A minha Leonor é muito
inteligente. Digo isto com muita alegria e alguma vaidade mas sem me querer
armar aos cágados. É a constatação de uma realidade. Dizer isto para mim é tão
óbvio como dizer que a Alicia Keys é linda, tem uma voz soberba é uma artista
que não dá um tiro ao lado. A Leonor sempre teve uma inteligência pacífica,
tranquila.
A minha Maria, filha pelo
baptismo, também é muito inteligente. Mas já é uma inteligência rebelde, algo
desassossegada. Muito desassossegada. Questiona tudo o que mexe.
A ver se consigo explicar a
diferença: pela Leonor ainda vivíamos no tempo do Salazar se ele não tivesse
caído da cadeira, o pobre do velhinho. Para não fazer reboliço, ela aguentava o
Antigo Regime. Sofria em silêncio.
Isto para dizer que se as grandes
são assim, a minha Alice é um upgrade da Maria. É a inteligência dela em versão
de 2010. Rebelde ao cubo. Um cubo em 3 dimensões e virtual.
Dois apontamentos deste domingo
passado:
Fomos almoçar fora com as tias do
Vasco Santana (as minhas…) no sítio do costume quando saímos para comer no
Verão, à beira rio e a ver Marvão. Onde se paga não só a comida mas o espaço
também. Tudo muito bom, tudo muito fantástico. Mas a Dona Alice, que tinha ido
de manhã para a piscina comigo e com a mana, arreou depois do peixinho
grelhado. Não foi ao tapete, resistiu mas quando fomos dar uma voltinha a
Castelo de Vide para apresentar às minhas tias que estavam desertas de ver
gente e coisas novas, a loja da mãe da minha amiga Sofia Borges, a Alice
deixou-se dormir no carro. Aí só não foi ao tapete como se diz no boxe porque
ficou encostada na cadeirinha. Ficou com guarda mas a descansar no carro.
“Coitadinha… eu sabia que se ia deixar dormir”, pensei. Uma meia hora depois
decidimos regressar a casa. Eu arrisquei-me na condução e desci uma rua mais estreitinha
do que eu me lembrava, que vai da igreja matriz à fonte da vila. Raspei um
bocadinho com o espelho. Um bocadinho, porque o Astra é largo que se farta e eu
estava habituado a descer aquilo à pendura nos carros dos meus pais, mais
franceses e mais fininhos, um Renault e um Peugeot. Tudo tranquilo. Tudo calmo.
Mas a menina Alice, de 3 anos, acordou com uma energia que foi como a
inteligência dela. Quando ouviu o carro a raspar, saltou e disse bem alto e a ralhar: “se a mãe
tivesse vindo não te tinha deixado vir por aqui!” Logo assim, de rompante e à
primeira, sem medir as distâncias. Como eu não tinha medido com o carro.
Como se não bastasse, de tarde
outra pérola, esta relatada pela mãe que a presenciou. Como almocei bem, apenas
jantei uma sopa e uma peça de fruta. A Cris falou com a Tia Bia e ela disse que
a Alice tinha comido bolachas na Beirã. Houve mal entendido e a Cris que é uma
mãe zelosa foi-se na conversa da minha tia que tem quase 90 anos e já se alimenta
com muito pouco porque os anos não querem fartazanas. Confiaram uma na outra.
Descuraram a Alice. A Alice também comeu uma sopa fantástica que a mãe tinha
estado a fazer nessa tarde, para desenjoar. Quando acabou de comer a sopinha,
achando que o convés ainda não estava bem arrumado, disse: “ó mãe: eu agora
queria um bocadinho daquilo que se come depois da sopa ao jantar.”
Compreendem agora o que escrevi
no princípio do texto?
2 comentários:
não colocaste no face por esquecimento ou por não quereres partilhar?
Gosto da subtileza do "daquilo que se come depois da sopa", muito bom.
Um abraço
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