A
minha Alice é uma criança especial. Acredito que todos os pais dirão o mesmo
dos seus, e isso é mais do que legítimo. Quando digo que a sinto diferente, não
é que a queira comparar com nenhuma outra, ou valorizá-la mais do que aquilo
que ela vale. Só digo que é um orgulho enorme poder ser seu pai, acompanhar o
seu crescimento embora… ela não goste muito que seja ajudada, tratada como a…
pequena.
É
bem diferente da minha Leonor mas… os tempos são outros, os gadgets que tem à
mão para puxar pelas suas habilidades são mais avançados, os aparelhos que tem
a jeito para explorar as suas potencialidades são bem diferentes e… tem uma
irmã mais velha para seguir, admirar, imitar em comportamentos (por vezes,
tantas vezes, maus! Adorava tudo o que a outra abominava, incluindo discos de
sopa de tomate e agora já não come lá assim muito bem os verdes). Também… os
pais que conheceu quando aterrou na terra já estavam nos trinta e muitos… e
agora já têm longos, largos e mais que ultrapassados quarentas. Outros tempos…
Vê-la,
comigo sempre em silêncio, a observá-la pelo canto do olho, a descarregar no
tablet (que a irmã nunca sonhou que pudesse existir quando tinha a sua idade; e
se a mim me tivessem dito que seria de verdade, no meu tempo, quando terminei o
curso de jornalista há 21 anos atrás… rir-me-ia, incrédulo), e vê-la fazer um
puzzle com centenas de peças, na íntegra, com a pontinha dos dedos, enquanto o
tal dito cujo esfrega um olho é… todo um feito. De glória.
Privo
pouco com ela. Não é que não tente e tento sempre tanto mas, há ali uma
personalidade madura demais para a idade (acho eu que com aqueles 6 anos…
estava a muitos anos-luz atrás), e tem um espírito inconformado, perguntador,
sempre desalinhado, rebelde e… sim. Aqui acho que aí, tem a quem sair.
Na
catequese, consigo chegar a ela. Sou o professor que lhe ensina Cristo. Na
primeira sessão que tivemos, falámos em encontrar nessa comunidade que acredita
e segue Jesus, nas pessoas que vão à igreja com regularidade, uma outra e nova
família.
Na
segunda aula, já mais enturmados uns com os outros, falámos no valor de um amigo,
no importância desse irmão que não é de sangue, mas que nós escolhemos!, pode
ter em nós, e nós nele. Aproveitei, claro está, para levar a brasa à minha
sardinha.
Esclareci
logo que Deus nos ama, acima de tudo, e sempre, sempre nos perdoa (como o nosso
papa Francisco, homem bom, não se cansa de dizer. Nós é que nos esquecemos de
lhe pedir perdão). Não existe tal coisa como o Deus castigador, o Deus que é mau
para quem é menos bom, mas é um Deus que fica triste quando nos portamos mal.
Porque nenhum amigo e nenhum pai gosta quando um filho não é obediente. Meti os
outros dois colegas pequeninos, dissimuladamente, a jogarem do meu lado, como
juízes. Isto mais porque o caso da minha é aquele que verdadeiramente conheço.
Amigos,
vejamos, disse-lhes eu: os pais da Alice trabalham para lhe comprar comidinha,
roupa, para ela ter livros, esferográficas, lápis de cor e cadernos. Dão-lhe um
teto para dormir, mantinhas para ela estar quentinha e roupa linda para vestir
(muita que já foi herdada da mana e da prima Maria mas isso não interessava ali
para nada). Mas ela por vezes faz birra, chora e grita muito porque:
não quer acordar,
não quer dar e que lhe queiram dar beijinhos,
não quer tomar banho,
não quer vestir a roupinha que a mãe lhe escolheu,
não quer comer nada ao pequeno almoço,
não quer que o pai lhe tire as fotografias que ele tanto gosta, e ela vai gostar quando for mais velha, como a mana gosta das dela.
não quer acordar,
não quer dar e que lhe queiram dar beijinhos,
não quer tomar banho,
não quer vestir a roupinha que a mãe lhe escolheu,
não quer comer nada ao pequeno almoço,
não quer que o pai lhe tire as fotografias que ele tanto gosta, e ela vai gostar quando for mais velha, como a mana gosta das dela.
Isto para falar só nas (guerras) matinais. Mas à noite, e durante o dia, vai havendo mais. Ó se vai…
Como
enxotar-me da casa dos avós João Manuel e Jacinta porque os quer só para ela, e
não me quer lá a mim. Acham que ela a proceder assim está a ser nossa amiga?,
pergunto-lhes Acham que ela está a fazer com que mereça prendinhas no Natal e
coisinhas boas? Acham que Jesus fica feliz?
Claro
que não! É o que eu sempre lhe ensino a ela. É muito difícil sermos como Jesus,
que dava sempre a outra face da cara quando lhe batiam numa. Nós, gente de
carne e osso, temos muita dificuldade em sermos bons para quem não é bom para
nós.
Temos
de ser amigos dos nossos amigos. Conseguem? Pode ser? Vamos tentar?
Então
para a semana, quando tivermos a nossa lição e fizermos a análise conjunta
inicial de como foram estes últimos 7 dias, vamos começar por falar um
bocadinho nisto, está bem? A ver quem é que conseguiu ser amigos dos amigos e
não se portar mal. A ver se conseguimos pelo menos uma melhoria para
apresentarmos aqui. Vamos a ver quantas birras consegue a Alice evitar.
Nessa
segunda sessão, falamos também na figura de Deus, que não é um velhinho de
longas barbas como muita gente o viu, mas que para mim é uma força, uma luz que
manda em tudo e tudo governa. Na falta de uma figura associada, o mais próximo
que temos dele foi o seu filho, nosso irmão, Jesus Cristo. Expliquei-lhes que,
tendo nascido no Médio Oriente, na Galileia, seria um homem parecido com os que
nascem por aquelas terras. Não teria muito a ver fisicamente com os nórdicos,
altos e louros, mas que deveria ser baixo, com uma pele escura, com barba e
cabelos grandes como era a moda naquele tempo.
Como o sobrenatural Miguel Ângelo pintou na capela sistina, a mão de quem tudo criou, (como ele o imaginou) no momento em que dá vida a Adão |
Mostrei
imagens e chegada a casa, dona Alice sentou-se na escrevaninha, para fazer o
seu retrato de Jesus. Não porque lho tivesse pedido. Foi porque quis.
Adoro tudo. Mas sobretudo, o pormenor da barba e... a pequena indecisão... no nome |
Mas
fez mais. Aproveitou para no seu português, nas letras que aprende na escola e sobretudo
(que na escola ainda não deve ter aprendido tanta letra) nas suas leituras que
faz com a mãe, na cama, à noite, da tanta vontade que tem de aprender a
decifrar este mundo dos grandes; fazer este escrito à mana.
VAI PÓ MUCOATO
GOTÁVACTOFOSS
PÓ MUCATO
Tradução: Vai para o meu quarto
Gostava que tu fosses
Para o meu quarto
Com a melhor amiga Laura, num dia tão feliz que passaram juntas |
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