domingo, 24 de maio de 2009

Rumo a Mértola



Na passada quinta-feira, dia 21 de Maio, Mértola inaugurou oficialmente o seu V festival islâmico. Entendendo que na área da programação cultural é fundamental o contacto com experiências análogas para poder estabelecer termos comparativos, colher boas práticas e sobretudo, fomentar a ligação a novos artesãos, artistas, animadores, conferencistas e organizadores; desloquei-me a esta vila alentejana acompanhado da equipa que me apoia directamente na organização do Al Mossassa, a festa islâmica de Marvão que celebra as suas raízes e o momento da fundação.

Foi muito assim que consegui rechear e dar credibilidade à nossa festa em anos anteriores, quando começou praticamente do zero, visitando a minhas expensas as feiras de Silves, Óbidos e outros mercados de referência. Fazendo trabalho de campo, de pesquisa, de fundo…

A viagem é longa, de mais de 3 horas, e o Alentejo daquela área pouco ou nada tem a ver com o nosso, mas parece-me que aqui a excentricidade é nossa. Na verdade, aquelas terras secas, áridas, quase desertas e inóspitas correspondem muito mais à imagem que a generalidade das pessoas tem do Alentejo do que a nossa região verde, fértil, minifundiária e repleta de declives; de transição com a Beira Baixa e muito marcada pelo rio Tejo e o seu afluente Sever.

Viajar, como sempre, e neste caso que não foi excepção, permitiu-me tirar algumas conclusões…



A terra

Em primeiro lugar, permitiu-me constatar uma vez mais, o extraordinário potencial turístico de Marvão. Por exclusão de partes, apercebemo-nos, comparando, de como somos fortes e singulares.

A vila de Mértola goza de há uns anos a esta parte, de um prestígio científico, cultural e turístico que não me parece (passo a imodéstia) ter correspondência real.

Portugal é assim… às vezes basta o trabalho de um homem, neste caso o do Prof. Cláudio Torres, mas poderia citar outro caso emblemático no Alentejo, o da ligação entre Montemor-o-Novo e o bailarino Rui Horta; para captar fundos, as atenções dos centros de decisão e assim meter uma localidade no mapa e frente às luzes da ribalta.

Reconheço em absoluto a importância estratégia do trabalho de décadas do historiador nesta localidade, esforço esse que teve o mérito de a transportar para outra divisão, mas a verdade é que o turista encontra à chegada uma vila pacata e com graves lacunas que a impedem de poder ser considerada como um destino turístico de referência: faltam os espaços para estacionamento (tivemos sorte de chegar cedo e no primeiro dia); faltam estruturas de apoio e segurança (escadarias íngremes sem corrimão… uma ravina de muitos metros sem qualquer tipo de guarda junto à rotunda da entrada); há muita casa fechada e com sinais evidentes de degradação no centro; alguns painéis de informação não estão em condições e nalguns casos sobra apenas a estrutura porque as informações já desapareceram há muito; e falta sobretudo aproveitar a grande mais-valia em termos turísticos, o rio Guadiana, que lhe deu fama enquanto último porto navegável a partir do mar e se encontra sujo e está subaproveitado.



Entre o carro e o rio... apenas uma ravina de muitos metros

Casas degradadas...

Telhados ruídos...
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Comércios fechados...

e uma pensão ao lado de uma oficina...

vale, ao menos, o Guadiana...
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Chocou-me a falta de preparação dos recursos humanos com quem lidámos e cito apenas dois casos:

Como chegámos com tempo e ainda faltava 1 hora para a abertura do Souk, decidimos conhecer a viagem de barco que permitia ter uma panorâmica geral da vila e da sua envolvente. Chegados ao cais de embarque, nem informação, nem informador, nem barqueiro. Procurámos o telefone do turismo no folheto e pasme-se… nada! Tentámos via internet e o número nem sequer chamava. Chegou entretanto o responsável pelo barco a quem me dirigi de forma educada no sentido de obter algumas informações. A muito custo, lá me foi respondendo assim sempre de esguelha e sem parar a sua marcha em direcção ao rio, dizendo-me que “não tinha nada a ver com bilhetes”, que “só lhe pagavam para andar com o barco” e que “os bilhetes vendem-se lá em cima”. Bom… a escadaria até ao ponto de informações era íngreme mas percebi que não tinha outra solução, de forma que fiz-me à estrada. Depois de galgar sei lá quantos degraus, dou com o ponto de apoio onde uma menina me responde com ar espantado que os bilhetes se vendiam junto ao barco!!!

O empregado de mesa do jantar também foi engraçado. O rapaz não parecia ser novato, de todo, mas o jeitinho que tem para aquilo é tanto como o meu para pilotar biplanos. Tal e qual. O restaurante era central, os preços em conta, o forte eram os grelhados e pareceu-me bem mas este jovem era um poço de surpresas. Perguntei-lhe: “Para acompanhar as carnes na brasa talvez um tinto… tem assim algum da casa que tenha bom preço e seja da região?”.
Resposta: “Não. Aqui só temos a carta de vinhos”.
“Traga-ma então, por favor, para podermos escolher. Olhe… talvez um Monsaraz que é próximo e não está caro…”.
Veio a refeição, comemos e de vinho… nada. Já nos finalmentes, quisemos ainda assim saber o que se tinha passado: “olhe desculpe… então e o vinho?”.
“Ah… não há!”.
“Então… mas não há e o senhor não nos disse nada?”.
“Pois… mas deixe que eu trago-lhe outro. Tenho aqui um da casa que está barato e é ao jarro…”.
Ainda cheguei a pensar que fosse para os apanhados mas pelos vistos era a sério.
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O "Vendaval"...

O bonito palco num aprazível espaço para espectáculos

A suposta informação turística que... não está. À volta... tudo seco. Ai... que saudades dos jardins floridos de Marvão... das ruas limpinhas... das casas branquinhas...



Mais uma escadaria sem qualquer tipo de protecção e ao fundo, o Hotel-Museu em construção

A magnífica porta de entrada do Souk, de contraplacado como a nossa mas muito mais trabalhada e com um tratamento especial a nível da tinta. Aqui há que aprender com quem sabe...

O festival

Quanto ao festival, que foi o assunto que verdadeiramente ali nos levou, devo dizer que também aí as expectativas foram altas demais. As ruas eram exíguas, as bancas eram curtas, os produtos expostos eram muito repetidos e faltava uma orientação, um fio condutor…
Em Marvão temos o cuidado de seleccionar com critério posto a posto; privilegiamos aqueles que trabalham ao vivo e mostram a sua arte; temos a preocupação de ir variando os têxteis com as loiças, as pratas com os brinquedos, as madeiras com a bijutaria e de ter zonas específicas, por exemplo para as crianças e para a alimentação; temos o cuidado de apertar com os expositores para se vestirem a rigor e para serem pontuais. Nada disso vimos ali. Antes vi pessoas de jeans a venderem velharias e mel, e electricistas a fazerem montagens em cima da hora da abertura.

É certo que também tivemos oportunidade de conhecer e de convidar a Marvão alguns postos muito interessantes que oxalá consigam mesmo cá estar… gostava muito de poder trazer a espanholita das tatuagens temporárias Hena; a vistosa banca das tâmaras e frutos secos (quase certa!) e a impressionante exposição de tapetes feitos à mão, bem encaminhada após a conversa que tive com o presidente da associação de artesãos que os elaboram. A ver vamos…

Em termos de animação também me parece que levamos a melhor. Ali estavam como animadores residentes, o grande Eduardo Ramos, mestre do alaúde que bem conheço e consegui colocar no ano passado em Badajoz após convencer a Vereadora Consuelo; e os Gwana Al Baraka com quem já tinha trocado e-mails e com quem ali tive oportunidade de negociar, ficando já apalavrados para Marvão em Outubro a uma preço imbatível. Ambos são valores inquestionáveis mas nós tivemos sempre muito mais diversidade. Ali faltaram as bailarinas de ventre (cá são mais de 15, lá vimos apenas uma), faltaram as serpentes, faltaram as aves de rapina, faltaram os grupos de animação cómica (em 2008 tivemos o grande bobo Pedro Charneca, os ultra-profissionais Animamundy e os hilariantes Compinxas), faltaram os malabaristas de fogo... E nós tivemos essa oferta todos os dias!!!

Concluímos, como disse a Felicidade e bem: “Assim é que percebemos como nós temos uma festa a sério!”. Estamos no campeonato!
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Olá... Cristina... Turismo de Marvão... Al Mossassa...

Uma outra medida inteligente: panos estampados e coloridos cosidos de forma sequencial, suportados por uma estrutura de ferros ao longo das ruas. Dá, de facto, a ideia perfeita de um verdadeiro mercado islâmico. Como em Marrocos...
Sabemos, no entanto, que o vento de Outubro de Marvão não permite mais do que as faixas que habitualmente colocamos. É pena...




Esta não lembra a ninguém... velharias e calças de ganga num festival que se quer nacional?
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"Y donde queda eso?"


"Si, si... muy bonito, te va a gustar Marvao".
Eu queria que esta cachopa viesse e é só mesmo pela qualidade das tatuagens que faz...

Esta foi o Hernâni que pediu: "Olha os gajos a montarem as luzes a esta hora! Tira lá!"

Conhecendo um mestre na arte de trabalhar as madeiras. Um segredo de família.
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Eu vi um filme em que uma piquena usava uma bandolete destas mas ficava-lhe melhor a ela do que a mim

O espaço do Kebab, que é do mesmo proprietário que veio a Marvão, mas aqui num espaço bem mais "in"

A animação dos Al Baraka

Um stand bem interessante este, o dos frutos secos caramelizados. Pode ser...

Encontrei os meus amigos paquistaneses. Conheceram-me logo os gajos... espertos!

Este nosso compadre está bem islâmico, não está?

Se houvesse um concurso nacional de caras lindas da cultura nas autarquias, aposto que ficávamos melhor posicionados do que ficou Portugal no Festival da Canção. Não acham?

O centro da vila

O Cine-Teatro (com traços de arquitectura islâmica e com um toque algarvio)

Os espectáculos nocturnos são sempre o ponto alto da programação. Um nível muito forte.

A grande alegria do mercado foi termos visto tantos e tão bons amigos que já são indefectíveis de Marvão, que nos reconheceram de imediato e que nos receberam com beijos e de braços abertos, que perguntaram pelos nossos familiares e pelos nossos filhos e nos disseram com um sorriso rasgado que claro que sim, que neste ano vão voltar a Marvão, que Marvão é incontornável e que anseiam mesmo por esta feira e este local magnífico onde são tão bem tratados e se sentem tão bem.

Cá vos esperamos! (enquanto trabalhamos com afinco para fazer mais um evento memorável para todos vocês, para os habitantes, visitantes e claro, para nós próprios que desfrutamos tanto enquanto pugnamos pela excelência!).

Até Outubro! Inshallah!
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Ficámos bem, não ficámos?
Obrigado pelo dia e pela companhia., ó rapaziada.
Uma equipa motivada tem que se lhe diga...
É um orgulho poder contar com o vosso empenho e dedicação.
Se pudesse ser assim com todos... imagino onde não chegaria esta nossa casa...

2 comentários:

rosaria disse...

Pedro querer é poder...
Cheguei agora de um fim de semana em OBITOS com alguns dos meus colhegas que tiveram oportunidade de ir. Somos uma Câmara Pequena mas somos uma grande equipa. Estes ano fomos 65 pessoas. como vês é possivel.

Catarina disse...

Meninas da Cultura: twelve points/douze points!!!