domingo, 23 de julho de 2017

Isto é para mostrar o quanto eu gosto de vós (para que possam ver o vosso passado)

Saídos da piscina para este almoço... em cima da hora... fez-me ir a casa, para (ela) se pintar, meter rímmel e baton...
Estava capaz de perguntar em alta voz: QUE FIZ EU PARA MERECER ISTO?!?!?!?
Mas não o faço. Desconfio...


A minha filha Alice... é demais. Todos os pais devem pensar isto dos seus próprios filhos. O que, para além de ser legítimo, é mais do que justificado. Às vezes, tantas vezes, não parece que tem só 7 anos. 

Escrevo isto aqui, para que fique registado. Para que daqui a muitos, muitos anos, ela possa recordar. Como eu gostaria hoje, que os meus pais o tivessem feito, quando tinha a sua idade. 

A minha mãe Alzira, para além de toda a vida ter tido centenas de livros (eram muitas dezenas, naquelas prateleiras, não eram? Certamente seriam mais de muitos 100), sempre escreveu muito bem. Recordo bem alguns textos que escreveu sobre mim. Como daquela vez, em que me portei mal (acho que lhe mandei pelas escadas abaixo, o rádio que tinha comprado com o 1º ordenado), me deu uma nalgada e depois ficou a olhar para mim, a ver—me chorar, de mão no rosto, com pena de ter sido tão austera comigo. Escreveu como lhe perguntei depois, soluçando: Ó Zira (como eu a tratava): Doem—te os dentes?!?! 

Esse texto perdeu—se (ela se calhar ainda o tem. Guarda tudo...), e aqui, ficaria para sempre na net. Outros tempos...

A Leonor, está a dormir na casa dos avós, com amigas, e encontrei este escrito, da Alice para a mana, em cima da secretária do quarto desta.




Por elas, quanto mais não fosse, sou feliz.

Ficaram as duas, no quadro de honra da sua escola. Cumpriram. Com distinção. Agora estão de férias. 





Sou babado, orgulhoso, não sou de me vangloriar mas... desculpem. Tem de ser.

Leonor  Alice 








domingo, 16 de julho de 2017

Adeus, meu Zé Maria! Adeus, meu amor!

Até que nos encontremos por aí...


Sabia que tinha fotos nossas. Nos meu discos rígidos, só teria de as procurar. Estas foram tiradas no dia tão feliz de 27 de Junho de 2004 (há 13 anos atrás, com eu, bem cheínho; tu, igual, como eu sempre te conheci) quando a nossa Junta inaugurou a bandeira e o símbolo. Tenho certamente muitas centenas delas contigo, onde tu estás. Mas agora... está tudo ainda muito a fresco, e não as consigp procurar. O tempo... só o tempo...


Este texto… é daqueles que tinha mesmo de escrever. Tem andado a viver comigo, há mais de 15 dias, de férias, no mar, a correr, assim que acordo. Tem andado a ser desenhado na minha cabeça. Como se tivesse nela, uma folha em branco, que começava a ser rabiscada, onde iam sendo colocadas notas, de por onde deveria seguir.

E perguntam-me, muitas vezes, muitas pessoas diferentes: (e eu vou classificando as opiniões, de acordo com o crédito que elas me merecem, umas muito, outras menos) mas porquê é que escreveste aquilo? Tinhas mesmo de o fazer? Mas quem é que te paga para dizeres sempre as verdades? Teria vindo mal algum ao mundo, se não tivesses escrito aquilo? Porquê?!?!?

E eu penso, ou respondo, mesmo: Eu sei lá! Aquilo tinha de sair de mim. Quando eu escrevo, faço a minha justiça. Resolvo-me. Oiço-me. Poupo dinheiro em psiquiatras.

E depois… é apenas um blogue. O Sousa Tavares, que adoro e muito considero, abomina os blogs e os bloggers. Diz que é um mundo de calúnias, de invejas, de gente mal formada, indecente e covarde. Eu concordo quase sempre com aquilo que ele defende, mas neste caso, quero que ele tenha mas é, um filho pela barriga das pernas. Eu sou livre e… é apenas um blogue. Por Deus! É apenas um blogue. Por exemplo, em relação ao meu último texto que aqui publiquei, tive as mais diversas reações, de gente que muito considero, e senti-me… bem. Sinto que é feita justiça à arte, que fui para Lisboa aprender a aperfeiçoar, durante 4 anos seguidos. E ademais, se o visado tivesse um blogue e tivesse tido o arrojo de escrever um texto sobre mim, assim, às claras, sem nada nas mangas… provavelmente nem o ia lá ler. Eu quero lá saber disso! Daquilo que ele pensa sobre mim!  Apenas estimo e considero, ouço, e prezo, quem quero. A minha liberdade dá para isso. Quanto mais não seja.

Hoje traz-me aqui a perda de um amigo. Que dói. Porque inesperada. Porque fortuita. Porque nos prova, mais uma vez, de forma dura, quão efémero é tudo isto. A vida… é um período de férias que a morte nos dá. Cada vez mais me convenço disso. Passamos tão pouco tempo cá, aqui, por muito que cá passemos, que não vale a pena, a maior parte das coisas que deixamos que nos aconteçam. Animosidades, invejas, discussões, pretensões, usura, vaidade… nada disso. Vimos nús, sem nada; e assim nos marchamos. Seja o Américo Amorim, que tinha conseguido amealhar na vida, os 4 mil milhões, que fazem falta ao país para sair do buraco; ou o mais pelintra dos pelintras… sai tudo pelo buraco dos fundos.

Sempre que pensava neste texto, e na homenagem que quero fazer a este homem, a este querido Amigo, pensava nesta música:

Para ir ouvindo, enquanto se lê...

Porque é assim que me sinto, cá dentro. Algo me morre na alma, quando um amigo parte para sempre.

Vou ficando velho, sabem? Isto pode soar ridículo, a quem apenas tem 44 anos, mas… já são 44!
São 4 décadas, mais 4 anos. Não sou propriamente um puto. E de cada vez que desaparece um dos pilares que me habituei a ver desde sempre, vai-me dando a sensação que o meu tempo se está a desintegrar. Não sei se me consigo explicar mas, a ideia é de que, quando se nasce para o mundo, há uma série de referências, na família, na terra, no país, no mundo, na música, nos filmes, no showbizz em geral, e… há medida que eles se vão esfumando, outras vão surgindo, mas… o nosso tempo já não é delas. É dos putos.

Por mais que se ame um neto, ou uma neta; este amor temporal nunca será o mesmo para um pai, ou um filho. Acho que é isto que quero dizer. Há cadência, mas a intensidade… nunca será a mesma, para um e para outro.

Recebi a notícia da forma mais abrupta. Ia dançar à vila de Castelo de Vide, com a marcha dos Outeiros, a convite do Sr. Presidente António Pita, e descemos junto o Cine Teatro, onde nos íamos vestir. Dispararam-me um “sabes quem é que morreu?”, o que me deixa sempre em suspenso, a ler a expressão de dor, espanto e mágoa, de quem ma dá.

Em suspenso.

- “O Zé Maria!”

Mas qual? Fui pensando. Conheço tantos…

- Estava lá a carrinha da VMER na Beirã, à porta dele, e já não havia nada a fazer…

Zé Maria… Beirã… foi o da Graça!  
- Como?!?!?!?!?!?
- Foi uma coisa que lhe deu. Não sei se coração, cabeça… estava na horta e… caiu redondo.

- Caraças! Precisei de respirar e desviei-me.

Porra… Nem velho, nem doente, nem… nada!
O Zé… Sessentas largos, setentas?

Conhecia o Zé desde sempre. Era guarda fiscal na minha terra, na Beirã. Tinha 3 filhas, todas mais velhas que eu, minhas amigas, e uma esposa que é um amor. Daquelas mulheres autênticas, verdadeiras, trabalhadoras, da terra. Aliás, todas elas são!

O Zé Maria tinha idade para ser mais que meu pai, e tinha sido bem amigo dele. Quase que dava para ter sido meu avô. Mas gostava tanto de mim… e eu dele!

A tratar de mim... A pentar-me e a arranjar-me os óculos nesse dia de festa.




Quando nos encontrávamos…

- Ehhhhhhh… o meu Zé Maria! Anda cá meu amor. Quando vejo o Zé Maria, é como ça visse o Deus do céu!
(ele agarrava-se a mim, deixava-se rir, e dizia: ai este cabrão deste gaiato…)
Davamos sempre um beijinho. Era como a gente se cumprimentava.

Quando eu era miúdo, ele era o Sr. Graça, como havia o Sr. Gonçalves, o Sr. Felino, o Sr. Leandro, o Sr. Curinha, o Sr. Sabino, o Sr. Cardoso… E eu era o amigo dos filhos e filhas. Eram senhores. Senhores, e nós, só os tratávamos assim.

Depois andei a estudar por Lisboa. Quando regressei, ao fim de 4 anos, entrei para as finanças, em 2000, para Nisa. Aí foi quando passámos a privar mais os dois, como companheiros. Eu usava muito a estrada da Póvoa, sobretudo à sexta-feira, quando entrávamos no fim-de-semana, e encontrava-o no Nicau, onde parava quase sempre para dar as boas vindas ao período de descanso. Ali molhava o bico, ali tirava um petisco, ali dava dois dedos de conversa a quem estava por lá. E aí entranhei o Zé Maria.

O Zé Maria era um homem genuinamente bom. Era bom. Naturalmente bom. Nunca o vi zangado com ninguém. Estava-se bem ao pé dele. Por isso é que eu nunca o largava. Na Casa Nicau, fomos seguramente, dos melhores clientes de camarão frito da Dona Teresa, aos sábados à tarde. Eu e o Zé, sempre tivemos esta capacidade de atrair amigos e assim, conseguimos ir juntando um grupo, onde contavam os indefetíveis Manuel Coelho e Careca, por exemplo, e outros que por lá iam passando.

Com o Xico da Blusa... entre os amigos, num dia de festa, como gostava de estar

Quando me via:

- Pedro, como é? Hoje há meio quilinho delas? (gambas fritas)
- Ó meu Zé Maria, é claro que sim!


E foram muitos, muitos, muitos meios quilinhos delas, sempre muito bem regados, com umas fresquinhas à maneira, que a gente até vinha de lá regalado.

O Zé era um esmerado cozinheiro, e adorava fazer petiscos na garagem, onde tive o prazer de comer alguns. Aperfeiçoou a arte nos tempos do posto da Guarda Fiscal, quando lá se cozinhava, e, segundo dizem as más-línguas, se consumia algum vinho, ao ponto de terem existido queixas de casas comerciais da terra, desta concorrência… desleal?  

O Zé era muito novo. Não era velho, nem nada que se pareça, não sofria de males, e parecia que ainda teria muito para viver. Quem diria...
Sofreu muito com a doença do irmão, de Marvão, que teria abatido muito e perdido muitos quilos. Foi-se a ver… foi ele, mais novo.
Isto a vida…

Se havia coisa que o Zé adorava, para além de gostar dos amigos, de um petisco e de um copinho com eles, era da família. O Zé adorava as filhas, a mulher, os genros, e do neto Ricardo. Não sei se tinha mais netos mas deste, como estava tão próximo e foi o primeiro... Falava deles com um gosto, uma veneração, que dava prazer. Percebia-se que eram a melhor coisa no mundo, para ele.

Não resisto a contar-vos uma história, que conta muito sobre mim e, sobre o Zé. Quando eu trabalhava em Nisa, andei a juntar dinheiro para comprar uma televisão. Mas não era uma televisão qualquer, atenção! Era para comprar uma televisãzorra! Que eu já era casado desde 97, já vivia numa casinha própria com a minha Cris, na Rua do Espírito Sano, nº 8; já ganhava o meu dinheirinho, e já merecia uma televisão, que não fosse aquela caguincha pequenina que lá tinha. Fui-me direitinho ao Electro Narciso e comprei um aparelho Sanyo, que me custou 230 contos! Caraças! Era um maquinão! 80 centímetros de ecrã plano, P.I.P. (picture in picture, que dava para ver 2 ecrãs diferentes ao mesmo tempo), P.O.P. (picture outside picture), capaz de durar o resto da vida. Ou quase… que a gaja só berrou há 2 anos atrás quando comprei esta que tenho agora.

Convidei o meu amigo Zé Maria para ir lá a casa, para ver o que eu tinha comprado. Sentámo-nos os dois no sofá a ver e… não foi notícias, não foi tourada , e muito menos futebol. Foi… filmes de homens, que me tinham emprestado! Ou melhor, para homens verem, se é que me faço entender. Ou seja, com gaijas… pouco vestidas. Aquilo são películas sem história, sem enredo, com muita ação, que quanto mais tiver, melhor! Meti aquilo a bombar, com a música ambiente bem altinha, postigos fechados, e eu a ver o Zé Maria regalado. Nem dizia nada…
Até que lhe perguntei: atão Zé, o que achas da televisão? Tem uma boa imagem?

- Porra, se tem! Os cabelos (de baixo) das gajas parecem troncos!
EHEHEHEHEHEHEHEHEHEH… tanto que a gente se riu… Parece que o estou a ver…

O meu Zé Maria… Tenho tanta pena que ele tenha abalado, e já nunca mais no possamos ver, nem malhar meio quilinho delas, como agora, na festa da Beirã, que é hoje o dia!

Estive no teu funeral, assisti à missa na casa mortuária. Senti, com pesar, o teu fim. Lamentei o som das tantas conversas lá fora. Não quiseram deixar de estar. Compreendo. Mas foram falando de outras coisas, triviais, da vida, do quotidiano. Lamento tanto que seja assim. Mas o meu, não será diferente. Eu estou de luto, cá dentro, por ti, amigo. Não sou da tua família, mas de cada vez que vir os teus, ou te vir a ti (nas tuas coisas), ou falar de ti, lamentarei a falta, com muita saudade.


Foste na frente, companheiro. As leis da vida assim o ditaram. Até que nos vejamos por aí, outra vez. Que a tua alma fique em paz…