Montegordo 2014 créditos fotográficos: sr. tio sabis
Ainda
estou muito longe de conseguir perceber essa maravilha estapafúrdia chamada
Google+. Sei que nos dias de hoje, tudo
o que é tecnologia e multimédia vale quase como tanto quanto a vida. Mas ainda
assim, prefiro o ser, o respirar, o tocar, o comer e um cigarro saboreado a
contemplar a paisagem. Tudo aquilo que nos faz sentir vivos.
Nestes
últimos dias tenho-me desvorciado das deambulações narcísicas facebookianas de que
sofremos todos os que por lá passamos. Mais ou menos tempo, de acordo com as
andanças diárias de cada um, mas sempre a mais do normal que seria desejável.
Tenho
andado arredado a viver. O que é muito bom. Não partilhável nas redes. Mas
sempre partilhado na vida.
Traído
pelo segundo smartphone que caiu em K.O. técnico do nada (Sony Xperia - Samsung
SIII mini), ainda atordoado pelo segundo tablet gripado (também Samsung) pelos
ares que lhe deram, tornei-me info-excluso.
Afastei-me
do @rroba.
Como
não consegues viver sem elas, hoje depois de ver as notícias passeei e
deparei-me com isto. Como é óbvio: fiquei rendido.
Diz-me
espelho meu, espelho meu: porque será que acho que tu sabes coisas de mim que
nem eu sei que as sei, ou vivi, ou sequer me lembro que as vivi.
Afinal
este Papa Francisco não mete só a populaça a dançar tango na Praça do Vaticano
quando faz anos; nem só diz, sem complexos e sem peias que sendo argentino,
gosta de vinho tinto.
Ele
foi o grande motor disto que está a acontecer. Esta mudança histórica, há uma
década impensável, aconteceu mesmo e é tão bonito de ver as famílias a
reencontrarem-se com os prisioneiros agora libertados de ambos os lados que
tudo isto me comove.
Papa grande mas não é o único motor de justiça e alegria no mundo
E como
dizia O GRANDE Dylan, os tempos estão mesmo a mudar.
E isso
é bom.
Muito
bom.
Bastava
os galos no poleiro serem outros como os depostos (pela vontade ou pela lei da
vida), mais fechados, menos sensatos, para o mundo ser menos feliz, menos bom
de se viver nele hoje.
Adoro
a música e o vídeo. Isto para mim é punk rock dos anos 2010.
Se original
faz-me dançar e é muita bom, fiquei rendido com a versão da Dona Alice da qual
só consegui captar um excerto. Só consegui gravar o refrão mas ela traduziu-a
toda! Sério! ;)
Tive
este sentimento num dia de Verão quando abalaste,
Bati
com o carro contra uma ponte, fiquei a vê-lo arder,
Meti
as tuas merdas num saco e atirei-as escadas abaixo,
Mandei
o meu carro contra a ponte.
Que cá
saber disso! Adoro! Quero lá saber disso!
Estás
numa estrada diferente, eu estou na via látea,
Tu
queres-me com os pés assentes na terra, mas eu estou no espaço,
És tão
difícil de satisfazer, temos de rebentar esse interruptor,
Da janela onde passei uma infância e da qual nunca mais vou olhar...
A
minha Leonor, de 13 anos, ontem viu o post que eu estava a fazer no facebook e
disse: “valha-me Deus!”
“Valha-te
Deus porquê?, Leonor. És parva?”
“Ó
pai, valha-me Deus porque o facebook não é para esses testamentos…”
Se
não é para estes testamentos, agora aqui, a sós, em casa como eu gosto e mereço
estar, sozinho comigo mas com o espaço todo da minha tasca virtual, posso dizer
o que me vai na alma. É aqui que me confesso. É aqui que me encontro. É aqui
que me descubro.
Isto
é público?
Não
interessa. Quero lá saber se o psicólogo tem um altifalante atrás da cadeira,
para a praça toda ouvir. Eu sou transparente. Não tenho espelhos. Só vidros,
porque sei bem o que vai cá dentro.
Manhã
difícil. Dizem que os homens não têm medo. Mas eu estava com medo de fazer isto
e de voltar àquela casa. Ainda assim, alguém tinha de ir “despejar” os últimos monos
antes de uma senhora lá ir limpar a casa que sempre foi a da Cali, para que
possa ser entregue antes do final do ano, que já está pago e será o último para
sempre.
Uns
não podem (mesmo que quisessem, que eu sei que querem), outros não estão cá
(infelizmente para tudo), outros têm de trabalhar e têm mais de fazer até
porque esta guerra não é a deles, outros liminarmente não querem e… o Pedro
Sobreiro teve assim de se encontrara
sós com o passado e fazer uma pega de caras a esse animal pesadíssimo. Trabalho
muito pesado. Não pelo esforço físico mas por ter percebido mais uma vez que as
casas não são quatro paredes e um telhado. As casas têm vida, as casas têm-nos
lá dentro e estão dentro de nós. Cada prateleira que tirava da parede, cada
azulejo que tocava, cada armário que abria, cada até autocolante que me
aparecia no chão vindo sabe-se lá de onde, que até o pensava há muito
desaparecido, mexiam comigo, faziam-me suspirar e fechar os olhos.
Eu
já sabia, porque já pensei muito nisso, que os passos mais importantes da nossa
vida têm de ser feitos a sós. Nós sozinhos. Quando se nasce e quando se morre,
por mais acompanhados que estejamos, seremos sempre nós a darmos o primeiro ou
o último suspiro. É assim e nada há que possa ser feito para combater e alterar.
Quanto
à casa… eu sou aquilo, eu sou ali também e tive de voltar e respirar tudo outra
vez. A aparelhagem, a marquise da cozinha onde passávamos as tardes à braseira
(eu, a avó Joaquina, a Maria e a Cali), o sítio onde estavam as galinhas e ia
buscar os ovinhos pela mão da minha avó para comer a gemada quando ainda
estavam quentinhos, o forno feito pelo primo Zé onde assávamos os cabritos a
lenha na Páscoa…
Tudo
outra vez.
Olhei
Marvão e não se via.
Deixei
todos os detergentes, lixivias, vassouras e esfregonas prontos a atuar numa
casa já em condições de ser entregue para ser limpa. Tudo feito com cabeça,
tronco e membros. Como eu gosto.
Encontrei-me
com uma vizinha querida da minha rua que me conhece desde bebé e me disse: “ai
o Pedro… Sempre o Pedro… Então o que andas a fazer?”
Expliquei
e disse-lhe: “Vizinha, nós temos sempre que fazer o que a nossa consciência
manda. A mim não me importa o que os outros pensam. Pode-me influenciar e levar
a pensar, se as pessoas estiverem próximas e me quiserem bem, mas não me obriga
em nada. Tenho de pensar que eu é que sei. Posso estar errado. Mas também sei
pedir desculpa porque ninguém é perfeito e eu conheço as minhas fraquezas melhor que ninguém.”
Sentia-me
mal, em baixo por tudo o que passei nesse dia e ela, já sem marido e sem o único
filho que tinha, que perdeu sem nunca lhe ter dado netos, contou-me que ainda
há dias mandou pintar a casa toda e arranjar tudo. Isto a propósito de se ter
de fazer o que se tem de fazer.
“Tu
ainda tens as tuas filhas e a tua mulher, filho. E eu?”, e continuou a subir a
rua, para ir almoçar sozinha, naquela casa que “em tempos tudo pareceu pequeno
e agora…”
A
vida não é fácil e a porra é que nem sequer tem um livro de instruções onde um
gajo possa ir ler o que dizer em determinada altura. Ou então ficar calado.
Dia
difícil.
87-88. Desenho de Henrique Batista A contestatária a sair de C(um castelo) de Vide. Era finalista. Estava a acabar e a sair. Nunca mais vi este autocolante que me apareceu hoje nas mãos do nada. Lembrava-me perfeitamente dele. Como se o tivesse visto ontem. Há 26 anos. Um papel trouxe as memórias da noite em Pombal, da viagem ao Porto, de tantas memórias... um papel no chão trouxe isto tudo.
Aqui as tardes. Lá em baixo, as galinhas
Um esquecido que foi transferido... para minha casa
Tantos e tão bons assados...
Está lá sempre...
Estante de madeiras atadas com corda, creio que feito pelo meu pai. Lavado e tratado sei que servirá a quem o dei.
A minha marca no cimento feita com a roda da biciclete. O PEDRO já desapareceu. Mas valeu um ralhete
Elas riram-se mas eu gosto muito do meu enfeite novo de Natal. Diz-me muito.
Do
sempre duro regresso à minha Beirã, parei na casa do meu amigo Tó para lhe
entregar dois cds que lhe prometi, com a dedicatória: "para o grande poeta, meu
amigo António Gonçalves." O mundo pequenino da Deolinda e o novo e fantástico
regresso dos U2. Em pijama entrou em êxtase. “Calma António. Eu disse que vinha
cá, não disse?”
Ficou
radiante e por
força que me queria oferecer dvds, livros, filmes... “escolhe aí das
prateleiras…”
“Tó,
olha para mim, eu só te quero dar os discos e um abraço. Dá cá um abraço.”
“Epá,
tá bem mas leva lá um cd que te vou buscar…”
E
ofereceu-me ao calhas (ou talvez não porque eu não acredito em acasos) o cd que
ouvi em disco até à exaustão e marcou a minha vida porque me fez perceber que
as músicas não são só sons engraçados para se dançar. Também podem ensinar
muito sobre a vida e esta, deste disco, marcou-me para sempre.
A
Leonor viu o cd no carro e levou-o para o quarto. Obrigado António. Quem dá…
recebe a dobrar.
Soube
agora por aqui que a minha filha vai hoje fazer anos e quero ser o primeiro a
dar-lhe os parabéns. A minha caçula, a minha pequenina, o meu milagre
impossível de ver o meu amor pela Cristina feito gente já aconteceu há 13 anos.
13
anos. Apesar de ela ser trapaceira e dizer que são 24, eu fui ver ao cartão do
cidadão e afinal são só a contar desde 2001.A alegria que sinto ao teclar estes
botões pretos não é mensurável. Faz-me transbordar e agradecer de corpo inteiro
e vi’alma a quem manda nisto tudo (seja Deus, Alá, Buda ou o acaso, que não
acredito que seja porque há aqui ordens a mais na terra para isto tudo funcionar)
por poder viver este momento.
Nasceu
e vi logo que ia ser torta. Com a mãe tão grávida, tão grávida que estava quase
a rebentar, falhou o feriado do 1 de Dezembro como eu queria, e assim a
garantia que iriamos no futuro estar todos juntos nesse dia. Mal sabia eu é que
já revelava aptidão política e inteligência in útero ao antever que viria a
troika e trocaria isto tudo, ao ponto do 1 de Dezembro de folga deixar de o ser
um dia.
Torta
mais se revelou na forma como escolheu desaguar neste mundo. Com o hospital do
José Maria Grande que também foi doutor, em obras, fomos recambiados para a
ortopedia, num piso qualquer lá em cima. E desculpem-me lá de estar a contar
esta história outra vez, quando toda a gente já a sabe mas eu gosto e faz-me
ficar feliz nesta altura, quando se chega aos anos dela. Isto é como o Natal,
que é nesta altura de propósito. Toda a gente já sabe que o menino nasceu numa
manjedoura, sem ar condicionado, aquecido pelo bafo de uma vaca e um burro, nas
palhinhas deitado, nas palhinhas dormido e ainda bem que nessa altura não havia
a ASAE senão ia tudo dentro; mas ninguém se cansa de ouvir a história. Por isso
ouçam lá a do vosso Tio Sabi que ele gosta muito.
Pois
eu queria mesmo ver a minha filha a aterrar no planeta terra. Era a primeira
vida gerada por mim. Porra.
E
avisei o pessoal todo que apanhava no corredor. “Olhe que eu quero ver…” ( e
fazia beicinho e um ar de súplica que penso que resultava porque eles ficavam
com pena.)
Mas
as visitas abalaram, a noite caiu, já estávamos perto da meia noite, foi ficando tudo deserto e já não via a
minha Cris há um tempo; se ela já estava em trabalho de parto quando a deixei à
tarde… Não? Ai aquilo não era trabalho de parto?!?!? Não podia ser tantas horas
antes? Então
haviam de ver a pobre como transpirava (das senhoras não se diz suar porque
senão era isso, por ser tanto) para verem se aquilo não era trabalho. Era sim!
Mas
os maqueiros e os enfermeiros
e os ajudas e o pessoal de apoio me disseram: Ai é Dr. Durão? Ai joga o Benfica? Ooohhh… então
prepare-se porque só depois do jogo é que nasce.
O
médico vinha animado mas sorumbático como sempre. (agora posso dizer a verdade até
porque já não conto que acompanhe mais nenhuma gravidez minha. J)
Entrou,
não me cumprimentou (hábito…), foi andando pelo corredor fundo, tão fundo...
até à ultiminha porta, onde a minha mulher estava.
Eu,
utilizando as técnicas que aprendi nos raides dos lobitos, fui-me esgueirando
entre as ombreiras das portas e fiz-lhe a surpresa quando a minha mais que tudo
já estava sem forças depois de ter aguentado tanto tempo. A cara de sofrimento
e esgotamento dela doía até a quem não a conhecia. Imaginem a mim…
Uma
enfermeira (uma tipa com cara de bruxa e uns caracóis louros platinados)
barrou-me à porta. – Não pode entrar!
-
Mas eu pedi… Eu quero ver nascer a minha filha… é a primeira… (e a generala que
não se torcia, nem se amolgava)
-
Não pode.
-
Mas por favor…
Por
favor…
Por
favor…
.
Doutor, está aqui o pai a dizer que quer ver. (com o ar de um empregado de
balcão que diz para o da caixa: saí um galão pingado!)
-
O pai é muita grande e a sala é muito pequena e está aqui muito calor. (com uma
ternura, sensibilidade e humanidade tocante…)
A
bisca lacaia empurrou-me com jeito, encostou-me a mão e assim abriu o flanco.
Segurei-lhe a mão, apertei-lha com jeito, assim bem apertada, muito bem apertadinha
(de maneira a fazer-me entender mas não ao ponto de a fazer chamar o segurança,
e disse baixinho: EU SOU O PAI. EU CONHEÇO OS MEUS DIREITOS.)
Foi
como a gruta do Ali Bábá quando ele disse: “abre-te sésamo”.
Entrei,
passei e fiquei de frente para a minha mulher o que é uma experiência… tocante.
Vi a minha Alice também nascer mas foi como deve de ser. De lado. Com pára-quedas.
Mais romântico, mais poético, mais bonito. A Leonor foi como dizem o ingleses:
RAW MATERIAL! Dureza!
Mas
não me senti mal, nem vacilei, nem nada. Tudo bom ao ponto de me orgulhar em
mim. Suportei aquela tentativa de utilizar outros materiais menos naturais
porque não passaram de hipóteses e conversa médica. E se nós… mas não foi
preciso. Saiu naturalmente. As contracções impeliram-na.
A
minha única aflição foi que a cachopa não chorava. COMO NÃO CHORA SE NOS FILMES
É LOGO A PRIMEIRA COISA?!?!?!?!!?
Estava
já eu quase a chorar quando a aspiraram e abençoado aspirador que fez ouvir o berro
mais lindo de sempre.
Foi
a maior alegria da minha vida. A mais contente. Mas fiquei tão feliz quanto
extenuado. Eu e a mãe, que a carinha tranquilizou quando a viu nascer com uma
felicidade divinal.
Mas
apesar de cansado, tinha os amigos todos à espera para um jantar organizado ali
em cima da hora no Zé Calha; seguido de uma lerpa em minha casa no Espírito
Santo até altas horas da madrugada. Como na igreja ao lado estava a realizar-se
um velório, chamava insistentemente atenção para o pouco barulho, até porque aquele
era um prédio de trabalhadores da câmara que tinham de se levantar bem cedo
para estarem no parque de máquinas. O que vale é que o meu irmão estava cá e
ajudava: olhem que acordam o morto!
Já
não me lembra bem como mas a garrafeira levou arrombo e quando acordei no sofá
já tudo se tinha ido embora. Estão a ver o vídeo do “Come Undone” do Robbie
Williams?
Pois…
foi assim do género. O frigorífico vazio, o armário do liquor idem, idem; aspas, aspas; e os pratos da avó da
minha mulher retirados das paredes onde estavam expostos e cheios de lasanha no
lava louça. Vá lá, vá lá isso.
Foi
tudo inesquecível e fiquei tão feliz de recordar aqui isso. Bem hajam todos.
Tenho saudades. Alguns continuam perto como sempre, outros estão mais longe
pelas voltas que a vida dá como o meu irmão e o Pedro Matos; mas na verdade, na
verdade, estão todos aqui bem dentro do coração.
Quando
regressávamos do hospital, os dois… os três! tão sem jeito… olhei no espelho e
perguntei: “e agora, Cris?”
Ela
sorriu com aquele ar dela. De quem sabe sempre por onde ir.
E
é por aí que temos ido. Todos juntados, como diz a pequena.
Obrigado.
Às
duas. Às três. As mais importantes na minha vida.
A
Leonor hoje é uma menina já mulherzinha com a qual choco muitas vezes porque a puberdade
é mesmo a porra da idade.
Mas
eu sei que se a Alice é toda mãe, a Leonor é bem Sobreiro, e barraqueira como o
pai e o avô. Vejo isso pelo humor que tem.
Quando
cresceres mais e ficares mais velhinha, sei que vais voltar para mim com toda a
força.
Agora
tenho de acabar isto porque já estou a escrever há mais de 1 hora e quero ser o
primeiro e nem sequer vou ter tempo de escolher uma foto linda das tuas que
tenho milhares.
Porque
tu, ao contrário do que digo à Alice que é a minha filha preferida (tem 4,
Leonor… Tu não te lembras quando eras assim. Mas eu lembro. Tanto. E tu, nessa
altura, não tinhas uma irmã embirrante como ela tem agora. Isso passa-te.),
TU ÉS A ESPECIAL. TU FOSTE A PRIMEIRA. E és
mesmo mais bonita que a mãe.