quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Dobrando o indómito



Hoje venci o meu Adamastor.

Hoje consegui o que sempre pensei ser impossível.

Hoje, correndo, dobrei a serra de Marvão.

Comecei namorando-a no sopé, agarrei-me às madeixas dos seus cabelos e trepei-a até ao cume, quando já só tinha o castelo à minha frente.

E pensar que precisamente hoje, nem me apetecia muito ir. Depois dos 7 dias sem treinar, decidi que quando regressasse iria duplicar o ritmo para recuperar o tempo perdido. Após dois dias de um jogging seguido e intenso, quando cheguei a casa, já depois das 7h, senti-me lazeirento e equipei-me meio contrariado.

Mesmo assim insisti e quando cheguei ao cruzamento com a nacional, em vez de cortar para os Barretos, segui em frente, encosta acima e fui seguindo, seguindo até onde nunca esperei chegar.

Já por 3 ou 4 vezes por ali me tinha aventurado mas ao chegar à Fonte da Pipa, o excesso de cansaço e a falta de fôlego fizeram-me virar para trás sem a sorte grande mas com uma pequenita terminação debaixo do braço. De cada vez que rodava e pensava em descer, os olhos iam-se-me por aquele alcatrão acima como que a dizerem… “quando é que serás capaz?”.

Calhou a ser hoje, quando tudo indicava o contrário.

No percurso lembrei-me de quando comecei a correr, há mais de 10 anos atrás, com umas sapatilhas Diadora que a minha mãe me ofereceu nos anos. Lembrei-me de quando fui morar para Marvão, das descidas que fazia e daqueles que me gozavam dizendo que para baixo, todas os santos ajudavam.

Foi preciso muita persistência, muita força de vontade, muito trabalho, muita abnegação, muito espírito de sacrifício, muita entrega.

Correr não é apenas dar à perna. Quando se corre por correr, pelo gosto de correr, há ali algo que nos faz mergulhar num propensão genética qualquer, como se fosse um desafio à nossa própria existência. O homem não foi feito para estar parado, amarrado a uma secretária. Quando um corre, liberta-se, põe-se à prova, sente-se mais vivo do que nunca quando o sangue bomba por todas as artérias e a respiração puxa ar e vida.

Depois, não há coisa que me dê mais prazer do que quando me supero, quando me transcendo e provo a mim próprio de que sou capaz.

Nestas minhas incursões pelo desporto e pelo jogging olhava sempre para o morro de Marvão como o meu Everest. “Ena pá, se eu ao menos um dia lá chegasse ao ciminho…” e continuava de olhos no chão, certo de que era um objectivo que estava para lá das minhas capacidades.

Tudo isto se torna ainda mais motivante e recompensador quando penso que foi transposto por um miúdo asmático que passou a infância e grande parte da juventude dependente de medicação regular e aerossóis e só à custa de muita natação e muito desporto conseguiu quase duplicar a capacidade toráxica e superar em muito a resistência.

1 hora e meia depois de arrancar, quando avistei a minha casa, já de noite, nem queria acreditar no que tinha conseguido fazer. Ver as luzes a brilhar lá bem no alto e saber que já não são mais intransponíveis… foi lindo!

Agora sim! Deixou de ser a brincar e já só penso nessa primeira meia-maratona de Lisboa que alguns colegas de esforço me incitam a fazer. Aí pessoal! Caraças, pá! Valeu!

Ai Sócrates, Sócrates… vais levar uma rabeta, bebé! Até te saltam os collants!

Espera pela demora…

Porreiro, pá!




4 comentários:

Robson Lima disse...

Quisera eu ter tanto fôlego e disposição para dar minhas corridas.... Parabens pela superação...rsrsrs

Gi caldeira disse...

Eu nunca duvidei.
Nao sei onde vais buscar as energias, depois de um dia de trabalho. Até fico com vergonha da minha perguiça. BOAAAAAAAAAAA.

LEMBRO-ME DO DIA DA CHUVADA TORRENCIAL E TU SEM QUERERES ENTRAR NO CARRO.

Goyi disse...

Pedro, Pedrito, ten cuidado que en el término medio está la virtud y yo , como soy la más vaga del mundo mundial, para disculpar la envidia que me causas te diré que:

Carrera que no da el galgo en el cuerpo la lleva. ( de alguna manera tendré que liberar mi conciencia).

Besitos.

Pedro Sobreiro (Tio Sabi) disse...

Minha querida Gisélia Caldeira, como é que eu me posso esquecer dessa fatídica tarde em que me salvaste de ir na enxurrada? Sabe Deus onde estaria hoje se não fosses tu… Tinha sido um dia difícil na câmara e eu cheguei a casa numa pilha de tal ordem que se me ligassem um dínamo ao rabo estava capaz de dar luz a toda Santo António durante um mês inteirinho.

Foi um daqueles dias em que senti mesmo necessidade de correr, de suar, de sair de mim e de libertar toda aquela carga negativa. Nem as nuvens ameaçadoras que enegreciam o céu em redor me conseguiram demover das minhas ideias. Meteu-se-me na cabeça que era capaz de ir, dar a minha volta e chegar a casa enxuto. Louco!

Quando começaram a cair as primeiras gotorras (enormes!) ali à Abegoa, tu passaste no carro e fizeste-me sinal para ir contigo. Eu, feito tótó, fiz-me duro, agradeci e disse que não.

Mal as luzes da tua viatura desapareceram na última curva, caiu um “caqueirão” daqueles à antiga e eu já me estava a ver caminho da Austrália, nas grandes correntezas profundas do Oceano.

Como deves calcular, foi com enorme alegria que te vi regressar por mim, como se fosses uma miragem, num resgate apoteótico.

Voltaste para trás de propósito.

Se já te tinha em tão boa conta, nesse dia quadruplicaste a consideração.

Hei-de ficar para sempre grato, sobretudo pelo gesto e pela intenção.

Beijo grande para ti.

E um abraço ao meu recém-amigo Robson, que eu tanto gostei de conhecer no Brasil. Tu tens tudo o que é preciso para seres alguém muito grande e fazeres muito pela tua terra: és jovem, inteligente, trabalhador, amável, sério, conhecedor, responsável, humilde e boa gente. Gostei mesmo muito de te conhecer. Nos três dias em que nos acompanhaste, nesse tão curto período de tempo e em dois momentos diferentes, abriste o teu coração perante nós e revelaste tanto de ti e do teu processo de vida, com tamanha naturalidade e maturidade que me cheguei a arrepiar. Tu mereces o melhor do mundo, rapaz. És um lutador. Tenho muita esperança em ti e prevejo algum de muito bom no teu percurso. Fico a fazer figas que venhas a Marvão. És um dos que merece mesmo! Abraço, minino!

E finalmente tu, minha querida Goyi, a minha alma gémea espanhola. Sabes que aquilo que nos une é muito mais do que amizade e respeito. Somos tão parecidos em tanta coisa que mais parece que somos irmãos. Tenho saudades tuas, de estar contigo.

Quando atravessaste este difícil período da tua vida, (que me confidenciaste na nossa viagem a Mérida e eu guardei só para mim) tentei ligar-te por diversas vezes. Sempre sem sucesso. Queria, nem que fosse apenas abraçar-te, dar-te um beijo, limpar-te essas lágrimas que tão mal ficam na tua cara tão bonita e tão espanhola e dizer-te que faças o que fizeres, já venceste porque arriscaste.
Como tive oportunidade de te dizer no e-mail que te enviei, nunca deixes que te apontem seja o que for, nem que te roubem a tua imensa alegria de viver e de ser feliz porque esse é o teu maior tesouro.

Fizeste o que tinhas a fazer e acredita que para muitos, e para mim sobretudo, valeu muito a pena.

E da próxima vez, contesta-me la llamada y ven comer ou cenar com tu hermano de Marvão, que tanto te quiere.

Encantadora!