terça-feira, 27 de maio de 2008

Os Homens do Leme




Para mim, o concerto dos Xutos e Pontapés no dia da cidade foi um acontecimento verdadeiramente histórico.

E vejam bem que eu nem estava para ir. Meteu-se-me na cabeça que tinha nessa Sexta-Feira um jantar há muito agendado que afinal é só nesta próxima semana e estava convencido que não dava para ir.

Mas depois, as coisas encaminharam-se e até já estava disposto marcar presença no Estádio Municipal, quando soube que devido ao mau tempo, o espectáculo tinha sido deslocalizado, digamos assim, para o Centro de Artes do Espectáculo que comporta apenas 500 almas. Em função disto, era necessário e urgente conseguir um ingresso e nestas coisas, dá sempre jeito ter alguém conhecido e quando esse alguém é o agente responsável pela vinda dos Xutos a Portalegre, tanto melhor.

Por esta altura, já não é novidade para ninguém que a música para mim é muito mais que sons agradáveis que me entram no ouvido. A música faz parte integrante da minha vida e eu sem música era como um filme sem banda sonora. Há músicas que me remetem imediatamente para momentos da minha vida e não consigo pensar num tempo do meu viver sem pensar no tema que me acompanhava então.

Os Xutos, são os Xutos e eu acho que, por estranho que me pareça agora, só os tinha visto uma vez ao vivo, precisamente nas Carreiras, quando começaram a ser conhecidos, aí há uns bons 20 anos atrás.

Há duas bandas, duas apenas que eu considero como sendo mesmo minhas contemporâneas, por terem nascido durante a minha existência e por eu as ter sempre acompanhado a par e passo, disco a disco: os U2, que vi em Lisboa durante a Zoo TV Tour, quando renasceram e se reinventaram; e os Xutos e Pontapés.

Devo ter ouvido o Circo de Feras umas boas centenas de vezes, numa altura em que não teria certamente um único pêlo não só na barba, mas no corpo todo. Na fase em que o disco saiu, aquilo para mim era o fim do mundo porque o que aqueles gajos me diziam quando metia a rodela de vinil a tocar na minha velhinha aparelhagem “Namco” era tudo para mim. Ainda hoje tenho em mente o line-up, cada acorde, cada sílaba e cada respiração, cada poema e cada significado. Os Xutos ficaram sempre e para sempre.

Depois do “88”, não estivemos muito mais de acordo, muito menos com alguns êxitos mais recentes como a música da “Tentação” e o “Ai se ele cai”, mas aquela pinta de gajos porreiros, de “Rolling Stones” cá do burgo, sempre me cativou.

Soube que o concerto ia ser meio acústico, dadas as condições da sala, mas nem eu sabia bem para o que ia.

Para já, pareceu-me logo que a transferência de um concerto de Dia da Cidade, gratuito e aberto a toda a população, de um estádio para uma sala muito mais pequena, ia ser uma medida extremamente anti-popular. A malta estava toda com a “pica” de ir curtir para o relvado e de repente, bateu com o nariz na porta, o que não deve ter sido nada agradável, mas para mim, e permitam-me que seja só um pouquinho egoísta, foi mesmo muito bestial.

Quando entrei na sala, ia-me dando uma coisa ruim. A média de idades não deveria ultrapassar os 14 ou 15 anos e aquilo parecia um ninho de adolescentes. Era só putos, meu! Até me passei! Enquanto me encaminhava para o lugar, ainda olhei em redor para ver se reconhecia algum rosto familiar, assim mais da minha geração e por sorte calhou-me um bem ao meu lado, o da minha querida amiga e colega de tempo de Liceu, Cláudia Azedo. E eu disse-lhe, “já vistes bem? Estamos ultra-cotas! Isto é só pardalada, valha-me Deus!”. Mas a coisa andou e aconteceu e o que mais me espantou de tudo foi ver a forma como esta rapaziada que se fartou de pedir autógrafos a uma actriz dos Morangos com Açúcar que estava ali mesmo ao lado, se comportou depois durante o concerto. Aderiram todos de forma massiva, aos pulos e gritos, acompanhando as letras todas, transformando o CAEP numa verdadeira celebração do Rock’n’Roll. Uma festa!!!

Os Xutos entraram de mansinho e pareceu-me que lhes custou passar de um concerto “em grande” para uma sala mais pequena. Adoptaram, de facto, o formato meio acústico / meio elétrico e a coisa correu às mil maravilhas.

É um cena do caraças, o dar de caras com estes bacanos que foram e ainda são hoje, autênticos heróis para mim. Ver o Tim (tão gordo), o Zé Pedro (tão calminho e tão sóbrio), o João Cabeleira (ainda e sempre no outro mundo), o Gui (bem velhote) e essa máquina de guerra chamada Kalu, é sempre uma emoção enorme. Aquilo contagia, pá! Eu estava capaz de estar a vida inteira a ver aquele homem a tocar bateria porque fâ-lo com uma recreação e uma paixão tamanha que aquilo é lindo de se ver. Ele desfruta de cada batida como se fosse a última e isso é tão bonito. Um verdadeiro animal de palco, um rocker sagrado.

Quando dou por mim de caras àquela pandilha, é impossível resistir, não bater o pé e cantar aquelas letras que tanto me ensinaram e das quais já nem eu sabia que ainda me recordava. Quando canto com eles e saem das nossas bocas as mesmas palavras, esqueço-me que sou pai e marido e Vice-Presidente de uma Câmara e Funcionário das Finanças. Quando canto e sorrio com eles, sou apenas o Pedro e volto na minha mente ao meu quarto de adolescente, gritando contra as paredes tudo aquilo que eu queria e não percebia e fazia por entender.

Os Xutos são o melhor manual de sobrevivência adolescente escrito em língua portuguesa e é por isso que eles são para esta geração de Moranguitos, aquilo que foram para mim também. Só que na altura, quando tudo aquilo começou, eu estava lá.

O “78/82”, o “Cerco”, o “Circo de Feras” (já em pleno boom) e o “88” (tinha eu 15 anos!), as suas obras lapidares e imaculadas foram pilares elementares da minha puberdade e entrada na idade adulta. Um compêndio de libertação e revolta que ecoava de Lisboa para os jovens de todo o país.

Ainda o tentei desencaminhar, ainda lhe liguei mas não consegui levar comigo o meu Bananita, meu coleguinha que sempre foi também tão fã quanto eu. Ainda me lembro quando fomos à papelaria do Sr. Roque, na Carreira de Cima em Castelo de Vide, andávamos prái no 8º ano, comprar a cassete do “7º Single” onde vinha “A Casinha”, o “Sou bom” e “A minha aventura homossexual com o General Custer”, um instrumental western avacalhado que nos punha os cabelos em pé.

Os Xutos são intemporais e provaram-no no concerto de hoje. Quando cruzamos uma vez os braços e fazemos o sinal do “x” não precisamos de andar assim a vida inteira, mas o mais certo é que a marca nunca mais saia.

O som estava bom, a iluminação idem, o palco simples e sóbrio, o cenário aconchegante, enfim, à maneira.

Dos momentos altos, eu guardo todos os do “Circo” (“Esta Cidade”, “N’América”, “Vida Malvada”, “Circo de Feras”); o “Á minha maneira” (que fez rebentar a sala) e as “Torres da Cinciberlândia” do “88”; o “Homem do Leme” do “Cerco” e o “Remar, Remar”, o hino eterno.

Falhou aquela que é uma das minhas favoritas e que tu pediste em sms, Miguel, mas o “Enquanto a noite caiu” não passou mesmo por ali.

Fazendo as contas, do que eu me vou lembrar daqui a uns anos é da reacção avassaladora da chavalada, aos pulos no 1º balcão, ao ponto de eu estar mesmo a ver que ainda haviam de saltar cá para baixo.

Só para vocês verem a transversalidade da coisa, o meu companheiro de cadeira do lado direito, devia ter para aí uns 6 anos, sabia as músicas quase todas e fartou-se de tocar bateria com as mãos no ar. Eu com 34, ele prái com 5, e a dançarmos os dois lado a lado com o mesmo som. No final, o Kalu ofereceu-lhe as baquetes da bateria e o miúdo passou-se completamente.

Uma festa, uma enorme e intensa festa, foi o que foi!

Epá, f***-se! Valeu mesmo, mesmo, mesmo, muito a pensa.

“Aaaaaaaaaaaaaaaiiiiiiiiiiiiii a minha vida!”


Sendo o Dia da Cidade e sendo este um dos hinos de rebelião mais impressionantes que os senhores nos ensinaram… “Esta cidade”...






Foi um concerto muito bem frequentado! Senhoras e senhores, por lá encontrei o Jel, o maior humorista português vivo. Um génio! Nem Gatos Fedorentos, nem Herman Josés, nem a merda dos Contemporâneos, nada disso! Mesmo nada disso! Vejam a Sic Radical, vejam “A Luta continua” e vejam o Jel em actuação. Memorável. E eu disse-lhe: “Anda, meu maluco. Estás à espera do quê? Vens para um concerto dos Xutos, o mais certo é seres reconhecido!”. E não é que o rapaz foi ultra-simpático, até me deu o número do telemóvel e ficou já apalavrada uma vinda dos Kalashnikov (a sua banda de hardcore) a Marvão, talvez na festa de Natal da Câmara. Eheh, eh! Até o perú saltava pela janela! Era uma boa maneira de fechar a última organizada por mim…



Disseram-me que alguém o ouviu contar ao Zé Pedro que a personagem que ele faz de drogado vai andar no Rock In Rio a ver da Amy Winehouse! Digam lá se isto não é de génio? Só desta cabeça! Este gajo é maior que o Papa!

Para fechar tudo com chave de ouro, ainda andei metido lá pelo backstage, pela mão da simpática Susaninha, que me encaminhou ao Eduardo, um roadie que é amigo do meu amigo Luís Bugalhão e me está, a sugestão deste último, a ilustrar a história do Beltrão “Cabeça de Limão”. Lembram-se? Pode ser que haja para aí novidades. Como diz o Bonga, “amigo do amigo, amigo é!” e é bem verdade. Pode ser que sim, pode ser que sim. A ver vamos.

Ai mãe, fui-me deitar tão regaladinho que parecia que me tinha saído a taluda.

Que belo serão!

Viva as Festas da Cidade! Viva!
Viva o Senhor Presidente Mata Cáceres e toda a sua Vereação! Viva!
Viva o CAEP! Viva!
Viva os Xutos e Pontapés! Viva!
Viva a Boa Gente de Portalegre! Viva!
Viva a minha cidade e o Liceu onde estudei! Viva!
Viva a árvore do Plátano e a Loja do Chinês! Viva!
Viva o Quiosque do Rossio e o Jardim da Corredoura! Viva!
Viva a Barraca do Lino que estava lá á porta do CAEP a vender cachorros! Viva!
Viva o Parque de Estacionamento aberto toda a noite! Viva!
Viva eu e viva tu e viva todos quantos estamos! Viva!

4 comentários:

VeraMaria disse...

Ora aqui está o grande concerto dos Xutos o qual não consegui bilhete para entrar e ver! Fiquei com imensa pena mas não havia nada a fazer!
Deixando as coisas tristes para mim, felizes para si porque conseguiu entrar. Venho por aqui falar por causa do nosso grupo, grande grupo para falar a verdade, de teatro temos que resolver o 'problema' do nome.
Bom não querendo estar a empatar mais o seu tempo assim me despeço.

'Inês Pereira 2'

Pedro Sobreiro (Tio Sabi) disse...

Ah Verinha, deixa lá! Fica para a próxima. Eles vão tocar até aos 80 e vão regressar, certamente.

Quanto ao nosso Grupo de Teatro, concordo contigo. Voltaram a surpreender-me. Estão a ficar cada vez melhores. Acredita que são um orgulho para mim. Todos!

Quanto ao nome, acho que faz muita falta e não queria ser eu o responsável. Foi por isso que passei a bola para vocês. Acredita que o nome traz logo outra personalidade. Eu acredito na vossa criatividade.

Bj

Laura disse...

Olá!
Fico contente de pelos menos aqui no teu blog conseguir ver aquilo que não consegui ver ao vivo.
Sei que o mau tempo é que foi causa disto, mas não concordo com o sítio escolhido para o concerto. Um concerto de Xutos e Pontapés só com 500 lugares isso é quase a gozar, por isso tu dizeres que era só putos, eles é que conseguiram estar em fila de espera horas a fio, o resto da malta trabalha.
A familia Gavancha ficou muito desgostosa pois concertos de Xutos não são para faltar.
Laura Miranda

Garraio disse...

Há algum tempo que ando pra colocar um post, no forum, que conduza a uma reflexão sobre o modelo de gestão municipal que se deveria aplicar em Marvão.

Vem agora a talho de foice o comentário da Vera, a Inês "continuação" da minha Inês.
Porque, gestão municipal adequada às nossas características, significa, entre outras coisas, obviamente, criar este tipo de actividades, sejam elas destinadas a jovens, ou a adultos, ou a crianças...

Este grupo de teatro não tem nome. Não tem nome, à frente. Mas tem um nome por detrás. Esse nome é Pedro Sobreiro e manifesta-se na sua invulgar capacidade para apostar nas pessoas, para apostar nas crianças, para apostar nos jovens. Tenho dúvidas, para não dizer certezas, de que não anda ninguém por aqui à volta, que pudesse assinar um trabalho tão positivo.

Estás orgulhoso deste grupo de teatro, Pedro. E tens razão pra estares. Só que esse orgulho já extrapolou, para um grande grupo de pessoas, e isso é algo sensacional, sobretudo nesta difícil conjuntura que actualmente vivemos, na qual, até Maio teima em ser cinzento e chorão.

Continua, rapaz, tu é que que estás no caminho certo.


(Ah... e não te preocupes com esse rafeiros que tentam atrapalhar as tuas corridas matinais. Não achas que são pequenos e insignificantes...? cá pra mim sim)