segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Pé ante pé



Com esta idade ando a aprender a andar. Mesmo! Não se extasiem, não gozem com o gajo, levem mesmo a coisa a sério porque é de levar. Com quase quarenta anos… não esperava por uma destas! Ainda hoje de manhã, na fisioterapia no hospital de Portalegre, ia ouvindo e aprendendo a forma correcta de colocar os pés com a minha técnica e ela chamava-me a atenção para pormenores que passam despercebidos ao mais comum dos mortais na sua caminhada mas que para mim são agora estratégicos na recolocação do equilíbrio no meu corpo. Ter o cuidado de não esticar as pernas não iludindo assim a recolocação do tronco, ter a noção da transferência do peso do calcanhar para os dedos da frente, enfim… coisas que parecem pequeninas (e inatas…) aos demais mas que para mim são fundamentais porque é com o somatório de todas elas que eu volto a ganhar a minha autonomia, a minha independência, é com todas elas que eu volto a ser eu. A falta de equilíbrio é o que mais me custa agora. Braço que não dobra? Eu quero lá saber do braço que não dobra embora seja o primeiro a reconhecer que ter um braço assim não ajuda em nada. Não ajuda a fazer a barba que geralmente era cortada com esta mão; não ajuda nas refeições por causa de segurar nos talheres; não ajuda a vestir; não ajuda no banho; não ajuda sequer na posição em estar deitado para o lado… mas com ele posso eu bem! Hei-de adaptar-me ao gajo, embora a questão do equilíbrio seja a que custa mesmo mais a tragar. Como é que se volta a ganhar o equilíbrio? “Com o tempo… só deixando passar o tempo”, diz-me quem sabe. “Mas quanto tempo?”, pergunto eu. “Que posso eu fazer para que faça tudo mais rápido? Há alguma coisa?”.


Nada! Não há nada! Só gramar e deixar indo passar a coisa, o que constitui uma verdadeira guerra de nervos connosco próprios. Uma guerra invisível, mas ainda assim, uma guerra. Aparentemente quem olha para mim não consegue notar nada à vista desarmada. “Este Pedro é o Pedro de sempre!”, dirão. “Até está com óptimo aspecto” e “não faz nada pensar que esteve tanto tempo acamado, tanto tempo no hospital. Já está mais gordinho de cara e tudo”. Pois, eu compreendo e agradeço imenso que me digam tal coisa. Para mim é reconfortante mas faz com que a minha luta seja desigual. Eu explico: quando as lesões são óbvias e visíveis, ninguém se mete ao caminho porque o respeito fala mais alto. Se o gajo tem uma ferida que se vê logo à partida, se tem uma cicatriz, se o gajo tem uma fractura, se há algo que não engane o mal que ele está…. percebe-se logo. Avance-se! Agora… no meu caso que fisicamente passo despercebido, que tive um gravíssimo caso interno, que me falta o equilíbrio que tinha… é mais complicado! O mal está cá e nós sentimo-lo (e de que maneira!) mas é muito difícil de passar para os outros. Têm que fazer um grande esforço para se meter no nosso papel, para tentar compreender o que estamos a sentir. Por vezes é muito difícil conseguir explicar isto mas eu sinto que sou uma casa que foi toda desmantelada e reconstruída de novo. As peças estão cá mas nem eu as reconheço enquanto tal. Deixaram o sótão mas tudo o resto foi remodelado, mudado de sítio e eu agora estou a voltar a meter tudo no lugar. Fizeram-me um “reset” e a mim agora cabe-me o papel de voltar a meter tudo no sítio.


Imaginemos que, como sucedeu ontem, eu reencontro um indivíduo amigo de fora mais velho que não estava há muito tempo comigo e me perguntou, levado pelas conversas que eu ia mantendo, “que me tinha sucedido?”. Eu lá lhe respondi que tinha tido um acidente muito grave de vespa que me deixou em coma, e ele, olhando para mim, há-de com certeza ter pensado que “a coisa há-de recompor-se e voltar a ir ao lugar!”. Dito assim eu compreendo e até parece que foi… (não digo fácil porque parece mal) simples. Mas não foi nada. Fisicamente estive muito mal, estive mesmo do lado de lá (embora de nada me recorde). Os internamentos foram mais que muitos e todos eles pesados porque eu não acredito que haja quem goste de estar numa cama dum hospital onde o tempo custa mesmo muito a passar. Mas isso são histórias que eu guardo só para mim… Agora o que interessa é que eu estou na luta, estou de regresso, tudo faço para recuperar mas isso não depende só do quanto eu queira e do quanto faça força para ser. Depende de muito mais... Depende de muito mais porque é uma questão neurológica e por vezes, a força e o quanto se quer não é tudo…


Hoje na fisioterapia estava um cachopinho que era muito pequenino e estava a aprender a andar. Estava encantado comigo. Um homem tão grande a fazer exercícios tão simples como subir para uma lista telefónica e andar num só pé. Estava admirado. Eu compreendo-o. Na boca das crianças e no espanto deles está a verdade… “Mas que raio fará um homem a fazer isto?”. Não percebeu… E eu comentei com quem de direito: “Está assim e percebe-se… Eu sou muito maior mas a andar levo-lhe muito pouco e estando eu num estádio tão pouco à frente… tenho de aceitar, ser humilde, trabalhar e aguardar. Pode ser que um dia possamos dar uma caminhada os dois”.

3 comentários:

fraxinum disse...

Bom dia querido amigo Pedro,
Tenho Tentado saber noticias tuas
inclusive tentei ligar na noite de Natal , mas pouco consegui saber,~
Agora vejo que estás a recuperar
lentamente mas com MUITA FORÇA...
Ainda bem os grandes Homens são assim mesmo.

Tens uma grande familia que te vai ajudar.
Força Amigo
Feliz 2012

João Junceiro - Regata

fraxinum disse...

Força Amigo
Bom dia querido amigo Pedro,
Tenho Tentado saber noticias tuas
inclusive tentei ligar na noite de Natal , mas pouco consegui saber,~
Agora vejo que estás a recuperar
lentamente mas com MUITA FORÇA...
Ainda bem os grandes Homens são assim mesmo.

Tens uma grande familia que te vai ajudar.
Força Amigo
Feliz 2012

João Junceiro - Regata

Helena Barreta disse...

Caminhando devagar, passo a passo, vai, com certeza, conseguir chegar ao pretendido. Força e coragem.

Um abraço