No dia 8 de Setembro, a Câmara Municipal decidiu por unanimidade atribuir a título póstumo, a João Nunes Sequeira, a Medalha de Ouro do Município de Marvão, pelo seu excepcional contributo em prol do desenvolvimento industrial do concelho e pela sua vasta obra social; e a Medalha de Mérito Municipal a João Nunes Vidal, pela sua dedicação e o seu esforço de uma vida no sentido de recuperar as tradições etnográficas e as raízes culturais do concelho de Marvão que divulgou depois com prestígio por todo o país e estrangeiro.
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A biografia do Sr. Sequeira já constava dos arquivos camarários.
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A de João Francisco Rosado Nunes Vidal, depois de uma conversa numa manhã destas, saiu-me assim:
Quando me desloquei à sua casa para fazer esta recolha biográfica encontrei-o algo abatido e apreensivo mas bastou o convite para revisitar a sua vida, para lhe iluminar o rosto e encher o olhar de memórias. Transfigurou-se em segundos e parecia outra pessoa, alegre e faladora que se divertia e recriava com os episódios passados.
João Francisco Rosado Nunes Vidal, nasceu a 28 de Fevereiro de 1940, há 69 anos, no Jardim, freguesia de São Salvador da Aramenha. É filho de Manuel Nunes Vidal, canastreiro de profissão, e de Catarina Rosado Tapadinhas, doméstica. Deles herdou a veia artística que já antes se tinha manifestado na família nas figuras do avô paterno e da avó materna, ambos tocadores de harmónica. O pai era acordeonista e a mãe, uma cantadeira famosa. Juntos formaram uma dupla de sucesso que animou os bailes no concelho e na região. Com eles aprendeu a habituar-se às festas, a crescer entre as palmas, a conhecer o poder libertador da dança. Dormiu muitas vezes junto ao palco, enrolado num xaile. Por vezes acordava quando a bailação estava rija e dançava também. Conheceu muita gente, muitos sítios. Tornou-se popular.
Frequentou a escola primária da Portagem, onde hoje funciona a Sociedade Recreativa. Aos 12 anos partiu para a cidade e ingressou no Curso de Formação Geral de Comércio da Escola Comercial de Portalegre.
Quando terminou, o seu primeiro emprego foi no escritório dos “Cafés Guapa”, situados nos Olhos d’Água, propriedade do Sr. José Maria Pires Cardoso. O negócio ia de vento em popa e só o irrecusável convite para trabalhar no Banco Pinto e Sotto Mayor, o fez rumar a Lisboa. Não podendo estar longe da música e da acção, entrou para o coral da Casa do Alentejo que ajudou entretanto a reorganizar.
Anos depois surgiu a oportunidade de regressar e voltou a Portalegre, para a sucursal deste banco na cidade, perto do Café Alentejano, onde desempenhou as funções caixa e fazia de tudo um pouco. O Sr. Vivas da Beirã era cliente e ia lá com frequência depositar dinheiro e tratar de negócios. Como era Provedor da Santa Casa de Marvão e conhecia o gosto que Vidal nutria pela música, cultura e etnografia, falou-lhe na possibilidade de fazer um rancho da Misericórdia. Esta instituição tinha então dois asilos para jovens, um para rapazes (no edifício do Espírito Santo ao lado da Casa do Governador) e outro para raparigas que funcionava na própria sede. Neles estavam hospedados cerca de 60 rapazes e 60 raparigas chegados de todo o país e oriundos de famílias pobres. A ideia do rancho surgiu com o intuito de criar mais uma actividade para ocupar os tempos livres daqueles jovens. As intenções foram as melhores mas o resultado foi revolucionário para a época. Permitir que jovens de sexos diferentes se juntassem e passassem horas a ensaiar e a dançar agarrados não era propriamente do agrado das freiras e muito menos da Madre Saturnina que tudo fazia para não os ver juntos.
Vidal aceitou o convite de forma graciosa e passou a deslocar-se de Portalegre propositadamente para os ensaios. Não só não recebia qualquer tipo de pagamento como teve de fazer investimentos do seu próprio bolso. Comprou então um gravador que ainda hoje conserva, caríssimo para a altura, um luxo só ao alcance do ordenado de um bancário. Foi dos primeiros aparelhos que por aqui apareceram e revelou-se uma ferramenta indispensável para o trabalho de recolha de modas que iniciou então por todo o concelho. Os seus interlocutores de mais idade, aqueles que guardavam os saberes mais antigos, assustavam-se com o aparelho “que guardava a voz lá dentro” e muitas vezes teve de levar o gravador escondido. Fazia esquemas num papel com as danças que “não importavam se eram bonitas ou feias. O que importava era se eram autênticas”. As portas abriram-se-lhe com muita facilidade. A popularidade angariada nas digressões artísticas com os pais quando era criança foi-lhe então muito útil. Reuniu um total de 60 modas sendo algumas delas palacianas, aprendidas por pessoas que trabalharam em casas de pessoas abastadas.
Participou também activamente nos cortejos de oferendas que se realizavam sempre no dia 8 de Setembro, nos quais pessoas e instituições de todo o concelho se deslocavam a Marvão de carroça para levarem produtos que ofereciam à Misericórdia. Era uma manifestação muito importante que envolvia muita gente chegada de toda a parte e oferecia um pouco de tudo o que tinha.
Entretanto, a actividade do rancho que se prolongou por cerca de 3 anos, extinguiu-se quando o asilo para jovens terminou e estes se viram obrigados a regressar às suas terras.
Diz o povo que “sempre que se fecha uma porta, se abre uma janela”. O êxito da actividade inédita que desenvolveu no Rancho da Misericórdia granjeou-lhe uma fama que levou a que o convidassem a fundar um rancho na Boavista, em Portalegre. Nesse então, o “bichinho” do folclore já mandava muito na sua vontade e não pensou duas vezes. Encetou então uma intensa actividade de recolha das modas desse concelho, sobretudo nos Fortios, em São Julião e na Urra. Ali não faltavam pares e vontade. Já com fama de referência da etnografia à escala distrital, chegou a ensaiar quatro vezes por semana, as mais de 80 pessoas divididas em 3 escalões etários.
Esta actividade graciosa e mantida unicamente pelo gosto durou cerca de 4 anos, até ao momento em que saiu do banco e deixou Portalegre. Nesse momento, o rancho da Boavista já estava completamente formado, sedimentado e em plena actividade.
Entrou então para a Câmara de Marvão, numa fase em que tinha saído da presidência o Dr. Machado e entrado o Sr. Carita, num período em que os autarcas não era eleitos mas nomeados pelo Governador Civil. Aí fez de tudo. Recorda-se de um livro enorme onde se registavam as receitas e as despesas, cujo preenchimento era uma das suas incumbências.
Entretanto, em Castelo de Vide havia já um rancho mas que era muito fraquinho e funcionava mal. Decidiu dar uma ajuda e acabou por ficar quase por década e meia. Curiosamente, foi este projecto, o único que não começou de raiz, aquele que lhe deu mais trabalho. Desenvolveu uma intensa recolha etnográfica na vila e em Póvoa e Meadas, uma zona muito rica em modas e tradições, sempre acompanhado do seu inseparável gravador.
O Sr. Carita, sabendo-o conhecedor do concelho e das regiões limítrofes como ninguém, aconselhou o Director-Geral de Turismo a colocá-lo no Posto de Turismo da Fronteira de Galegos que tinha então um movimento extraordinário. Ali trabalhou durante cerca de 12 anos, numa área que o motivava imenso e achava muito estimulante.
Do Rancho de Castelo de Vide saiu para fundar o da Casa do Povo de Santo António das Areias, há cerca de 25 anos atrás. Nesta aldeia existia já um rancho que foi começado pelo Sr. Rui Sequeira que terminou. Decidiu deitar mão ao que restava desse grupo e organizou-o de forma diferente porque “o folclore não é só o que se canta e dança mas também o que se traja”. O rancho é da Casa do Povo porque na altura estas instituições tinham dinheiro para apoiar o folclore. É esse o motivo porque há tantos sob essa tutela espalhados por todo o país.
O rancho arrancou logo com muita gente, perto de 100 pessoas, o que permitiu fazer 3 escalões. Os ensaios, duas vezes por semana, começaram no Grupo Desportivo Arenense. Brilham-lhe os olhos ao recordar as gerações e gerações de arenenses que por lá passaram, sempre com ele como ensaiador. Nesses tempos nunca faltaram músicos para a tocata, como acontece agora. Lembrou o Sr. João Carrilho e o Manuel Rafael Carrilho, o Adelino Marmelo, o Barbas, o Vítor Conchinha (que fez a música da Sr.ª da Estrela partindo das quadras recolhidas por ele), o Abílio Baldeiras…
Fala também com orgulho do Festival de Folclore do concelho de Marvão que organizou pela primeira vez no tempo da presidência do Sargento Paz, ainda com um carácter regional.
Quando nasceu a Rádio “Ninho d’Águias”, de Marvão, durante o boom das rádios piratas em Portugal, divulgou o folclore no programa “De lés-a-Lés”, um dos mais apreciados pelos ouvintes.
Durante todo este tempo, nunca descurou o precioso trabalho de recolha. Só modas de saias tem cerca de 200 e ainda hoje conserva todas as cassetes de gravações desde o início (algumas delas certamente já desmagnetizadas), um espólio riquíssimo que convinha recuperar com urgência e preservar.
Ainda antes da abertura das fronteiras, quando as pessoas já paravam muito menos, o Posto foi encerrado. Entrou então para a secretaria da Escola Básica Integrada Dr. Manuel Magro Machado de onde se viria a reformar.
Decidiu abandonar o “seu” rancho há 3 anos por achar que já não havia verdade etnográfica. “O traje para mim é como se fosse um uniforme. Havia uma falta de respeito muito grande e foi melhor afastar-me”, disse, numa decisão solitária e irreversível. A sua esposa e filha continuam ainda hoje a colaborar em permanência. A princípio sofreu imenso com essa saída mas agora diz que “vai vivendo”. A paixão pelo folclore vai sendo alimentada em tardes e serões a ouvir as centenas de gravações que lhe foram oferecidas por ranchos de todo o país ao longo dos anos.
Delegado da Federação do Folclore Português, entidade encarregue de “separar o trigo do joio” apoiou ainda os ranchos de Nisa; de Vale de Maceiras, no concelho de Fronteira; de Gáfete; de Aldeia da Mata…
Graças a este amor de toda a vida conhece e é conhecido em todo o país que percorreu praticamente na íntegra.
A vida de João Nunes Vidal é uma vida dedicada à causa etnográfica. Milhares de quilómetros percorridos, milhares de horas de recolha, milhares de horas de ensaios, milhares de horas de actuações numa existência de autêntica militância que hoje, aqui e agora se homenageiam.
Perguntei-lhe se gostou do gesto, de decisão unânime que foi tomada pela Câmara Municipal de lhe entregar este galardão. Sorriu com ar de menino, arregalou os olhos, levou as mãos ao peito e disse: “Fiquei muito contente. Muito. Gostei muito. Lá estarei. Muito obrigado”.
Muito obrigado dizemos nós, a si, por tudo o que fez.
Em nome de Marvão,
Bem haja.
Quando me desloquei à sua casa para fazer esta recolha biográfica encontrei-o algo abatido e apreensivo mas bastou o convite para revisitar a sua vida, para lhe iluminar o rosto e encher o olhar de memórias. Transfigurou-se em segundos e parecia outra pessoa, alegre e faladora que se divertia e recriava com os episódios passados.
João Francisco Rosado Nunes Vidal, nasceu a 28 de Fevereiro de 1940, há 69 anos, no Jardim, freguesia de São Salvador da Aramenha. É filho de Manuel Nunes Vidal, canastreiro de profissão, e de Catarina Rosado Tapadinhas, doméstica. Deles herdou a veia artística que já antes se tinha manifestado na família nas figuras do avô paterno e da avó materna, ambos tocadores de harmónica. O pai era acordeonista e a mãe, uma cantadeira famosa. Juntos formaram uma dupla de sucesso que animou os bailes no concelho e na região. Com eles aprendeu a habituar-se às festas, a crescer entre as palmas, a conhecer o poder libertador da dança. Dormiu muitas vezes junto ao palco, enrolado num xaile. Por vezes acordava quando a bailação estava rija e dançava também. Conheceu muita gente, muitos sítios. Tornou-se popular.
Frequentou a escola primária da Portagem, onde hoje funciona a Sociedade Recreativa. Aos 12 anos partiu para a cidade e ingressou no Curso de Formação Geral de Comércio da Escola Comercial de Portalegre.
Quando terminou, o seu primeiro emprego foi no escritório dos “Cafés Guapa”, situados nos Olhos d’Água, propriedade do Sr. José Maria Pires Cardoso. O negócio ia de vento em popa e só o irrecusável convite para trabalhar no Banco Pinto e Sotto Mayor, o fez rumar a Lisboa. Não podendo estar longe da música e da acção, entrou para o coral da Casa do Alentejo que ajudou entretanto a reorganizar.
Anos depois surgiu a oportunidade de regressar e voltou a Portalegre, para a sucursal deste banco na cidade, perto do Café Alentejano, onde desempenhou as funções caixa e fazia de tudo um pouco. O Sr. Vivas da Beirã era cliente e ia lá com frequência depositar dinheiro e tratar de negócios. Como era Provedor da Santa Casa de Marvão e conhecia o gosto que Vidal nutria pela música, cultura e etnografia, falou-lhe na possibilidade de fazer um rancho da Misericórdia. Esta instituição tinha então dois asilos para jovens, um para rapazes (no edifício do Espírito Santo ao lado da Casa do Governador) e outro para raparigas que funcionava na própria sede. Neles estavam hospedados cerca de 60 rapazes e 60 raparigas chegados de todo o país e oriundos de famílias pobres. A ideia do rancho surgiu com o intuito de criar mais uma actividade para ocupar os tempos livres daqueles jovens. As intenções foram as melhores mas o resultado foi revolucionário para a época. Permitir que jovens de sexos diferentes se juntassem e passassem horas a ensaiar e a dançar agarrados não era propriamente do agrado das freiras e muito menos da Madre Saturnina que tudo fazia para não os ver juntos.
Vidal aceitou o convite de forma graciosa e passou a deslocar-se de Portalegre propositadamente para os ensaios. Não só não recebia qualquer tipo de pagamento como teve de fazer investimentos do seu próprio bolso. Comprou então um gravador que ainda hoje conserva, caríssimo para a altura, um luxo só ao alcance do ordenado de um bancário. Foi dos primeiros aparelhos que por aqui apareceram e revelou-se uma ferramenta indispensável para o trabalho de recolha de modas que iniciou então por todo o concelho. Os seus interlocutores de mais idade, aqueles que guardavam os saberes mais antigos, assustavam-se com o aparelho “que guardava a voz lá dentro” e muitas vezes teve de levar o gravador escondido. Fazia esquemas num papel com as danças que “não importavam se eram bonitas ou feias. O que importava era se eram autênticas”. As portas abriram-se-lhe com muita facilidade. A popularidade angariada nas digressões artísticas com os pais quando era criança foi-lhe então muito útil. Reuniu um total de 60 modas sendo algumas delas palacianas, aprendidas por pessoas que trabalharam em casas de pessoas abastadas.
Participou também activamente nos cortejos de oferendas que se realizavam sempre no dia 8 de Setembro, nos quais pessoas e instituições de todo o concelho se deslocavam a Marvão de carroça para levarem produtos que ofereciam à Misericórdia. Era uma manifestação muito importante que envolvia muita gente chegada de toda a parte e oferecia um pouco de tudo o que tinha.
Entretanto, a actividade do rancho que se prolongou por cerca de 3 anos, extinguiu-se quando o asilo para jovens terminou e estes se viram obrigados a regressar às suas terras.
Diz o povo que “sempre que se fecha uma porta, se abre uma janela”. O êxito da actividade inédita que desenvolveu no Rancho da Misericórdia granjeou-lhe uma fama que levou a que o convidassem a fundar um rancho na Boavista, em Portalegre. Nesse então, o “bichinho” do folclore já mandava muito na sua vontade e não pensou duas vezes. Encetou então uma intensa actividade de recolha das modas desse concelho, sobretudo nos Fortios, em São Julião e na Urra. Ali não faltavam pares e vontade. Já com fama de referência da etnografia à escala distrital, chegou a ensaiar quatro vezes por semana, as mais de 80 pessoas divididas em 3 escalões etários.
Esta actividade graciosa e mantida unicamente pelo gosto durou cerca de 4 anos, até ao momento em que saiu do banco e deixou Portalegre. Nesse momento, o rancho da Boavista já estava completamente formado, sedimentado e em plena actividade.
Entrou então para a Câmara de Marvão, numa fase em que tinha saído da presidência o Dr. Machado e entrado o Sr. Carita, num período em que os autarcas não era eleitos mas nomeados pelo Governador Civil. Aí fez de tudo. Recorda-se de um livro enorme onde se registavam as receitas e as despesas, cujo preenchimento era uma das suas incumbências.
Entretanto, em Castelo de Vide havia já um rancho mas que era muito fraquinho e funcionava mal. Decidiu dar uma ajuda e acabou por ficar quase por década e meia. Curiosamente, foi este projecto, o único que não começou de raiz, aquele que lhe deu mais trabalho. Desenvolveu uma intensa recolha etnográfica na vila e em Póvoa e Meadas, uma zona muito rica em modas e tradições, sempre acompanhado do seu inseparável gravador.
O Sr. Carita, sabendo-o conhecedor do concelho e das regiões limítrofes como ninguém, aconselhou o Director-Geral de Turismo a colocá-lo no Posto de Turismo da Fronteira de Galegos que tinha então um movimento extraordinário. Ali trabalhou durante cerca de 12 anos, numa área que o motivava imenso e achava muito estimulante.
Do Rancho de Castelo de Vide saiu para fundar o da Casa do Povo de Santo António das Areias, há cerca de 25 anos atrás. Nesta aldeia existia já um rancho que foi começado pelo Sr. Rui Sequeira que terminou. Decidiu deitar mão ao que restava desse grupo e organizou-o de forma diferente porque “o folclore não é só o que se canta e dança mas também o que se traja”. O rancho é da Casa do Povo porque na altura estas instituições tinham dinheiro para apoiar o folclore. É esse o motivo porque há tantos sob essa tutela espalhados por todo o país.
O rancho arrancou logo com muita gente, perto de 100 pessoas, o que permitiu fazer 3 escalões. Os ensaios, duas vezes por semana, começaram no Grupo Desportivo Arenense. Brilham-lhe os olhos ao recordar as gerações e gerações de arenenses que por lá passaram, sempre com ele como ensaiador. Nesses tempos nunca faltaram músicos para a tocata, como acontece agora. Lembrou o Sr. João Carrilho e o Manuel Rafael Carrilho, o Adelino Marmelo, o Barbas, o Vítor Conchinha (que fez a música da Sr.ª da Estrela partindo das quadras recolhidas por ele), o Abílio Baldeiras…
Fala também com orgulho do Festival de Folclore do concelho de Marvão que organizou pela primeira vez no tempo da presidência do Sargento Paz, ainda com um carácter regional.
Quando nasceu a Rádio “Ninho d’Águias”, de Marvão, durante o boom das rádios piratas em Portugal, divulgou o folclore no programa “De lés-a-Lés”, um dos mais apreciados pelos ouvintes.
Durante todo este tempo, nunca descurou o precioso trabalho de recolha. Só modas de saias tem cerca de 200 e ainda hoje conserva todas as cassetes de gravações desde o início (algumas delas certamente já desmagnetizadas), um espólio riquíssimo que convinha recuperar com urgência e preservar.
Ainda antes da abertura das fronteiras, quando as pessoas já paravam muito menos, o Posto foi encerrado. Entrou então para a secretaria da Escola Básica Integrada Dr. Manuel Magro Machado de onde se viria a reformar.
Decidiu abandonar o “seu” rancho há 3 anos por achar que já não havia verdade etnográfica. “O traje para mim é como se fosse um uniforme. Havia uma falta de respeito muito grande e foi melhor afastar-me”, disse, numa decisão solitária e irreversível. A sua esposa e filha continuam ainda hoje a colaborar em permanência. A princípio sofreu imenso com essa saída mas agora diz que “vai vivendo”. A paixão pelo folclore vai sendo alimentada em tardes e serões a ouvir as centenas de gravações que lhe foram oferecidas por ranchos de todo o país ao longo dos anos.
Delegado da Federação do Folclore Português, entidade encarregue de “separar o trigo do joio” apoiou ainda os ranchos de Nisa; de Vale de Maceiras, no concelho de Fronteira; de Gáfete; de Aldeia da Mata…
Graças a este amor de toda a vida conhece e é conhecido em todo o país que percorreu praticamente na íntegra.
A vida de João Nunes Vidal é uma vida dedicada à causa etnográfica. Milhares de quilómetros percorridos, milhares de horas de recolha, milhares de horas de ensaios, milhares de horas de actuações numa existência de autêntica militância que hoje, aqui e agora se homenageiam.
Perguntei-lhe se gostou do gesto, de decisão unânime que foi tomada pela Câmara Municipal de lhe entregar este galardão. Sorriu com ar de menino, arregalou os olhos, levou as mãos ao peito e disse: “Fiquei muito contente. Muito. Gostei muito. Lá estarei. Muito obrigado”.
Muito obrigado dizemos nós, a si, por tudo o que fez.
Em nome de Marvão,
Bem haja.
2 comentários:
Falar do Sr. Vidal e da sua obra é, só por si, demonstrativo do reconhecimento que deve ser feito às pessoas em vida e é de louvar que a Edilidade tenha tido esta oportunidade de manifestar, com gestos simples , o reconhecimento pela obra da sua vida em prol da Cultura Portuguesa. As homenagens a titulo postumo deixam sempre a sensação de sopas depois de almoço, se é que me faço entender. Daqui vai o meu grande abraço de solidariedade ao amigo e Sr. Vidal, pois possivelmente sou dos que mais compreende o seu esforço, por razões óbvias. Para ti, Pedro, mais uma vez, um grande abraço de agradecimento por tornares possivel dar a conhecer a obra deste Grande defensor da Cultura Popular Portuguesa, missão que te cabe como Vereador da Cultura, mas que, era capaz de apostar, se o cargo fosse desempenhado por outras pessoas eventualmente passaria em branco. Abraço grande para ti, familia e um um cumprimento a todos os leitores deste blog. Bem hajas !!!
excelente trabalho jornalistico pedro e de grande justiça, que alguém da tua competência escreva sobre esse grande senhor, ensaiador, organizador, relações publicas, apresentador de excelência (até poucos anos antes de deixar o rancho,visto que nos ultimos anos em que esteve à frente, já tinha dificuldades nessa competência) João nunes vidal, que durante anos levou bem alto o concelho de marvão; escrevo de conhecimento de causa e agora que passaram tantos anos, apercebo-me perfeitamente da obra que realizou com a colaboração de todos os membros do grupo; é uma figura publica do nosso concelho, sempre muito respeitado no panorama do folclore nacional, onde figura como membro de grande valor. parabéns Senhor vidal, pela merecida homenagem
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