segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Celebrando o século (de Fátima)

A cara dela diz tudo...




Porque há quem pense que pensa, e por isso ousa pensar que imagina, que o mistério de Fátima, é muito maior do que o que os outros pensam que é, o dia de hoje foi vivido em plenitude, ao comemorar-se em Marvão, o encerramento do centenário das aparições. Para isso, o nosso (extraordinário) dinamizador padre Marcelino, conseguiu reunir padroeiros de 14 comunidades, do nosso concelho (Alvarrões, Barretos, Beirã, Cabeçudos, Escusa, Galegos, Marvão, Portagem, Porto da Espada, Santo António das Areias, São Salvador da Aramenha), e ainda de Castelo de Vide, Póvoa e Meadas, e São Julião; numa ambiência, verdadeiramente singular, presidida pelo Sr. Bispo da diocese, D. Antonino Dias.


Há quem pense que Fátima não foi (só, e apenas) uma invenção de Salazar, para animar o espírito dos portugueses analfabetos, subnutridos, sequiosos de algo a que se agarrar. A ideia de que a religião… é o ópio do povo, nascida de um filósofo (Karl Marx) que sempre se movimentou, numa área diametralmente oposta à do velho ditador, foi comum aos dois.


Pois eu acho que Fátima… é um mistério. Como a vida, como a religião, como a lógica de tudo isto. Tanto pode tudo ter sido inventado, como tudo pode ter sido mesmo assim. Será que Fátima teria acontecido num mundo, como o nosso de hoje em dia? Será que a virgem estaria disposta a ser sujeita, vista, revista e aumentada, ao ser captada por um dos milhares de smartphones que por lá estariam? Daria Youtube instantâneo? Publicação em quantos murais de facebook? Instagram para os mais outsiders/gráficos?


Provavelmente… todos sabem a resposta que eu imagino. Mas se calhar, até é por isso que nunca mais houve manifestações tão óbvias.


A palavra no meu vocabulário é… respeito. Silêncio, respeito, e fé. Acreditar que possível. E respeitar.


Também já eu fui até Fátima, a pé. Fui, como eu acho que essa caminhada deve ser feita: como o nascimento, como a morte… a sós. Fui cumprindo a promessa do regresso do ultramar com vida, a quem nunca me pediu para o fazer, e já cá não estava a entre nós, já nesse então, para me agradecer. Fui. Sem estar à espera de nada. Sem aparelhos tecnológicos, sem telemóveis, sem gadgets para minorarem o passar do tempo, fui sempre a pensar. Já não sei explicar o quê, mas a verdade é que nunca me senti só.

Não quero com isto tratar com desdém, a moda das peregrinações até Fátima, que se tornou tão popular entre nós, com a rapaziada toda a aderir. Nada disso! É um convívio saudável, tem a benesse da nossa estrutura clerical, e enquanto estão ali, as pessoas não andam afastadas umas das ouras, ou em más vidas. (Dizem que) Dançam, cantam, batem palmas, são felizes, e ao serem assim, louvam Cristo, nosso irmão, que espalhou a mensagem do pai.


O mistério de Fátima, para mim, é o mistério da vida. Tal e qual. Ou se pensa que somos assim, apenas porque sim, apenas porque um espermatozoide mais cabeçudo, tanta marrada deu naquele óvulo tão fofinho, que as estava mesmo a pedir, que cresceu até ser gente; ou se acredita que isto é um quadro muito mais amplo, muito maior, e nesta praia da vida, onde somos apenas um grão de areia; há muitas variáveis que nós não vemos/dominamos.


Mas há duas Fátimas, que são dissociáveis, A interior, de que falo aqui, a que é a minha, também; e a outra, que é a que se afasta da essência da fé, e por conseguinte, de mim. Essa Fátima onde se queimam velas e dinheiro, onde as pessoas se sacrificam e sofrem, autoinfligindo-se penas duras, de joelhos; a fim de terem aquilo que não pode ser obtido assim, por troca direta; afasta-me.


Essa fé, a que é levada ao osso, a que fica em carne viva, é a que me faz pensar no mandamento  “Não farás para ti Ídolo de escultura, nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem embaixo na terra, nem nas águas debaixo da terra”. Porque não vale a pena. Não é por aí.


Ter fé não é fácil. Tem que se ser inteligente. Precisamente o inverso daquilo que pensam, os que pensam que são inteligentes. Há que haver observação, constatação, recolhimento, muito pensar, humildade, boa fé, comunhão. Nunca mais se está só. Deixa de se dançar sem rede no circo da vida. Passa-se a compreender e sobretudo, aceitar.



Cheios de fé estiveram os que hoje encheram o largo do Terreiro de Marvão, com todas as imagens, engalanadas por populares devotos, para brilharem neste efeito; e depois a romaria em procissão, até à igreja mãe, de Nossa Senhora da Estrela.


A fotogenia da minha mais pequena assombra-me. Vira a carinha de propósito.
Olha o Tiago... tão bom! ;)





Ali, numa cerimónia plena de simbolismo e ilusão, as crianças da catequese do concelho, enviaram para os céus, terços de balões, com cruzes onde escreveram os seus desejos para o mundo.


Bonito!

Atenção Alice que: "peÇo", não se escreve "pesso"

-TÁ BEM! Pai, eu sei!

Vai no volta, escreveu TOLDOS, em vez de Todos.

Já deve de estar a pensar na praia.

Será que Deus não descobre que estar artista era a filha do catequista?




- É para chegar a Deus, Alice… Estas cruzes têm inscritos os vossos desejos para chegarem aos céus…

- Aonde?!?!?

- A Deus…”

-(Fazendo uma grande careta) –XXXXXXXXXXXxxxxxxiiiiiii… é tão longe…



  
Hoje, quando se lançaram os balões e ficaram presos, nos fios frente à Santa Casa, disse-me: “Eu não te disse que não chegavam lá?!?!?”



Enfim, foram...


Seguiu-se a celebração eucarística ministrada pelo senhor bispo e… que homem. Que calma, que clareza, que clarividência, que simplicidade e que riqueza. Como explicou os evangelhos, como traduziu e tornou tão inteligível, aqueles textos ancestrais.



Foi mágico.


Para terminar, com a melhor chave de ouro, um concerto com o grupo Vox Angelis, alusivo a este mesmo assunto, dos avistamentos perto de Ourém, há 100 anos atrás. Pedro Miguel Nunes, o barítono diretor do coletivo Vox Angelis (2 vozes, 2 violinos, uma guitarra clássica e um violoncelo) apresentou um reportório riquíssimo, que se estendeu por cerca de hora e meia; onde interpretou excertos de obras clássicas, e diversos cânticos sacros.





Em silêncio, por vezes,  de olhos fechados, interiorizei, senti, e… envergonhei-me com o enorme ruído das conversas que ecoavam na nave central.  A coisa chegou ao ponte de, o próprio artista, ter pedido silêncio aos presentes, o que é absolutamente inenarrável.
COMÉQUÉIMPOSSÍVEL?!?!?!? Perguntava-me eu.

É que para além de brutos(as) e estúpidos(as), os(as) fazedores de barulho, foram completamente insensíveis. Por acaso não perceberam que ali estava a ocorrer uma manifestação de arte?!?!? Aquilo, para além de ter custado dinheiro (fosse a quem fosse), exigia esforço, concentração, dedicação, entrega, por parte dos artistas.

Sinceramente…

Certamente, nenhum dos prevaricadores será meu leitor, mas se for, tem o  correio institucional na barra de lado, para poder teclar-me, e dizer de sua justiça. Mas, se me permite, creio que não a tem.


Uma frase não parava de me martelar a cabeça: isto é pérolas a porcos. Salvo seja.



  
Ah! E outra nota: não fui criado em meios eruditos. Os meus pais sempre pertenceram à classe média… média. Nunca fui um cliente habitual da ópera com eles a levarem-me pela mão, mas já aprendi, na vida; que nestas manifestações culturais de nível mais erudito, não se bate palmas no final de cada trecho. Aquilo não é um baile pimba!
Bate-se no final, de tudo… tudo, ou… quando eles se meterem a jeito. A gente vê logo.


De resto, em jeito de balanço, foi uma tarde/princípio de noite muito bem passado. Adorei tudo e muito obrigado à Filipa Bicho, mãe do meu catequizando Tiago, que foi tomando conta dele, e da indomável fera Alice , enquanto eu fui ajudar no andor.


Se tudo correr como espero (e se assim não for, garanto-vos que estarei certamente contrariado), daqui a 100 anos cá estaremos, outra vez, para a comemoração dos 200 anos de Fátima!

Até lá!

Sem comentários: