terça-feira, 2 de dezembro de 2014

13 anos de ti


Soube agora por aqui que a minha filha vai hoje fazer anos e quero ser o primeiro a dar-lhe os parabéns. A minha caçula, a minha pequenina, o meu milagre impossível de ver o meu amor pela Cristina feito gente já aconteceu há 13 anos.
13 anos. Apesar de ela ser trapaceira e dizer que são 24, eu fui ver ao cartão do cidadão e afinal são só a contar desde 2001.A alegria que sinto ao teclar estes botões pretos não é mensurável. Faz-me transbordar e agradecer de corpo inteiro e vi’alma a quem manda nisto tudo (seja Deus, Alá, Buda ou o acaso, que não acredito que seja porque há aqui ordens a mais na terra para isto tudo funcionar) por poder viver este momento.

Nasceu e vi logo que ia ser torta. Com a mãe tão grávida, tão grávida que estava quase a rebentar, falhou o feriado do 1 de Dezembro como eu queria, e assim a garantia que iriamos no futuro estar todos juntos nesse dia. Mal sabia eu é que já revelava aptidão política e inteligência in útero ao antever que viria a troika e trocaria isto tudo, ao ponto do 1 de Dezembro de folga deixar de o ser um dia.
Torta mais se revelou na forma como escolheu desaguar neste mundo. Com o hospital do José Maria Grande que também foi doutor, em obras, fomos recambiados para a ortopedia, num piso qualquer lá em cima. E desculpem-me lá de estar a contar esta história outra vez, quando toda a gente já a sabe mas eu gosto e faz-me ficar feliz nesta altura, quando se chega aos anos dela. Isto é como o Natal, que é nesta altura de propósito. Toda a gente já sabe que o menino nasceu numa manjedoura, sem ar condicionado, aquecido pelo bafo de uma vaca e um burro, nas palhinhas deitado, nas palhinhas dormido e ainda bem que nessa altura não havia a ASAE senão ia tudo dentro; mas ninguém se cansa de ouvir a história. Por isso ouçam lá a do vosso Tio Sabi que ele gosta muito.
Pois eu queria mesmo ver a minha filha a aterrar no planeta terra. Era a primeira vida gerada por mim. Porra.
E avisei o pessoal todo que apanhava no corredor. “Olhe que eu quero ver…” ( e fazia beicinho e um ar de súplica que penso que resultava porque eles ficavam com pena.)

Mas as visitas abalaram, a noite caiu, já estávamos perto da meia noite, foi ficando tudo deserto e já não via a minha Cris há um tempo; se ela já estava em trabalho de parto quando a deixei à tarde… Não? Ai aquilo não era trabalho de parto?!?!? Não podia ser tantas horas antes? Então haviam de ver a pobre como transpirava (das senhoras não se diz suar porque senão era isso, por ser tanto) para verem se aquilo não era trabalho. Era sim!
Mas os maqueiros e os enfermeiros e os ajudas e o pessoal de apoio me disseram: Ai é  Dr. Durão? Ai joga o Benfica? Ooohhh… então prepare-se porque só depois do jogo é que nasce.

O médico vinha animado mas sorumbático como sempre. (agora posso dizer a verdade até porque já não conto que acompanhe mais nenhuma gravidez minha. J)
Entrou, não me cumprimentou (hábito…), foi andando pelo corredor fundo, tão fundo... até à ultiminha porta, onde a minha mulher estava.
Eu, utilizando as técnicas que aprendi nos raides dos lobitos, fui-me esgueirando entre as ombreiras das portas e fiz-lhe a surpresa quando a minha mais que tudo já estava sem forças depois de ter aguentado tanto tempo. A cara de sofrimento e esgotamento dela doía até a quem não a conhecia. Imaginem a mim…
Uma enfermeira (uma tipa com cara de bruxa e uns caracóis louros platinados) barrou-me à porta. – Não pode entrar!
- Mas eu pedi… Eu quero ver nascer a minha filha… é a primeira… (e a generala que não se torcia, nem se amolgava)
- Não pode.
- Mas por favor…
Por favor…
Por favor…
. Doutor, está aqui o pai a dizer que quer ver. (com o ar de um empregado de balcão que diz para o da caixa: saí um galão pingado!)
- O pai é muita grande e a sala é muito pequena e está aqui muito calor. (com uma ternura, sensibilidade e humanidade tocante…)
A bisca lacaia empurrou-me com jeito, encostou-me a mão e assim abriu o flanco. Segurei-lhe a mão, apertei-lha com jeito, assim bem apertada, muito bem apertadinha (de maneira a fazer-me entender mas não ao ponto de a fazer chamar o segurança, e disse baixinho: EU SOU O PAI. EU CONHEÇO OS MEUS DIREITOS.)
Foi como a gruta do Ali Bábá quando ele disse: “abre-te sésamo”.
Entrei, passei e fiquei de frente para a minha mulher o que é uma experiência… tocante. Vi a minha Alice também nascer mas foi como deve de ser. De lado. Com pára-quedas. Mais romântico, mais poético, mais bonito. A Leonor foi como dizem o ingleses: RAW MATERIAL! Dureza!

Mas não me senti mal, nem vacilei, nem nada. Tudo bom ao ponto de me orgulhar em mim. Suportei aquela tentativa de utilizar outros materiais menos naturais porque não passaram de hipóteses e conversa médica. E se nós… mas não foi preciso. Saiu naturalmente. As contracções impeliram-na.
A minha única aflição foi que a cachopa não chorava. COMO NÃO CHORA SE NOS FILMES É LOGO A PRIMEIRA COISA?!?!?!?!!?
Estava já eu quase a chorar quando a aspiraram e abençoado aspirador que fez ouvir o berro mais lindo de sempre.
Foi a maior alegria da minha vida. A mais contente. Mas fiquei tão feliz quanto extenuado. Eu e a mãe, que a carinha tranquilizou quando a viu nascer com uma felicidade divinal.

Mas apesar de cansado, tinha os amigos todos à espera para um jantar organizado ali em cima da hora no Zé Calha; seguido de uma lerpa em minha casa no Espírito Santo até altas horas da madrugada. Como na igreja ao lado estava a realizar-se um velório, chamava insistentemente atenção para o pouco barulho, até porque aquele era um prédio de trabalhadores da câmara que tinham de se levantar bem cedo para estarem no parque de máquinas. O que vale é que o meu irmão estava cá e ajudava: olhem que acordam o morto!
Já não me lembra bem como mas a garrafeira levou arrombo e quando acordei no sofá já tudo se tinha ido embora. Estão a ver o vídeo do “Come Undone” do Robbie Williams?


Pois… foi assim do género. O frigorífico vazio, o armário do liquor idem,  idem; aspas, aspas; e os pratos da avó da minha mulher retirados das paredes onde estavam expostos e cheios de lasanha no lava louça. Vá lá, vá lá isso.
Foi tudo inesquecível e fiquei tão feliz de recordar aqui isso. Bem hajam todos. Tenho saudades. Alguns continuam perto como sempre, outros estão mais longe pelas voltas que a vida dá como o meu irmão e o Pedro Matos; mas na verdade, na verdade, estão todos aqui bem dentro do coração.

Quando regressávamos do hospital, os dois… os três! tão sem jeito… olhei no espelho e perguntei: “e agora, Cris?”
Ela sorriu com aquele ar dela. De quem sabe sempre por onde ir.
E é por aí que temos ido. Todos juntados, como diz a pequena.
Obrigado.
Às duas. Às três. As mais importantes na minha vida.

A Leonor hoje é uma menina já mulherzinha com a qual choco muitas vezes porque a puberdade é mesmo a porra da idade.

Mas eu sei que se a Alice é toda mãe, a Leonor é bem Sobreiro, e barraqueira como o pai e o avô. Vejo isso pelo humor que tem.
Quando cresceres mais e ficares mais velhinha, sei que vais voltar para mim com toda a força.
Agora tenho de acabar isto porque já estou a escrever há mais de 1 hora e quero ser o primeiro e nem sequer vou ter tempo de escolher uma foto linda das tuas que tenho milhares.
Porque tu, ao contrário do que digo à Alice que é a minha filha preferida (tem 4, Leonor… Tu não te lembras quando eras assim. Mas eu lembro. Tanto. E tu, nessa altura, não tinhas uma irmã embirrante como ela tem agora. Isso passa-te.),
 TU ÉS A ESPECIAL. TU FOSTE A PRIMEIRA. E és mesmo mais bonita que a mãe.
Tens um bocadinho de mim…


Amo-te. Incondicionalmente.  

1 comentário:

Helena Barreta disse...

Parabéns à Leonor e a toda a família.

Um abraço