quinta-feira, 26 de novembro de 2009

O IVA e EU


ATENÇÃO!!! INÉDITO!!! Suplemento de economia


Nota: Estimados leitores, a gerência pede a vossa melhor atenção para a singela prosa que se segue. Advertimos que pode parecer extremamente aborrecida a princípio mas todo aquele ou aquela que se aventurar pelas suas linhas poderá estar certo(a) que no final verá o seu esforço recompensado, tal será o manancial de informação fiscal absorvido…


Queridos amiguinhos…

Recordar-se-ão certamente da minha crónica acerca do Pingo Doce de Castelo de Vide. Não foi assim há tanto tempo, pois não? Eu concordo convosco. Mas a verdade é que apesar de terem passado poucos dias, já andei para lá a caminhar hoje outra vez. Não que tenha gasto tudo o que de lá trouxe na última romaria consumista mas nesta humilde guarita a que chamo casa já faltava muita coisa que faz falta todos os dias como os Ice Teas e a fruta de qualidade, de forma que não tive alternativa.

A minha Senhora voltou a estar ocupada com a Associação de Pais do Concelho (A idade tudo traz…), e não tive outro remédio senão criar um programinha alternativo de fim de tarde chuvosa para mim e para a pequena.

Foi um gosto, como sempre, e uma limpeza também. Em pouco mais de hora e meia, fiz um rombo no orçamento que mais parecia o Túnel do Marquês, equivalente a duas notas de euros das verdes, que são simultaneamente as mais difíceis de apanhar (porque será?).

Chegado a casa, depois de saciado com um excelso mas nada exuberante, apenas competente, repasto criado a partir das iguarias recém-adquiridas, recostei-me na cadeira e pus-me a pensar na vida, tal e qual como já faziam os nossos antepassados que calcorrearam estas margens do Sever há muitos milhares de anos, quando se aconchegavam na gruta a olhar o fogo após terem barbeado a presa de caça morta à escassas horas.

Em cima da mesa… o talão da compras. Que grande… Mais fino que o papel higiénico mas com uma dimensão considerável que denunciava o estrago. Concluo que nada foi muito caro embora, as coisas sejam tantas que grão a grão, encheu o Pingo Doce o papo.

O detalhe que me prendeu realmente a atenção foi o IVA e as suas diferentes taxas. Um pormenor que ajuda a marcar toda a diferença e de repente, me deu vontade de mergulhar nesta temática e partilhá-la convosco…

MAS QUE RAIO É ISTO DO IVA?!?!?!?!? Perguntam vocês e com razão. E o Tio Sabi, numa verdadeira iniciativa de Serviço Público não remunerado e fora-de-horas, esmiúça a temática para a pequenada, dos que ainda andam de cueiros por esses bancos de liceu, aos que já gostam de perder a cabeça nos meandros da economia doméstica.

Olhem bem p’ra mim armado em Medina Carreira. Já tenho um olho fechado…

O IVA… é uma cena bem real da qual todos gostam de falar mas que quase ninguém sabe ao certo ao que vai.

O IVA, que quer dizer Imposto sobre o Valor Acrescentado, é uma forma que os Estados modernos inventaram para sacar dinheiro ao pessoal. A ideia é básica e funciona na perfeição: na sociedade actual, na qual o capitalismo é regra e o consumo a palavra de ordem, a malta precisa de comprar. Com a especialização, cada um faz aquilo que pode e o resto compra e os Estados, que não são nada parvos, pensaram: “epá… se cada vez que a malta compra qualquer coisa tiver de contribuir com uns pózinhos-extra, isto é capaz de dar um monte de dinheiro…”. Se assim o pensaram, melhor o fizeram e assim se instalou o IVA entre nós.

O IVA passou a estar em todo o lado, como o Nosso Senhor. Tirando as raríssimas isenções, o IVA espreita em cada esquina e… não perdoa.

Os especialistas dizem que o IVA é o imposto perfeito porque tem uma mecânica infalível e complexa feita de liquidações e deduções. Um agente económico que não esteja isento tem uma relação de “balança” com o IVA. Ele liquida o IVA aos contribuintes (por exemplo num café ou num jornal) mas pode deduzir o IVA que pagou no âmbito da sua actividade. Se liquidou mais do que deduziu, deve entregá-lo ao Estado. Se tem mais a deduzir, fica com um crédito. Engenhoso, não é?

E não me amolem que até agora isto até nem foi difícil de perceber e só por terem lido até aqui já podem fazer um figurão quando ouvirem um papagaio qualquer dizer detrás do balcão: “Ainda este mês PAGUEI não sei quanto de IVA!!!”. É aqui que vocês entram e deixam toda a gente de boca aberta quando respondem em voz baixa, em jeito de conselho, “o IVA não se paga, mestre… o IVA entrega-se… Esse dinheiro não era seu... era dos seus clientes!”. Muito nível! Escusado será dizer que sempre que um caramelo destes vos vender alguma coisa e não registar na respectiva máquina, não só está a roubar o Estado mas também vos está a meter a mão no bolso a vocês.

Ainda assim… não era bem aqui que eu queria chegar. Digamos que este intróito serve apenas para vos conduzir à verdadeira questão de hoje, das compras e do Pingo Doce: a das diferentes taxas do IVA.

DIFERENTES TAXAS?!?!?! MAS NÃO É SÓ UMA?!?!!?

NÃO! E não porque o Estado que é assim uma espécie de velhinho gigante com umas enormes barbas brancas que vive semi-desnudado numa nuvem como o Zeus na mitologia grega, também não é parvo. Quando inventou o IVA pensou logo… “epá, se há tantos bens, de valor tão diferente… não podem todos levar com o mesmo IVA. Há que fazer taxas diferentes”.

Assim, para os bens que fazem muita falta à vida do pessoal, bens de primeira necessidade pensou-se uma taxa mais fraquinha que esta gente também tem escrúpulos… isto não é assim à maluca. Esses bens em Portugal agora levam com 5% de IVA ,o que traduzido significa que o contribuintezinho paga o valor real do bem acrescido de 5% desse valor. É o “IVA DOS PEQUENINOS”.

Noutro extrema há uma taxa máxima (que vai mudando consoante haja ou não eleições) que é mesmo para aqueles bens “armados em finos” que é como quem diz: “Ai queres luxos?!?!?!? Então PIMBA! Levas com mais 20% na tola que até apitas”. Este IVA é o que eu chamo de “IVA A DOER”.

“E só há estes 2 IVAS?”, perguntam vocês e bem, que é sinal que estão com atenção. “Não! Não há só estes dois… Há ainda o IVA que eu chamo de “IVA DA COMPAIXÃO” que é para aqueles bens que já são um bocadinho para o finório mas ainda assim são de alguma necessidade. Esses escapam assim mesmo à tabela com 12%.

É nesta fase da análise, chamemos-lhe assim, que eu vos pergunto se não acham que isto até nem está mal pensado? Não está de facto. O que está mal e me fez escrever esta cena é que as taxas do IVA, as que vêm na parte esquerda dos talões de compras, antes de cada produto, ESTÃO TODAS TROCADAS, CARAÇAS! COMO É QUE É IMPOSSÍVEL?

Senão vejamos, queridos e cultíssimos leitores, eminências pardas na questão fiscal e verdadeiras aves raras do IVA. Paga-se 5% no arroz, no atum em lata, no pãozinho, no peixinho, na carninha de porco (incluindo nas vísceras, iscas de fígado e rins incluídos). Pagam 5% o polvo e o peru, o abacaxi, a bananinha, os bróculos (blaaargh) e a cenoura, as clementinas, os cogumelos e as laranjas. 5% pagam o tomate, a uva e o limão. Vai bem! Mas acham que as minhas batatinhas fritas “Lays artesanais com molho de cogumelos”, um verdadeiro luxo, uma cena gourmet, paguem apenas 5%? É um ultraje, uma ofensa a produto de requinte. Já nem me sabem tão bem…

E que dizer da minha “Água das Pedras light com sabor a framboesa”? Um verdadeiro requinte pós-jantar que me fazia sentir como a gaja do reclame dos Ferrero Rocher? Pagar 5% só por ser uma água??? Opááááá… Não me amolem! Estes gajos estão-me a estragar os luxos!

Isto para já não falar nos iogurtes magros “Corpos Danone Light com morangos e Kiwi”, nos Danoninhos, nos Bongos, nas Frizes, nos prazeres terrenos de um pobre mortal, todos eles taxados a 5%. Porquê Deus meu, porquê?????? Só para nos inferiorizar?!?!? Conseguiram…

Passemos aos 12% e entramos num domínio bizarro. Atentemos: cá em casa, quando vamos às compras para o pequeno almoço, compramos sempre fiambre e queijo. Cenas básicas para a gente comer de manhã. O fiambre paga 12%. O queijo paga 5%. Porquê? Porque um vem do porco e o outro vem da vaca? Mas não são ambos para o pequeno almoço?!?!? Vá lá alguém perceber isto…

12% pagam as azeitonas, os cogumelos laminados, o feijão, o grão, o tomate… E eu pergunto: “Ai estes não são bens essenciais? Então o Estado come o quê às refeições?”.

12% pagam as polpas de manga e maracujá e o rolinho de salsicha que a minha filha comeu logo lá dentro do Pingo Doce porque estava cheia de fome… mas nós guardámos o papelinho e pagámos na caixa. Ainda há gente honesta, está bem?

12% pagam os rissóis, o esparregado e a lasanha congelada para quando a gente tem de comer à pressa e não temos nada pronto e os nossos sogros se esqueceram de nos convidar para almoçar. Não faz mal… aquilo também não é nenhuma obrigação… é quando calha… nós sabemos…

Agora digam-me com toda a sinceridade: “acham bem que o vinho, O VINHO, DEUS MEU”, o néctar que os Deuses nos ensinaram a extrair da uva sagrada, esse bem primordial do qual o nosso avozinho Salazar até dizia que ao ser consumido dava de comer a não-sei-quantos milhões de portugueses, pague 12%??? O VINHO NÃO É ESSENCIAL?!?!? Estou sem palavras. Um produto tão natural… É… injusto… no mínimo.

No domínio dos 20% estão os chocolates. Sim, os chocolates pagam 20%. E os pretinhos que andam lá a apanhar os grãozinhos ao calor, para receberem uma miséria, que vivem daquilo, são o quê? Turistas? Bem…

A bolachas de água e sal… 20%. AS BOLACHAS DE ÁGUA E SAL?!?!?! A água pura é taxada em 5%. Se é em bolacha… 20%. Ai não são feitas de água também? Ai eu… ÁGUA e sal!

O camarão… 20%. O camarão, o camarãozinho do meu coração, que é um autêntico peixinho… 20%. O peixe paga 5%. O camarão… 20%. Para o Estado, o camarão deve de ser algum mamífero, com certeza…

Uma pá para o lixo que eu comprei por 1 euro e 49 cêntimos, que é essencial, repito, ESSENCIAL para acabar com o pó na minha casinha, paga 20% de IVA. Está certo! Limpar o pó é um luxo!

Um saco preto para trazer as compras paga 20%. Luxo! E se eu não o comprasse trazia as compra onde? No cú?

E para terminar que com esta já não posso mais e fico arreado… uma caixinha de 24 minizinhas Sagres, daquelas de 25 cl que sempre trazem mais um bocadinho, aquelas da Rita Andrade, tão fresquinhas, tão puras, só com água e malte e cereais e coisinhas saudáveis que fazem alegria… 20% ó Mê Deus!

Acabo de crer que não há justiça no mundo.

O IVA vai dar cabo de mim!



PS: Vamos fazer um “suponhamos”. Assuponhamos o seguinte: esta espelunca, este blogue, esta coisa já recebeu mais de 180 000 visitas gratuitas. Se cada uma custasse 1 euro, valor que para além de me parecer absolutamente justo, me parece até miserável, eu já tinha dinheiro para pagar a minha casinha toda, comprar uma Vespa 125cc e dar uma volta ao mundo. E… atendendo a que a taxa do IVA não poderia ser outra que a de… 20%, obviamente, isto significa que os Estado poderia ter ganho 36 000 euros que antes perdeu.
OUVIRAM, SENHORES DO SIS? Bora lá meter esta cena com pagamento obrigatório e fazer uma bruta faena!

Ai acham mal?!?!? E estar aqui a escrever estas coisas durante horas, sozinho, agarrado ao computador, a dar cabo dos meus olhinhos, não merece pagamento? Egoístas…

PS1: Não quero deixar passar a ocasião sem mandar um abraço ao Pedro, digníssimo Director do Pingo Doce de Castelo de Vide que hoje se aproximou de mim para me agradecer as palavras que escrevi sobre a estrutura que tão bem dirige. Um gesto bonito que me tocou. Disse-lhe que nós, os portugueses, estamos habituados a dizer mal e que raramente elogiamos o que está bem. Já vai sendo altura de mudar e eu, sempre que posso penso que faço a minha parte. Depois fiquei a pensar nisso. Da outra vez, limitei-me a publicar o texto no blogue mas desta vez fui mais longe… via e-mail direitinho para os recursos humanos da casa-mãe (Grupo Jerónimo Martins). Pode ser que surta efeito. Oxalá! Bem merecem!

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Deste IVA gosto eu... Taxada a 100%

5 comentários:

Laura disse...

Bem,o que já me ri com este post!!!hihihi
Uma verdadeira descrição do Sr.Iva, espectácular, pode ser que assim muita gente chegue a perceber o iva.
Adorei!!!!

manel disse...

Pois é, filho, basicamente até concordo contigo sobre este imposto "fabricado" pela senhora Tatcher e que a Europa adoptou como forma moderna de sacar dinheirinho.
Lembro-me até (problemas da idade) de, quando da introdução do IVA cá no burgo, logo ter havido nalgumas grandes empresas da capital, incluindo públicas, um curso de formação - estou a falar a sério, não é a brincar - ministrado por peritos italianos (tinha de ser) sobre fuga ao IVA. Pagos a peso de ouro e nalguns casos com dinheiro de EP's.
E também conheço outros, mais domésticos, ministrados por altas individualidades políticas e não só, algumas bem conhecidas de nós
Mas o que mais me aflige é outra coisa, e nisto, vais-me desculpar, tenho de discordar veementemente de ti.
É que em muitos casos o IVA não é um imposto retido e pago ao Estado pelas empresas, como explicas, pois a prática é substancialmente diferente da teoria; é, isso sim, um roubo, um saque cometido pelo Estado contra as empresas, pois estas são obrigadas a pagar o IVA, não quando cobram, ou seja quando emitem o recibo, mas sim quando emitem a factura. E se o cliente é o Estado, sabemos que na maioria dos casos paga a perder de vista.
Digo-te que no meu como em muitos casos que conheço, andamos permanentemente aflitos pq somos obrigados - ameaçados, forçados, violentados - a pagar um IVA que não recebemos mas temos de arranjar o dinheiro para pagar ao Estado, o mesmo dinheiro que o Estado nos deve - mas não deixa fazer encontro de contas.
E também não me paga se eu não emitir primeiro a factura, pois não aceita uma nota de débito para emitir a ordem de pagamento, por forma a que eu pudesse emitir a factura juntamente com o recibo, ou seja, a deixar de ter de pagar o IVA adiantado (e, no meu caso, numa empresa com menos de três anos tenho factura de 700 contos emitidas desde Maio de 2007 ao Estado, mas pagamento nem vê-lo, no entanto tenho de pagar religiosamente esse e muitos outros IVAs até ao dia em que rebente porque já paguei tanto IVA sem receber o dinheiro que o Estado de mede que se me acaba o dinheiro; e quando isso acontecer, pensas que o estado me paga? Não, de imediato me apreende carros e casas e desbarata-os em hastas públicas).
(cont)

manel disse...

(cont)

Ou seja, não só não recebemos o justo pecúlio sobre os bens que fornecemos ou os serviços que prestámos (o que já nos custou trabalho e dinheiro), como ainda temos de pagar ao caloteiro o imposto que ele nos cobra porque lhe vendemos esse bem ou serviço. Deste modo quanto mais produzimos, mais nos enterramos até ao limite em que falimos. Por incrível que pareça, hoje se o Estado me quiser comprar muita coisa, eu recuso-me a vender, porque tenho a certeza de que isso me arruinará por completo, pois vou ser obrigado a pagar mais IVA sem receber nada, de modo que o dinheiro depois já nem chega para os salários nem para a Segurança Social.
Este drama do IVA, como sabes, está a destruir as empresas, especialmente as pequenas empresas que não têm camiões que fazem parar o País, como aconteceu o ano passado, e com isso passou a haver dois regimes de pagamento de IVA: um para quem tem camiões e outra para quem não tem, ou seja, as empresas de camionagem passaram a pagar o IVA com a emissão do recibo, e os outros tótós todos pagamos o IVA com a emissão da factura; resta saber se para pagarmos o que não recebemos vamos ter de deixar de pagar os salários, a segurança social ou os fornecedores.
Claro que a Câmara de Monforte, p.e, este mês ficou com 8 mil euros depois de pagar os salários, de modo que mais uma vez não pagou nada do que deve aos fornecedores, ou seja, áqueles que têm de pagar o IVA sobre o que não recebem.
Já agora e como eminente figura do aparelho do fisco a que acabas de regressar, atendendo à nossa amizade sempre aproveito para te fazer uma consultazita aqui mesmo, que ninguém nos ouve.
Achas que se eu comprar um camião consigo passar a pagar o IVA só com a emissão do recibo? É que assim posso salvar a empresa de ser "bandida", tal como o gerente…. E como há por aí uns camiõezitos baratos, sempre pode compensar o investimento. E já agora, tem mesmo de ser camião ou se for uma camioneta também já serve? E pode ser avariada ou tem mesmo de estar a andar?
Fico à espera do teu conselho amigo.
Abracinhos.

Sónia disse...

Dei-te os parabéns pessoalmente!!!
Já o voltei a ler e a rir...
Dos nossos clientes que não percebe tb não lê o blogue por isso não chegam a aprender heheheh

Gi caldeira disse...

Boa exposição do IVA.

Só podia vir de um homem das finanças.

É bem verdade que quem nao emite facturas ou procede a registo das importancias recebidas, nao procede a entrega do dito...

Mas quem as emite, e não as recebe atenpadamente, está tramado.

Paga o que não recebeu...

É imposto limpinho, só para o estado.

Mas nós, vulgos pagantes, pagamos ...pagamos... pagamos...


Tudo seria bem diferente se o IVA fosse cobrado com a emissão do recibo.