terça-feira, 1 de outubro de 2019

Era uma vez em… Lisboa (d’aprés Tarantino)



Foi uma semana de formação nos Mártires da Pátria, perto de S. José, para determinados funcionários de Autoridade Tributária detentores de uma licenciatura não específica, ou seja, não direcionada em concreto para a área (contabilidade, fiscalidade, economia…); mas que têm a ambição de chegarem à categoria em que deixam de ser adjuntos e chegam ao posto efetivo, principal. Mas foi também uma semana para ajudar a minha filha Leonor a encaixar-se na grande capital; e tomar eu, aquilo a que chamo, um banhinho de civilização.


Toda a gente já sabe de ginjeira que o bicho Sabi não é animal que se dê em grandes urbes. Se forem daquelas que tenham uma aldeia lá dentro, como o bairro onde a minha pequena ficará, daqueles que dá para dizer bom dia a toda a gente, de conhecermos o padeiro, o sapateiro, o homem do talho, a senhora da peixaria, e o barbeiro, que também há lá! embora eu saiba, e ele também, que não era gajo para o ajudar a enriquecer; ainda vá que não vá! Mas, quem me tira o cheiro a campo, a vaquinhas nas estradas onde corro, a ovelhinhas na tapada aqui ao lado da minha casa à noite, ao meu bar onde tomo a cerveja de glória ao final do dia, aos meus 5 minutos para o trabalho sem trânsito, tira-me tudo!

Mas… de quando, em quando… gosto muito de ir ver as montras, de ir andar de metro, de viajar de pé nos autocarros, de ver gente e o que não vejo por aqui. Assim, foram 5 dias, 5 noites, de concentração e estudo, mas também para laurear a pevide.




Há muitas fotos, muitos momentos lindos a dois, muita coisinha que fica nos nossos telemóveis, nos nossos discos rígidos, até e sobretudo nos corações, mas há aqui impressões que gostaria de trocar com os meus leitores, com vocês, a quem sempre agradeço que me queiram ouvir. Quem é que gosta de estar a falar para uma parede?

Esta é uma publicação de muito entretém, que dá direito a muita hora de qualidade, se forem aproveitados todos os brindes multimédia, séries e documentários.

A primeira impressão daquela cidade e que gostaria mesmo de partilhar é que esta Lisboa de hoje em dia, está a anos-luz daquela em que estudei e conheci no início dos anos 90, quase há 30 anos atrás. Bem, desta vez, eu sai do cinema no Amoreiras, era meia-noite, e, como não vinha nenhum autocarro… como me farto de correr por aqui… e aquilo é tudo perto… desci a avenida para o Marquês, e deste para o quarto que tinha ali por cima dos Restauradores, sem qualquer tipo de insegurança, sem qualquer vacilação, sempre a cruzar-me com polícias, municipais e dos outros, turistas nipónicos, americanos e ingleses com sacos cheiros de compras, e por aí fora. Se fosse no meu tempo… o aqueduto das águas livres é ali tão perchinho, o Casal Ventoso morava logo na encosta que dá para a Avenida de Ceuta e… sabem como é que era… desciam para o “56” que me levava para as Olaias como se fossem figurantes da série Walking Dead, com os braços magrinhos todos furados, como se tivessem estado a fazer de tapete numa turma da creche de pontilhado, cheios de caminhos para o tesouro do prazer. Ar esgazeado, olhos baços, calças velhas cheias de linhas de sangue, totalmente alienados, enfim…
Já passou.

Depois, os alfacinhas deixaram de ser como o namorado da minha antiga senhoria, o senhor Rogério, o terceiro depois de dois que tinham morrido lá em casa, nas Janelas Verdes, perto de Alcântara: cabelo curtinho às ondinhas penteadas para trás, nariz bem vermelhinho e redondinho assim pró inchado, a deixar perceber que sempre que ia à tasca da esquina não deixava de fazer gasto, e não era bem em Laranjina C; calça vincada, camisinha de manga curta de malha, palito ao canto da boca, não fosse estar para comer um petisco qualquer sem se estar à espera.
  


 Os habitantes de Lisboa agora são de todo o mundo, desembarcam aos magotes de barcos enormes que estacionam do cais das colunas para Santa Apolónia, e invadem tudo o que é rua, numa busca desenfreada por souvenirs, sejam eles poscards, ímanes para o refrigerator, ou uma tisherte de Lisabona. Enchem e inflacionam tudo, ao ponto de me ter sentado numa esplanada no Terreiro do Paço de um estabelecimento com o sugestivo nome “Catedral da Cerveja”, mas ter esperado tanto, ter chamado de igual forma, e ter passado tão despercebido, que me levantei e sai sem escusas para… ir beber uma imperial no “Martinho da Arcada” onde costumava penar um outro ser confuso, mas bem mais esclarecido, genial e visionário, também homem mas como se fosse Deus… para desta vez ali beber não um absinto como ele tanto gostava, mas uma imperial por 2 euros, ou seja, 400 paus! Livra! E eu e esta minha mania de me estar a lembrar sempre dos escudos, onde é que eles já vão…! Depois a baixa é sempre a baixa e tem ali uma mistura de história que está nas catacumbas debaixo dos pés de quem lá anda, e tragédia que ainda paira no ar desde que a terra tremeu em 1755, e ainda apor ali suspende em todos aqueles espaços ordenados às patas do cavalo de D. José, sendo a direita, a da esquerda. Pergunta para queijo no Trivial Pursuit.


Pois de dia, deu sala de aula, voltámos ao tempo de estudantes, e sobretudo ouvimos. Assim que deu ordem de largueza, da parte depois das 18h, cada um se moscou para onde queria e eu, que fui ter com o piquena assim que pude, fiz com que o banho de civilização fosse de imersão com bolhinhas coloridas e aproveitei para tentar fazer, e ter acesso a tudo o que me está vedado, na simplicidade bucólica do sítio onde tenho a graça de viver.

Na segunda fui aos filmes, coisa que tanto adoro, e faria parte do meu serão tantas vezes, se tivesse um por perto. Pois se o cinema é paixão, e o Burton, o Lynch, o Kubrick, são dos maiores profetas; Tarantino é o Midas e se há um novo por perto, a via encontrada para a sala tem de ser a mais rápida. Qualquer título da sua obra é uma aula de cinema, e desde as câmaras à história, dos atores escolhidos aos diálogos, da BANDA SONORA sempre suprema, tudo ali é perdição. Amo, adoro, quero e espero. Desta vez, a fasquia subiu e já não conta apenas com os atores de fim de catálogo como o esfuziante Steve Buscemi, ou o já infelizmente desaparecido Chris Penn, como no início; mas dispõe de duas estrelas de 1ª água de Hollywood, das mais altas que nenhuma outra desta vez, para encherem uma história que não é rocambolescamente genial como em “Reservoir Dogs”, ”Pulp Fiction”, “Kill Bill”, “Jackie Brown”, “Os oito odiados” e “Django libertado”, mas que é um mergulho profundo na meca do cinema, e num dos episódios mais estranhos e macabros da sua história, o assassinato da Sharon Tate, a coqueluche de luxo que estava grávida de Polanski. Tarantino, vale sempre a pena! Nem que seja para ver um belíssimo Di Caprio com ar lunático a queimar bacanos numa piscina com um lança chamas industrial. Muito bom.


Isto em excelente companhia! Ai se eu os pudesse casar como fazem os meus primes ciganes...
Os filhos haveriam de parecer bonequinhos da Benetton, de tão bonitinhos... Mas enfim...

Olhem, H3O me gusta! É assim que se diz?!?

Há lá idas a Roma sem tentar ver sua santidade, o Papa?!?!?!? Pode um gajo ser feliz a passar uns dias na capital sem ir assistir a uma “missa” do glorioso na catedral?!?!? Impossible! Aqui tenho de agradecer ao meu mano João Carlos Anselmo, o se ter recordado deste jogo nesse dia, e tudo ter conseguido fazer, o meu amor, para com o meu santo sogro terem esticado a passadeira que nos levou aos dois, ao piso 1, num lugar central, para uma noite de sonho. Dirão os más línguas e inbajosos que perdemos, que foi um tropeção, uma cabeçada. Pois digo eu que de cada vez que ali vou, nem sequer é só o resultado que não interessa, como a própria exibição da equipa é o que menos conta. Opáh! Aquilo ali é lindo, é sempre uma emoção, é sempre algo grandioso e uma noite enorme na minha vida! Os alemãos (escrito mesmo assim) ganharam? Olha, que se Volskswagen pelo rabo acima! Eu cá fui muita feliz. Chupem!!!



O mais complicado da noite foi a piquena que nunca mais chegava ao pé de mim, e eu já a salivar com as imperiais a jorrarem da rulote do Alto dos Moinhos;- e o cheiro a belíssima sande de leitão de ficar jantado de uma assentada só, por 5 paus, a desorientarem-me (a melhor parte para um pré-jogo, meu querido Rui Felino! Quem é que depois de conhecer aquilo pela tua mão, quer outra vez as bancas debaixo do viaduto? Nunca!). Liguei, liguei e ela… nada. Até que me atendeu e tinha-se enganado. Estava na Buraca, ou noutro sítio de desterro qualquer e eu, enquanto a aconselhava para perguntar sempre ao condutor que não custa nada e eles sabem sempre tudo, antes de embarcar, influenciei-a a meter-se mas é num uber ou num drone qualquer que a trouxesse para ao pé de mim, e me deixasse ver aquela coisa que queria tanto.


Olha, entrámos a tempo, correu tudo bem e eu, claro, fiz merda ao tentar encontrar a cadeira certa, e fui-me sentar junto ao relvado onde não se via nada bem, e… era o lugar de outros que chegaram logo depois com ar sorumbático.
- “Na, na”, disse-lhe eu, “olha aqui o número no meu bilhetinho, bébé!”!
- “Ahhhh… esse é no piso de cima, amor”, disse o gajão. “AA, não é aqui”, ou o contrário.
- PARIU!!!! Ehhhhhh… Epá. A gente ajeita-se agora aqui, senão vou a estorvar essa gente toda, estás a ver? Queres o meu colinho, ou fazes um jeitinho?”
Depois, foi-se a ver, o nosso lugar era mesmo no sítio mais espetacular, ali ao meio, a meia altura. 5 estrelas! Tão bom que só faltou… ganhar!






Perderamos...
Os macacos dos meus amigos do Puorto...

Dia sim, dia não. Depois de variarmos o peixinho para não comermos sempre carne, já pude ir descobrir se o tremendo hype que há à volta do filme Variações, é apenas o reflexo de uma paixão assolapada de um povo inteiro por um menino que vivia anos-luz à sua frente, que lhe foi roubado pela mais terrível doença do século XX; ou um filme, enquanto obra, que vale algo mais. E vale. Vale cada cêntimo pago em cada bilhete, porque tem um realizador apaixonado que tem a perspetiva certa de dar arte ao público, para que este a consuma e caso queira, admire, venere; e não se esgota na imagem de culto dele próprio como quase todos os portugueses da área sofrem, e por essa mesma razão, é que jamais sairá do casulo.






A propósito deste cometa encantador, e no seguimento da conversa de hoje com o meu amigo Dr. Vitoriano de Sanvimed, sai este documentário mágico que passou há muito, mas estará como a sua música, sempre atual.







E a homenagem a António Variações


A banda a seguir, a que quis dar nova vida à alma das músicas que o génio tinha depositado em cassete, é esta: “Os humanos”, uma superbanda com alguns dos mais geniais dos jovens artistas da música portuguesa, com a grande Manuela Azevedo dos Clã (a seguir, também), o grande Camané (gigante do fado em baixa estatura), ou o querido David Fonseca (um multi-instrumentista multi-facetado).

  
Para fechar a semana com chave de ouro, apesar de tanta insistência, fui só, assistir ao deslumbrante espetáculo “A Severa”, que conta a história desta icónica figura do fado. Após a magnífica francesinha na Tasca Pombalina do Rossio, segui só, depois de a ter deixado no autocarro que a levaria até casa. Enquanto admirava aquilo, só agradecia em silêncio, a sorte que temos de podermos contar com este La Feria em vida. Que nível absolutamente “a la” Brodway, de deixar qualquer um rendido.












Por tudo isto e muito mais, agradeço, peço, e agradeço outra vez.
Era uma vez… uma bela viagem.



Graças a Deus...

Recordando... quando a fomos lá levar...


















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