mínimo a direito, do que a escalar Marvão. A menos que seja masoquista. Como eu não corro por obrigação, mas sim porque quero, eu corro como me apetecer e onde me apetecer. Se for a descer melhor. E esses totós que encontro aí pelas ruas e mandam a boquinha, têm de passar a usar o que têm entre as orelhas: se a minha volta habitual parte da minha casa e termina também lá, se desço, também tenho de subir algures. Elementar, ãh?

Vou-me mesmo armar em Marcelo e vou desconstruir a última: “andas aí a correr para quê, se depois bebes fresquinhas e comes demais?”.

Mais uma pérola de genialidade com resposta simples: “mais vale praticar desporto e partir a cantarinha do que fazer como muitas alimárias que levam todas as santas tardes/noites com a barriga encostada ao balcão. É verdade que a menos que haja uma catástrofe e toda a cerveja desapareça do mundo (Deus nos livre!), dificilmente terei um corpo Danone nesta vida. Mas pelo menos esforço-me e mais vale esforçado que derrotado. Chupa e embrulha!

Respondendo a estes meus amigos que gozam comigo e me esperam nos passeios e à porta dos bares para se meterem com a minha respeitável actividade física e desportiva, aqui fica a resposta.

E ficam sabendo, apesar de estar quase certo que nenhum deles anda por estas paragens, que uma nova era se vai iniciar. Investi recentemente nuns calções mesmo, mas mesmo de corredor, daqueles justinhos às pernas que dão na televisão, e a coisa nunca vai ser a mesma porque quando vou a correr e olho para os pés, parece mesmo que as pernas não são minhas mas são para aí do Carlos Lopes ou do Mamede (esse não que desistia sempre e era do Sporting), mas para aí do Carl Lewis. Cortam o vento, dão agilidade, potenciam a marcha e logo na estreia ganhei 8 minutos à volta normal.

Meus amigos, da próxima vez que me virem passar em pleno jogging, desviem-se por favor, para não caírem com o túnel de vento que crio durante a marcha e se tiverem que fazer alguma coisa, não riam… batam palmas!

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