Há dias, ligou-me um sujeito aqui para casa que queria falar com o Sr. Pedro Sobreiro.
- É o próprio. Diga fachavor.
- Sr. Pedro Sobreiro, estou a ligar-lhe para lhe dar uma boa notícia…
(Como a coisa me cheirou a esturro, apressei-me a esclarecê-lo…)
- Olhe… se é para vender alguma coisa, digo-lhe já que não vale a pena perder o seu tempo. Eu tenho mais que fazer e o senhor certamente não vai querer estar a falar em vão, pelo que podemos fazer um favor um ao outro.
- Não, não! Nada disso. Estou só a ligar para lhe dizer que o seu crédito foi aprovado.
- O crédito foi aprovado? Mas… que crédito, homem?!?! Se eu não pedi crédito nenhum…
- Eu sei, Sr. Pedro Sobreiro. Trata-se de um crédito pré-aprovado no valor de 4.000 euros, a não-sei-quantos-meses com uma taxa xpto…
(Isto num banco com o qual nem sequer tenho grande relação/montante em depósito)
- Ah… assim sem mais nem menos? Pois… mas eu não quero esse dinheiro.
- Compreendo, Sr. Pedro Sobreiro. Mas não tem desejos, aquisições que queira concretizar já?
- Então não tenho?! Se eu tenho… Mas não assim. Não se pode ter tudo, sabe…
- E pode dizer-me o motivo específico pelo qual não vai aceitar a nossa proposta?
- Não.
- E porque não, Sr. Pedro Sobreiro?
- Que não porque não. Eu não lhe tenho que dizer tudo, pois tenho?
- Claro que não, Sr. Pedro Sobreiro. Queira então desculpar o incómodo e tenha uma boa tarde, Sr. Pedro Sobreiro.
- Olhe, já agora… boa tarde para si também.
(E fiquei a pensar naquilo…).
Percebe-se, pois então, porque é que das mais de 17 mil famílias sobreendividadas que pediram ajuda à Deco, só 16% estavam em condições de serem apoiadas. As outras estavam irremediavelmente arruinadas. Para além dos créditos óbvios para quem não tem pais ricos (casa/carro), muitas delas chegavam a ter mais 5 créditos pessoais destinados a suprir desejos supérfluos (viagens, electrodomésticos, roupas, gadgets electrónicos, enfim…).
A crise, o desemprego, a instabilidade surpreendeu-os ao virar da esquina e deixou-os com a corda da garganta.
E o que me custa é que estes “pilantras” da banca que são co-responsáveis pelo agigantar de egos que tantos levaram à desgraça pela via do crédito fácil, continuam a operar impunes no mercado sem serem chamados à responsabilidade.
É a actividade deles, dirão alguns (já os ouço…) em jeito de advogados do diabo.
Será certamente, respondo eu, mas há muita maneira de matar tordos. Que “vendam dinheiro” e ganhem com isso eu até acho bem. Já não concordo nada é com esta política de “ir a todas e sugar até ao tutano”.
Nos tempos que correm, isto é quase como mandar um pacotinho de coca pelo correio a um junkie em reabilitação. Ou oferecer uma garrafa de uísque no Natal a um alcoólico anónimo. Isto é quase extorsão. É esmifrar.
E eu acho que o Estado, o Estado que existe e faz sentido por nossa causa e é suportado por todos nós não deveria deixar os cidadãos assim expostos à rapina destes abutres. Devia injectar bom senso no mecanismo. Devia instigar a prudência e não permitir que este tipo de aliciamentos acontecesse, sobretudo em tempos assim…
Seria bom que assim fosse.
Entretanto e enquanto for permitido, eu imagino quantos não cairão todos os dias… quanto mais não seja, tentados a aceitar este dinheiro (que pagarão a peso de ouro) para tentarem com ele colmatar brechas noutras partes do navio. Mal saberão eles que… jamais o conseguirão assim levar a bom porto e o mais certo é irem ao fundo… a pique.
1 comentário:
Também me parece que este tipo de aliciamento é perigoso e devia ser proibido. Mas já diziam os antigos, e bem, que quem não tem dinheiro, não tem vícios, ou, ninguém dá nada a ninguém.
Hoje vive-se muito o TER, consumir, comprar tudo e mais alguma coisa mesmo que não faça falta nenhuma, vive-se muitas vezes de aparências. Não quero ser a advogada destas empresas que vendem dinheiro, mas não consigo culpá-los de tudo. Se os destinatários destes telefonemas fossem pessoas incapazes ou crianças aí era diferente.
Um abraço
Enviar um comentário