Conheci o Francisco Segurado Silva de forma que já nem me recordo bem. Sei que foi há uns anos atrás, creio que quando se apaixonou por Marvão, e decidiu comprar uma casa por aqui, mas o grande trambolhão se passou na minha vida, sobre o qual se passaram 9 anos, no último dia do mês passado, fez com que essa memória dos últimos anos, tenha algumas pontas soltas, como esta, que não consigo bem encaixar.
Do que sim me recordo muito bem é da tremenda boa impressão que o seu espírito curioso e inquieto criou em mim. O Francisco é uma daquelas almas que parecem sempre que estão com um olho no burro e o outro no cigano, não por estar sempre à defesa, antes pelo contrário, mas porque cogita sempre a uma velocidade que nos deixa surpreendidos.
Não tendo cá família, apaixonou-se pela nossa terra e decidiu comprar uma casa para vir descansar para junto de nós. Sou capaz de ter trocado impressões com ele nas finanças, onde trabalho, aquando da transação, e fomo-nos sempre mantendo alinhados, até mais pelas redes sociais.
Segundo
me contou, o Francisco trabalha em artes gráficas, digitais e segundo creio
também já esteve ligado à publicidade. Quando se deu esta história da pandemia
dos nossos tempos modernos, o coronavírus/covid 19, como lhe chama o senhor
Bruno Aleixo, e ficou tudo fechado em casa, a “tripar” da cabeça na maré de
confinamento, o bom do Chico lembrou-se de criar uma revista, a Mordaz.
https://mordaz.pt/edicoes-da-mordaz/
Esta
revista, que tem uma apresentação deliciosa e absolutamente profissional, é
criada com parcos recursos, numa base de colaborações, e tem um carater amador-
profissional, se é que me consigo fazer entender.
Nomes
conhecidos das letras e do mainstream, que colaboram numa base de amizade e
entendimento com o cérebro criador do projeto, ajudam a dar corpo ao sonho.
Neste contexto, foi com alguma surpresa que ouvi o seu desafio para juntar à
turma, e me lançara um tema específico: o trabalho, sobre o qual poderia me poderia
esticar, claro que embora estando bem consciente do universo onde este produto
estaria disponível.
A
Mordaz, “uma revista totalmente independente, a sua produção não custou um
cêntimo”, como vem bem explícito no cabeçalho, tem disponíveis as edições:
Nº
1 – Março 2020 - Covid ou Golias, o combate de uma geração
Nº
2 – 10 de Abril - Pacotes de auxílio (Amor e Verdade)
Nº
3 - 25 Abril - Temática Salgueiro Maia - 25 de Abril - Revolução
Nº
4 - a primeira revista de Maio a sair em Julho – Trabalho, que na sua página
32, tem esta prosa da lavra do vosso escriba:
O Meu Lugar Sempre Foi Este
Nesta sociedade em
que vivemos, ter um trabalho é uma necessidade que se assume vital, por dois
motivos essenciais: o ser capaz de tornar-nos uma peça funcional na engrenagem,
logo, válida; e também porque legitima a nossa existência, garantindo-nos os
recursos fundamentais para conseguirmos dar resposta à logística de cada um. O
nosso, pode não ser aquele com que sonhámos um dia, mas cabe-nos a nós,
conseguir dar-lhe o melhor sentido, justificando-o, para que o possamos aceitar
da melhor forma possível.
Escreve-vos um
licenciado em Comunicação Social no I.S.C.S.P., muito bem segundo classificado
no final do curso entre os seus pares que, por força maior das contrariedades
da vida, nunca teve possibilidades de tentar carreira numa capital onde
fervilhavam as oportunidades naturais do boom das televisões privadas, e tentou
encontrar o seu caminho regressando ao Alentejo natal. Hoje, apesar de tudo,
sou um feliz funcionário da Autoridade Tributária e Aduaneira na capital do meu
concelho, Marvão, situada a 6 quilómetros da terra de onde sou natural. Aqui,
encontrei o meu lugar, que afinal, sempre foi este. Sim, eu sou tão português
que acredito que o destino está traçado à nascença.
Numa região sem
oportunidades já naquela altura, quando regressei, no início do milénio,
concorri ao maior concurso da função pública em Portugal até essa data, que
reuniu cerca de 80.0000 candidatos para guarnecerem pouco mais de dois milhares
de vagas, de uma Direção Geral das Contribuições e Impostos desfalcada pelas
aposentações, e natural desgaste de quadros. Pediam uma prova de cultura geral,
com português, história, lógica e conhecimentos diversos. Depois da seleção
neste pré-acesso, quando pensava já estar dentro, tive de me esfalfar nas
exigentes provas específicas, sobre cada imposto, com muito custo e dedicação.
Só assim consegui ficar no meu concelho, que sempre foi o meu grande objetivo,
onde atingi o generalato, não existindo hoje, cargo ou promoção que dali já
seja capaz de me mover.
A paixão pela
escrita, muito mais que um hobby, antes um escape, uma forma de viver, quase
tão importante como respirar; manifesta-se no blogue que criei há 13 anos
atrás, “Vendo o mundo de binóculos do alto de Marvão”, que conta com mais de
meio milhão de visualizações, e onde, ajudado pelo mural do facebook, onde
divulgo os textos e pensamentos, respiro o dia a dia e o imediato. Os dois,
acabam por me preencher enquanto homem, ser pensante, humano completo.
Quem entra naquele
serviço local, encontrará um funcionário que procura sempre a competência e
eficiência, máximas que sempre tive como orientadoras na vida, mas quem não me
conheça destas lides literárias (1.406 publicações até há data, só neste
espaço) desconhecerá que tem pela frente não um mangas de alpaca submisso
qualquer, que idolatra e se esgota nas atualizações dos códigozinhos, decorados
com recortes feitos a régua e esquadro; mas o alter ego convencional do Tio
Sabi (alcunha de sabichão com que os colegas o batizaram no ciclo preparatório,
como bulllying pela sua esperteza e fome de saber), um agitador de província
que se realiza quando consegue chegar aos outros, e recebe um comentário de
quem não sonhava sequer que o lesse.
Coisas da vida: se
quando andei a caminho de Lisboa, de automotora, para aprender a ser jornalista
profissional, me tivessem dito que o meu estrelato acabaria por ficar a
escassos quilómetros da minha casa de sempre, para trabalhar nas finanças da
minha sede de concelho… o mais certo teria sido ter-me atirado sem pestanejar,
para debaixo do 15, que cruzava a rua junqueira sob carris, e me deixava no
Palácio Burney, a caminho de Belém.
A vida poderia ser
sempre outra se… mas os ses, quando não se concretizam, e não se “arrumam” numa
estante racional da nossa vida, ficam sempre por aí a pairar, e nada mais fazem
que deixar num suspense inóspito, assombrar, incomodar.
Mas eu sei que
estas deambulações literárias só são possíveis, geralmente quando já tudo
dorme, em casa, porque, lá está, existe um trabalho por detrás que as suporta,
e permite estes devaneios. Um homem quando não trabalha… e está dependente de
subsídios, subvenções familiares, heranças, apoios diversos… acaba por sucumbir
perante a sua inoperância.
A
edição atual, Nº 5 – Culpa e Castigo, está disponível aqui: https://mordaz.pt/wp-content/uploads/2020/08/005_MORDAZ_DUPLAS.pdf
Olhem,
espreitem, leiam e caso queiram, apesar das muitíssimas propostas gratuitas para ocupar o
tempo nos dias que correm, sigam.
Abraço
a todos!
Abrir a Mordaz nº 4, clicando aqui.
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