domingo, 26 de agosto de 2007

El calor del amor en un bar



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Há dias, num almoço de família num restaurante da nossa praça, olho em redor e constato que muito provavelmente devemos ser os únicos portugueses à mesa. Os espanhóis como sempre, enfeitiçados pela qualidade da nossa cozinha e sobretudo pela força do seu euro que vale bem mais que o nosso, comiam demais, bebiam demais e sobretudo, falavam alto demais. A Portagem é um enclave espanhol em solo luso. Dizia-me o meu querido amigo João José que “os gajos estão com uma força de alta escala”. Na sua imensa sabedoria de anos ganha trabalhando na actividade turística, sendo um dos grandes “embaixadores” locais nas terras vizinhas, afiançava-me que “o turista espanhol investe com prazer”. Para eles, o dinheiro mais bem aplicado é o que é traduzido em bens que lhes entram pela goela abaixo.

O portuguezinho, apertadito, leva vida de sacrifício para pagar a vivenda e o carro que se quer actualizado. Os gajos, os espanhóis, querem é boa comida e boa bebida e mucha marcha que a vida são 2 dias e o que se goza é o que se leva. A la madre que parío las casas e las viaturas! Buen bacalao, buen viño e a gozar!

São capazes de estar certos.

Quando vim para as finanças para Marvão, herdei o serviço do Imposto Sucessório, posteriormente transformado em Imposto de Selo e que era um tema particularmente difícil para quem vive desde sempre nesta comunidade e quem conhece praticamente toda a gente. Traduzido, sempre que alguém falecia, era eu quem atendia os herdeiros e os ajudava na condução de todo o processo de tributação dos bens transmitidos. Particularmente difícil quando os que partiam nos eram chegados e éramos confrontados com a emoção dos familiares no decorrer do processo.

Aconteceu algumas vezes ficar a pensar sozinho que há coisas que não valem mesmo a pena. Às vezes quando os “velhotes” partiam, luzia no olhar dos filhos chegados de todas as partes para o funeral e para tratar da papelada, a ganância de ficar com o melhor quinhão. Pressentia-se o conflito e tantas vezes, o fraco elo de familiaridade que restava partia-se então para sempre.

Nisso os espanhóis estão certos. Para a frente é que é o caminho e quem fica atrás que feche a porta. Sólo se vive una vez!

Voltando ao programa familiar, para desmoer o repasto, nada melhor que um passeio por Valência que celebra agora as suas festas populares. Num café de esquina, tomando una copa de média tarde, olho embasbacado e sorridente o ar febril que se vive na sala. Os clientes são maioritariamente trintões e quarentões acompanhados das suas respectivas. São mais de vinte. Estão obviamente e etílicamente bem dispostos, bem “do meio para a frente”, como eu costumo dizer. Aqui, também nos ganham aos pontos. Bastava o som que debitava das colunas e um cd manhoso de um flamenco qualquer e parecia, ou pelo menos para eles era, a melhor festa do mundo. Tinham na cara um ar de felicidade e companheirismo que fazia daquele local algo mesmo muito especial. Os homens abraçavam-se e cantavam. Elas, de pé, batendo palmas e os pés, desafiavam os machos num baile de antologia. Um mais afoito, mais tareco, furava por entre a multidão, com passes de maestria bem regada. Era um consolo, um prazer tão bom poder assitir a tudo aquilo sem ter de pagar.

E imaginava o cenário em Portugal, na minha Santo António das Areias, em alturas do São Marcos, e vejo como somos tão diferentes. Para já, por aqui, as mulheres e os homens não vão juntos aos bares. Quando muito vão beber café, mas para os copos não. A aficcion etílica nesta zona é reservada aos homens. Contam-se pelos dedos as mulheres que vão ao café dar dois dedos de conversa e beber umas imperiais ou umas cubatas. Longe disso. Só por aí já é impossível recriar o cenário que vi em Espanha. E depois, por aqui, está todo o mundo muito mais preocupado em reparar nos outros do que em divertir-se. Aquela malta estava toda na mesma onda e tanto se lhes dava como se lhes deu que estivesse alguém estranho a ver. Eram livres, estavam à vontade e desfrutaram do momento. E de certeza que não foi por isso que são menos homens ou mulheres, menos respeitados nos seus empregos e nas suas vidas.

O nosso mal é que nos preocupamos demais com a fachada e com aquilo que os outros pensam e vivemos tantas vezes no jogo da aparência, do “diz que disse” e não nos esforçamos para sermos felizes.

Alguma vez seria possível, numa tenda qualquer do São Marcos, ver os casais da minha terra assim, a comer e a beber e a brincar juntos?

Está bem abelha!

Também aqui voto neles.

Nos casamentos por cá, é frequente, depois do almoço tardio, os homens encaminharem-se para o bar para mais um digestivo. As mulheres, na retaguarda, põe a conversa em dia e depois criticam “as tristes figuras” dos que se adiantam no programa.

No único casamento a que fui onde havia espanhóis e portugueses, da minha querida amiga Ana Rita, em Elvas, ainda os maridos não tinham acabado a sobremesa, enquanto guardavam os filhos e já elas dançavam junto ao organista, de cubata na mão.

Será que as mulheres espanholas são menos sérias?

Isso eu não sei, o que eu sei é que mais uma vez, tive o pensamento recorrente de que se o nosso Afonso Henriques tivesse tido mais calma com a mãe, a conversa hoje podia ser outra…

6 comentários:

Mandrágora disse...

Antes de mais nada os meus parabens pelo teu blog, e pedir disculpas pelos posibles erros ortográficos que possa vir a ter neste meu comentário.
Realmente as mulheres espanholas não são menos serias que as portuguesas...en espanha ja se anda lutando faz muitos anos para ter os mesmos direitos que os homens (mesmo que ainda falte muito caminho por recorrer)...Cuando eu cheguei a Portugal (faz unos 11 anos atrás) ja notava as ditas diferencias...pensei que tinha retrocedido no tempo unos 20 ou 30 anos. Mulheres e homens preocupados mais na forma de vestir e aparentar que em mostrarem realmente o que sao (com algumas excepções), olhar e criticar a quem leva a vida mais "a ligeira" porque não tem a coragem de fazer o mesmo, mesmo a morrer de vontade de viver assim. É claro que em Espanha também se critica, mais a gente aprendeu a ignorar de tal forma que ja ne vemos ne ouvimos....so vivemos!!! E que não digam como temos que viver porque ninguem me vem a pagar as contas, criar e educar os filhos, e resolver os nossos problemas....ja que não ajudam também que não critiquem. Eu em Portugal continuo a pensar,falar e fazer o mesmo que fazia em Espanha e sinceramente....dame o mesmo o que os demás possam dizer de mim...Solo me preocupa o que a gente q realmente quero possam pensar de mim, e são a esses que nunca quisera decepcionar...o resto DEIXAR ANDAR. Um abraço. emma serrano.

Pedro Sobreiro (Tio Sabi) disse...

Ema, muito obrigado pelo teu comentário e pelo teu contributo. A pouco e pouco descubro que o blogue é lido por mais gente para além do meu núcleo de amigos e acho que isso é bom.

Ainda bem que concordas comigo.

Tu, melhor que ninguém de nós, conheces bem o choque destas duas realidades.

O teu texto é muito corajoso e frontal e adorei quando dizes "E que não digam como temos que viver porque ninguem me vem a pagar as contas, criar e educar os filhos, e resolver os nossos problemas....ja que não ajudam também que não critiquem".

Podes crer! É uma grande verdade e eu assino por baixo.

Força para ti e tudo de bom!

Garraio disse...

Quando tiver vagar já cá venho...

;)

Garraio disse...

Bom, acho que já tenho vagar.


O que certamente não terei é arte e engenho para conseguir expulsar todas as emoções que me afloram quando se trata de comentar aquela que foi, ao fim e ao cabo a senda da minha vida, uma vereda entre Portugal e Espanha.

Espanha "prendeu-me" desde pequenino. Era proibido. Precisava-se salvo-conduto. Se vivesse 10000 anos não esqueceria a primeira viagem a Valencia de Alcantara. Tinha sete ou oito anos e fui com o Chefe da DGS/PIDE então comandante da fronteira de Galegos, o Sr. Machado, que tinha dois putos da minha idade, o Eduardo e o Luis. Eram vizinhos do meu avô, o pequeno grande homem a quem chamavam o ti Xico Alfaiate, alguém avançado um século à sua geração e cuja vida um dia contarei num livro.

Aquele dia ficou gravado na minha memória. Foi uma autentica cena do "conta-me como foi". Bebemos umas mirindas de laranja no "paseo" e comprámos cigarros de chocolate na pastelaria que hoje é do Luis Carlos, na pracinha das Laranjeiras, em frente dos Artesanos. Não há palavras para descrever as sensações vividas naquela jornada.

Há muita boa (e má) gente que ainda olha para mim de soslaio porque nunca " cresceram" comigo. Eu cresci em Espanha. Com amigos espanhóis. Mas nunca deixei de ser português, mesmo adorando Espanha. E Espanha é um país enorme, do tamanho do coração dos espanhóis.

Mostrado o cenário, atribuo-me, se calhar com alguma prepotencia, o direito de poder falar do assunto.

Como perfeito é Deus (e eu não tenho provas que ele exista...) nem os espanhóis nem os portugueses somos perfeitos.
E não é com iniciativas isoladas que algum dia poderemos melhorar.

Vai ter que ser em conjunto, ou não será.

A zona em que vivemos é a zona mais deprimida da Europa Ocidental. O poder político, sempre ligado à expressão das urnas, mostra contundentemente a nossa fragilidade. Só há uma forma de tentar ultrapassá-la. Através da união. Já dizia o Xico Alfaiate que a união faz a força.

Independentemente das diferenças culturais que existam à hora de beber copos e andar com ou sem mulheres atrás,(ou à frente) o Alentejo e a Extremadura não podem continuar de costas viradas.

Há alguns anos, houve uma pessoa, presidente da Câmara de Castelo de Vide, que tentou dar a volta a esa situação. Foi Carolino Tapadejo. Não posso dizer quantas, mas muitas centenas, talvez milhares, de pessoas em Espanha me falaram dele, Já ele não estava na política activa, há muitos anos.

Valencia de Alcantara e Marvão precisam de alguns Carolinos. Agora e já. Para que tenhamos projectos em comum, para que tenhamos um futuro em comum. Só assim seremos mais fortes. Só assim podemos criar cinergias mais fortes. Só assim desenvolveremos o nosso comércio, a nossa indústria, o nosso turismo. Só assim escutarão a nossa voz longe de aqui. E então saberão que existimos.

É para este rol, tão difícil, quase utópico, que eu tenho fé (mas eu tenho fé...?) não, EU ACREDITO, num homem de barbas na cara. Ladyes and gentlemen, Pedro Sobreiro.

Do outro lado do Sever, espero um entendimento rápido das forças políticas, e mãos à obra. Vamos sair da apatia, da mediocridade e vamos aproveitar as condições invulgares que a Natureza e o Homem nos legaram para desenvolver a nossa Região.

Iniciativas comuns, precisamos de muitas iniciativas comuns.

Aproveitemos o espaço da Fronteira para fazer uma feira internacional, actividades económicas, gastronomia, artesanato, espectáculos.

Criemos um roteiro turistico comum (talvez assim o nosso turista-tipo fique uma semana, em vez de dormir só duas noites).

Melhoremos as vias de comunicação (já uma estrada em condições Santo António das Areias - Valencia de Alcantara.

etç. etç. etç...

Garraio disse...

virou-me a conversa para temas politicos e não era essa a intenção.

Acho que aqui"estamos" de outra forma. Peço desculpa, de todas as formas, este comentário vai ser publicado no blog "Valencia de Alcantara e su politica".Assim não divaguei tanto... ;)

Goyi disse...

Vou pedir também disculpas por entrar na casa de alguém que nao conheço e , embora nao tenho nada ou muito pouca timidez, é certo que da-me pudor já que prefiro falar do que escrever com alguém que nao conheço. Peço também disculpas pelos meus erros ortográficos, alguns sao debidos ao meu teclado outros sao da minha falta de prática. Garraio tem sido a pessoa que me fez encontrar com este blog e estou a pasar uns minutos muitos bons lendo os vossos comentarios, também faz-me ter muitas saudades do meu tempo vivido em nosso Portugal. Cuando cheguei a Portalegre faz agora 25 anos encontrei-me com un país muito diferente do meu, e devo reconhecer que nao foi muito fácil a minha adaptaçao, mas pouco a pouco fui aprendendo a gostar de voces e a sentir-me uma mais entre vos....e digos- vos uma coisa: cuando por esse mundo fora, oiço falar Portugues ou cantar um fado bonito, sinto uma revolta enorme no meu interior porque estando tao perto de voces, por veces sinto-me muito longe.
O que falas da mulher espanhola é certo, calculem o revulsivo que supos a minha chegada e de outras espanholas a Portalegre, numa época na cual as mulheres portuguesas viviam muito mais em casa do que nós. As espanholas queriamos continuar a fazer a mesma vida do que cá, e era muito dificil, entravamos em lugares donde só havía homens, saiamos a discoteca sem os nossos maridos e nao olhavamos para o que falavam de nos...... mas digo-te uma coisa nunca me sentí mal por ser criticada, foram respetuosos e a minha frente ninguém nunca me faltou. Estudei na escola de enfermagem e sempre fiz o mesmo que as minhas colegas solteiras, nunca fiquei em casa e a primera em todas as farras, era eu..... Vou-vos confesar uma coisa, voces sao menos superficiais e muito bons amigos, nao sei se será influencia do país ou da forma de vida mas eu juro que, muitas veces, só tenho vontade de voltar, e viver junto de vos, no meu Portugal.