quarta-feira, 24 de abril de 2019

Coisas que me fazem realmente feliz...


Quando se está todo o dia no atendimento do público, 7 horas por dia, enquanto se vai fazendo serviços em back office; ainda por cima bem junto à porta de entrada do serviço, estamos muito expostos a todo o tipo de pessoas, discursos, problemas e situações, estados de espírito, e, como não, pressões.

Em Marvão, atendem-se imensos cidadãos estrangeiros. Isso acontece porque a comunidade de naturais de outros países é cada vez maior entre nós. Muita dessa chega em busca do contato com a natureza, da tranquilidade dos dias com que se vive por aqui, à procura de afastamento das grandes urbes, da poluição, dos engarrafamentos, do stress.

Muitos são ingleses, espanhóis, alguns americanos, e no serviço local onde trabalho procuram sobretudo a capacidade de lhes ser realizado um atendimento bilingue, onde se sentem à vontade. Qualquer um dos três funcionários compreende a língua inglesa, e é capaz de estabelecer um atendimento com quem apenas se sente capaz naquela língua. Isso, creio eu, é uma enorme mais valia, e acredito até que seja um fator diferenciador que nos pode distinguir pela positiva.

O casal que me entrou há dias, pela meia manhã, era de uma senhora muito composta, tipically british, de meia idade, acompanhada por um jovem que colocaria na casa dos 40, como verifiquei depois no passaporte. Tinha menos 3 ou 4 que eu mas… parecia meu filho, e lá vem a porcaria da história da falta de cabelo, que nos transporta logo para a casa dos 50. Tu podes estar em forma, podes estar atlético, podes-te cuidar, podes ter preocupação em te arranjar, podes não ter rugas, podes levar uma boa alimentação, podes não ter hábitos nocivos compulsivos, mas… a falta da penugem capilar, catapulta-te sempre umas décadas à frente.

Ora o rapaz tinha um ar assim meio informal, a atirar para o neo-hippie, de fartos cabelos (lá está ele!) aos caracóis, que lhe caiam em farripas encaracoladas.

Pois a senhora começou por se expressar num português muito bem colocado, pronunciado, expressivo e claro. Queria criar um número de identificação fiscal para o jovem.

A páginas tantas, eu e o meu vício de meter conversa, de não me limitar ao essencial (gajo de humanidades a respirar num mundo de números…), sorrindo, perguntei: é aluna do João Aleixo? (O João Aleixo é um jovem que chegou ao nosso concelho há um par de anos, exerce diversas atividades em vários ramos, faz sempre tudo bem, e prima pela sua simpatia, boa educação, e é, de longe, o melhor professor de português da comunidade estrangeira. Os seus alunos dizem sempre de si maravilhas, esforçam-se por fugir à língua natal, tentam sempre usar a nossa, e são pessoas que se vêm… felizes)

- “Não”, respondeu ela, num português impecável. Sou professora de inglês no ensino superior em Portalegre, e aprendo imenso com os meus alunos.

- (com natural cara de paro. A minha, enfim…) “Pois… (sorrindo), o nível aí… ainda é melhor!”

- Mas tu também falas bem inglês…

- Ahhhh… (envergonhado, claro!) Obrigado. Eu tento, não é? Sabe que também dei aulas de inglês aos alistados da G.N.R. em Portalegre, quando acabei o curso de Comunicação Social, em Lisboa. Regressei à terra, e como não havia aqui mercado (jornalístico) para mim, tive de me integrar no que existia. Consistia apenas em dar as noções básicas e mais essenciais, para que pudessem estabelecer uma conversação com pessoas nessa língua universal. Foram apenas três anos, e muito bons tempos…

- Mas tu também és muito conhecido, Pedro. As pessoas dizem que tu também falas muito bem inglês, sabes? És muito famoso por aqui.

(riso amarelo. Envergonhado) “?!?!?!? (pensando, tentando não ficar com um ar ainda mais aparvalhado) PEDRO?!?!? FAMOSO?!?!?!? J J J J J

Fiquei tão inchado e feliz que, caso tentasse sair pela porta naquela hora, teriam de me abrir as duas portadas da janela principal, porque apenas aí deveria de caber.

Que bom… eu cá gosto! E muito!

Tive esta durante o dia, e à tardinha, quando fui ao meu Chocolate, para o ritual da imperial babosa diária quando pode ser, cruzei-me no multibanco com o João Aires, um vizinho aqui do bairro, um par de anos mais novo que eu, que me interpelou, em jeito de brincadeira. Já não sei bem como, mas acabou por me dizer que andava a preparar uma exposição dos seus trabalhos a tinta da china, na Casa da Cultura, andava a escrever o texto de apresentação e… “oh Pedro, tu é que eras mesmo bom para isso! De certeza que fazias isso com uma perna às costas e …”


“epá… (outra vez envergonhado… Acho que pareço muito seguro de mim, mas vou ao tapete com facilidade…), ajudar posso, mas para quando?”

Acho que ele me respondeu: “para ontem… J

Então… puxando do telemóvel para tirar notas, pedi-lhe alguns dos dados que me poderiam servir de tijolos para o texto que comecei logo a fazer na cabeça, e nessa mesma noite, enviei-lhe este que acabou por adotar em definitivo, na íntegra (na imagem de cima).

Pois eu posso não ser professor, posso não ser escritor, posso não ser jornalista, posso não ganhar mundos e fundos à pala da minha verve, mas… sou feliz! E isso é tudo, para mim!

Tenho dito.


Nota: Ide, ide, que os trabalhos ainda lá estão, e sempre estarão em https://www.facebook.com/A-desenhar-Marv%C3%A3o-1401497510154759/

























O artista... admirando a sua arte...


a desenhar Marvão
exposição de desenhos a tinta da china, de João Aires



O João Aires é um miúdo de Marvão.

Ainda não chegado à casa dos 40, aqui nasceu, aqui casou, e aqui criou família, com uma miúda… também ela natural de Marvão. Nesta terra, chamaram à vida dois herdeiros que com eles aprendem todos os dias, os valores da vida, e o prazer em respirar este ar que desce a encosta do castelo.

Nesta terra que é a sua, encontrou ocupação, e há mais de 15 anos que trabalha na escavação da cidade romana de Ammaia, onde é auxiliar de campo, fazendo de tudo um pouco, e é necessário. Ali, gosta sobretudo de dar largas à paixão da sua vida, desde que se lembra: desenhar. Assim, tem o prazer de poder reproduzir as peças que são resgatadas das entranhas da terra, e recriar espaços, imaginando como seriam.

Autodidata, entusiasta, sem qualquer formação específica, vai, nos seus tempos livres, dando largas a esta sua vontade de criar.

A partir de 13 de Abril, a Casa da Cultura – Câmara Velha, acolherá a sua 1ª exposição de desenhos a tinta-da-china, a preto e branco, alusiva a Marvão, a espaços, e a cenas emblemáticas deste concelho.

Uma experiência a descobrir…

                                     (porque o João é mesmo craque!)


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